quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

IGREJA E PSICOPATOLOGIA



"Não há a mínima dúvida de que igrejas podem criar ambientes psicopatológicos, com uma cultura e uma forma de administrar os conflitos morais dos seres humanos capazes de levar homens e mulheres à neurose crônica. Quanta energia gasta com a culpa que jamais é expiada! Quanta tentativa de transformar homem em anjo! Quanta obsessão com um aspecto da ética em detrimento daquilo sobre o que as Escrituras falam muito mais extensamente, como as condições de vida dos despossuídos, a promoção da justiça social, a defesa do direito e o amparo ao que carece de solidariedade!

Com as Escrituras abertas, todos os membros das mais diferentes igrejas deveriam fazer continuamente duas perguntas: “O modelo de espiritualidade de minha igreja fomenta a real santidade de vida?” e “O modelo de espiritualidade de minha igreja colabora para a disseminação de um comportamento neurótico?”. Vale a pena ouvir o que Freud tem a dizer sobre culturas que carecem do divã:

"Se o desenvolvimento da civilização possuiu uma semelhança de tão grande alcance com o desenvolvimento do indivíduo, e se emprega os mesmos métodos, não temos nós justificativa em diagnosticar que, sob a influência de premências culturais, algumas civilizações, ou algumas épocas, da civilização — possivelmente a totalidade da humanidade — se tornaram neuróticas? [...] Eu não diria que uma tentativa desse tipo, de transportar a psicanálise para a comunidade cultural, seja absurda ou que esteja fadada a ser infrutífera... podemos esperar que, um dia, alguém se aventure a se empenhar na elaboração de uma patologia das comunidades culturais".

Tenho profundo respeito pela psicanálise, embora não a veja como panaceia para as dores da alma. Pode ser que Freud tenha ido longe demais na proposta de usar a psicanálise para fazer análise objetiva de culturas fomentadoras de psicopatologias. Mas não tenho dúvida de que seu ponto de vista sobre a dimensão cultural das neuroses é fato irrefutável e que instituições religiosas deveriam se submeter a essa análise, a fim de refletir sobre a dor que infligem ao espírito humano por força de ideais irrealizáveis e desconectados da realidade. Contudo, é uma tarefa espinhosa e que requer imensa sabedoria, sensibilidade e diálogo com as ciências que lidam com o tema da psicopatologia."

Antonio C. Costa

Extraído do livro, "Azorrague", que foi lançado no final do ano passado pela Editora Mundo Cristão. Ele pode ser adquirido no site da Amazon.

O Barco de Pedro Pietersz



Fonte: O espelho dos mártires

Foram tempos difíceis. Não pensar como as autoridades da Igreja, que eram os responsáveis ​​por ditar a maneira como você deveria viver sua fé, como você tinha que interpretar a Bíblia, custava caro. Em suma, a sujeição ao Presbítero / Bispo devia ser total. Mas havia um grupo de rebeldes, pessoas simples com um espírito libertário que queriam viver seguindo a Jesus completamente. Em face de tal opressão, era impossível expressar abertamente a sua fé, então esconder-se era sua melhor opção. Eles eram tão boas pessoas que solidariamente muitos vieram em sua ajuda. Havia também aqueles que, por medo, ficavam em silêncio quando eram perseguidos ou aqueles que os denunciavam diretamente às autoridades eclesiásticas. Este grupo marginal era os anabatistas. Eles tinham que se encontrar em segredo e Pedro Pietersz, um barqueiro no rio Amstel, em Amsterdã, estava fazendo de seu barco um ponto de encontro.

Você imagina esse momento ?!!
Incentivar-se a ler e interpretar os ensinamentos de Jesus fora do que os líderes religiosos lhes autorizaram. Conhecer-se marginal, herético, não respeitar as práticas e doutrinas aceitas era o caminho que empreendiam.

A solidariedade de Pedro custou caro a ele, que foi descoberto e executado na fogueira em 26 de fevereiro de 1569.

Você daria sua vida por um grupo de hereges?
Você ofereceria hospitalidade àqueles que não estão sob as regras impostas pelas autoridades eclesiásticas?

Tenha um bom dia.

Luis Ma. Alman Bornes
Igreja Menonita Anabatista
Buenos Aires, Argentina

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

"No dia em que os Cristãos pararem de distorcer as escrituras


"No dia em que [os Cristãos] pararem de distorcer as escrituras descobrirão a liberdade e a falta de obrigatoriedade dominical. Talvez descubram que foram enganados com intermináveis sermões de autoajuda, e que também foram ensinados a consumir espiritualidade ao invés de amadurecer nela. Será um dia muito triste, pois perceberão que suas faculdades mentais e analíticas ficaram adormecidas por anos a fio sob a batuta panteísta de espertalhões vestidos de pastor ou sacerdotes - sem falar no pessoal “relevante” das igrejas-boate de modinhas Gospel. A dor e desespero seriam totais se neste dia se derem conta de que são eles os que dizem “Senhor, Senhor, em teu nome”, sem contudo conhecê-lo nem terem feito o que ele manda. Mas, talvez sejam poupados, tendo em vista que não foram ensinados o Evangelho e possivelmente nem notem que Jesus voltou. É dura essa palavra? É nada! Duro é saber que se as escrituras parassem de ser distorcidas pelos cristãos o conhecimento de Jesus encheria a terra como as águas cobrem o mar e poderia haver mais justiça e esperança! No presente momento há igrejas que sabem mais do satanás e de magias psicologizadas para regressão, cura interior e desatar maldições hereditárias do que da simplicidade, totalidade, suficiência, amor e senhorio de Cristo!"

segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Falsos pastores, profetas e mestres



De falsos pastores e falsos profetas que, por anos, não fazem absolutamente nada para salvar mulheres que estão sendo espancadas sistematicamente por seus próprios maridos, sob seu conhecimento e cumplicidade, toda palavra de falso moralismo e pregação como sendo "absoluta" ou da parte de Deus (do deus deles) é vazia e não merece crédito.
Falsos profetas, falsos pastores e falsos mestres devem ser denunciados - tanto pela lei civil quanto pela Bíblia.
Líderes, pastores, autodenominados profetas e mestres que se colocam como infalíveis em sua interpretação das Escrituras, donos da verdade e defensores da literalidade absoluta de suas traduções nada mais são do que manipuladores e pastores de seu próprio umbigo, deuses de si mesmos. Fujam deles!
A incoerência de alguns intérpretes da fé cristã desponta já em seu conveniente silêncio a respeito da literalidade dos inúmeros textos bíblicos que revelam um Deus defensor dos marginalizados, escravizados e oprimidos, que resiste aos soberbos e até mesmo aos mais abastados.
Para falsos pastores, profetas e mestres, a salvação não é somente através da fé em Jesus Cristo, é preciso crer e pensar como eles, ter seu mesmo posicionamento político e econômico.
Para estes, não basta somente crer e confessar que Jesus é Senhor, é preciso também confessar que César é Senhor.
Eu até entendo aqueles falsos pastores, profetas e mestres que citam, fora de contexto, o versículo "a letra mata" para falar contra o estudo teológico, porque eles nada mais fazem do que se defender contra a morte de seus dogmas, de sua fé podre e manipuladora, de suas escamas religiosas que só servem para enganar e controlar a vida das pessoas de acordo com sua conveniência e prazer
Assim, eles mantém um grande número de pessoas em seus currais religiosos, dependentes de suas profetadas e direcionamento, de seus ritos e talismãs, fontes de suposto poder a fim de manter o que a obra de Cristo na cruz não é capaz de, por si mesma, fazer de uma vez por todas.

Angela Natel - 08/01/2019

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Quanta dor há nesse mundo?

Quanta dor há nesse mundo?
Quanto nós podemos suportar?
Dor, ódio, violência.
Quanta dor há nesse mundo?
Um tapa, um soco, um chute, um tiro.
Dor que gera ódio, ódio revertido em vingança.
Vingança, medo e mais dor.
Quanta dor há nesse mundo?
Nojo, descaso, rejeição, omissão.
Instinto de auto preservação
Que nos faz desejar armas
Medo que tira vidas.
Quanta dor há nesse mundo?
Cansaço, dor, confusão, pavor.
Dor física, psicológica, dor da alma.
Morte prá fugir da dor.
Quanta dor há na pessoa perto de mim?
Quanta dor ela sente?
Quanta dor já sentiu?
Vidas dilaceradas em dor.
Quanta dor no outro consigo suportar
antes que eu me torne pedra
pedra lançada contra o outro
pedra que não sente dor?
Angela Natel

terça-feira, 22 de janeiro de 2019

Quando mais aprendo

Quando mais aprendo
e me desafio constantemente.
Quando tento ultrapassar limites
e ser alguém mais, para exemplificar.
Quando me desdobro para ser compreendida
e traduzir ideias, conceitos, de maneiras diversas
tentando alcançar as diferenças em quem me ouve
e, de múltiplas maneiras, ser ouvida.
Quando me realizo, o tempo pára,
e naquele instante, toco a eternidade.
Quando sou ministrada, e minha falta de discernimento
é alcançada, ali não me sinto sozinha.
Quando minha vida faz sentido
e todo o trabalho é recompensado.
Quando sou aluna ao ensinar
e repartir de mim aos que ouvem.
É nesse instante que sou curada.
Sim, lecionar, para mim, é isso.
Cada aula, cada oportunidade,
uma chance de ser transformada.
Angela Natel

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Subliminar


Verme intragável entre os dentes
deixa ardente o paladar.
Sussurro que na noite fria
faz um demente a vagar.
Atravessa a rua e num relance
sente sufocar.
Grita, desesperado,
frente ao vil pulsar,
ao que vê do outro lado da rua:
“Tente não olhar!”
Mas já era tarde, bote da
serpente a rodear.
Foi cair semimorto
rente ao pé do mar.
A serpente segue, ainda há
gente prá enganar.
Angela Natel

domingo, 20 de janeiro de 2019

Empatia


Tem pessoas que só começam a sentir empatia pela dor alheia quando passam por situações semelhantes, quando sentem dores parecidas...
Eu fui uma dessas pessoas...
Só compreendi um pouco do que é viver um relacionamento abusivo quando estive em um, sem saída, longe de meu país, sem dinheiro para voltar, e ainda com pessoas que se diziam meus amigos e líderes me chamando de mentirosa.
Agradeço a Deus pelos poucos que acreditaram em mim e que me estenderam a mão quando mais precisei. Foram pouquíssimos...
Agradeço a Deus por minha família, que me recebeu de volta e, principalmente, por minha irmã Angelita, que me defende e me ama incondicionalmente.
Depois do que passei, nunca mais vi a vida da mesma maneira. Não sou a mesma pessoa. Consigo, pela graça de Deus, perceber a dor alheia, ainda que não a sinta, me compadecer e ouvir antes de emitir julgamento.
As decisões da vida são complexas, exigem sensibilidade, empatia, mais ouvir do que emitir opinião.
Não se trata de opinião, na verdade. A vida é complexa, exige um caminhar junto, uma cumplicidade que nos desgasta, uma renúncia que nos tira do conforto. Por isso são poucos os que, de fato, caminham conosco.
A maior parte das pessoas apenas se resume a expectadores, como se estivéssemos em um palco, dando um show a elas, abertos ao julgamento e condenação.
A vida não é um show. 
Quem vive de show, na verdade, não vive.
Por isso, é preciso pedir socorro, é preciso ouvir os gritos de quem grita, ouvir as razões antes de dar opinião, pesar as razões, calçar os sapatos do outro e tentar sentir sua dor.
Muitos dizem seguir a Cristo, mas foi isso que Ele fez... quem está disposto a seguí-lO, que faça o mesmo!
Angela Natel

sábado, 19 de janeiro de 2019

Dizem...

Dizem como tenho que me vestir,
se devo ou não tatuar.
Falam de meu cabelo, meu linguajar.
Dizem até o que devo ou não publicar.
Dizem que devo fazer isso ou aquilo,
o que mais querem é me controlar.
Dizem que isso é só preocupação, cuidado,
mas nunca se oferecem para ajudar.
Apenas falam, falam sem parar,
a meu respeito para outros,
falam de mim, comentam, condenam,
falam para mim, mudar-me tentam.
Cansada de tanto falatório.
Cansada de tanta opinião.
Amor e serviço é raridade
doam palavras, promessas,
sua vida, não.
Angela Natel

sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Eu acho que foi assim...


1934. O pastor luterano Bonhoeffer assina a Declaração de Bremen, e funda a Igreja Confessante, declaradamente oposicionista ao Nazismo.

Nazismo tava na moda.

Aí surgiu nas rodinhas de corredor de igreja: - Cê viu o Bonhoeffer arrumando confusão de novo? O cara não pára quieto. Tá lá assinando aquela Declaração subversiva. - Fez seminário, mas nunca leu Romanos 13. Tem que se sujeitar às autoridades, cara! - É um subversivo. É um passo pra heresia, vai cair no liberalismo. Fica vendo! - Esses caras não entendem que só dá pra enfrentar a crise com mão de ferro. A gente precisa de um cara que fala o que pensa! Essa crise econômica é culpa de judeu.

Aí hoje, 84 anos depois, cá estamos nós. Tem filme do Bonhoeffer. Livros dele. Sobre ele. Camisetas dele. E a gente achando o cara o mó bacana porque enfrentou o Hitler.

Mas aí, chegado, aí é fácil, né. Saca só: A gente leu a história e viu que ele se posicionou, viu que ele enfrentou uma tirania horrível e pagou com a vida o preço de ter lutado, se posicionado, enfrentado.

Agora, a gente acha o cara mó bacana. Hoje.

Mas será que lá em 1934 cê ia falar: Ô Bonhoeffer. Tâmo junto! É isso aí. Melhor fazer o mal do que ser o próprio mau.

Na boa, analisa aí. Será?

E concorrer à forca com o seu brother?

1963. O pastor batista Martin Luther King Jr. caminha em Washington e discursa para duzentas mil pessoas afirmando que ele tem um sonho. Seu sonho é ver seus filhos negros indo à mesma escola de crianças brancas.

Segregação racial tava na moda.

Aí surgiu nas rodinhas que se formaram embaixo das árvores do Monumento à Washington: - Olha lá o Luther, esse cara se acha o defensor dos fracos e oprimidos! Para ele no mundo só negros sofrem. E o sofrimento dos vietnamitas... Ele não vai falar nada? - Cara devia se concentrar em pregar o Evangelho. É pastor para quê? Fica aí nessa de direitos dos negros e injustiçados! Coisa humana. Tem que se concentrar no sagrado! - Alguém precisa avisar esse cara que se ele continuar com esse lance de política, essa conversa de esquerdista aí, ele vai morrer. - Por isso que não dá pra misturar religião e política!
Aí hoje, 55 anos depois, cá estamos nós. Novamente. Tem filme do Luther King. Camisetas. Dia do cara. E a gente achando mó bacana que ele enfrentou a Ku Klux Klan.

Será que lá em 1963, estaríamos nós braços dados com ele, tomando bicuda na cara dos policiais e sendo cuspidos direto, dizendo: aguenta firme, irmão!

Hoje, tudo bem, né.
Mas e lá? Na hora de fazer a história?
Porque hoje o maluco que tá tomando as pedradas e você sentando o pau pode ser o cara da história amanhã. Porque, não sei, mas... parece que sempre é assim com os heróis do passado. Eles antes eram uns Zés Ruelas nos corredores e bate-papos dos "bacanas" e das "pessoas de bem". Difícil entender o momento histórico e se posicionar. Tem que ter peito.

Por isso que eu reavalio minha consciência para enfrentar esse momento histórico e me posicionar de modo que amanhã eu não venha a me arrepender. E tem um jeito de acertar. Ficando ao lado dos oprimidos. Dos ferrados. Dos injustiçados. E em amor, em boa consciência, em afeto e Graça.
Cê pode até perder, morrer, ser enforcado ou levar um tiro no peito, mas... a história, meu chapa, ela te absolverá.
Dois pastores protestantes. Um negro. Americano. Um branco. Alemão. Dois resistentes. Subversivos. Heróis de hoje. Malvistos do passado. Respeitados pela igreja de hoje. Excomungados pela de ontem. Que temeram muito mais a vergonha de não enfrentar o caos do que a morte. E honraram a Deus servindo ao próximo.

Deles eu não me envergonharei.
Tampouco dos irmãos que lutam hoje, neste momento histórico e que são tachados de tudo pelos comentaristas da história. Que comentam, mas não a alteram.

Sou inspirado por estes tais "vilões do presente".
Na contramão dos que escolhem Barrabás.
Sou discípulo do preso político da cruz do meio.
Sentenciado por dois poderes paralelos. Que não morreu de trombada de camelo em esquina movimentada de Jerusalém. Foi morto. Assassinado. Acusado de subversão ao Império e Heresia à religião.

Que entrou na história pra mudar a minha sorte. Peço a Ele que me ajude a me posicionar. Sem medo do que virá. Com a coragem e a loucura de quem sabe que não veio a este mundo de passagem, nem rolézinho.
Gito Wendel via Instagram

Comunicação...

Há os que usam o nome de Deus
para exercer influência, mentorear.
Há coachings e PhDs
que tentam, a todo custo, se autoafirmar.
Defesas que já abandonei,
estigmas inúteis, vão falar.
Uns mentem e manipulam,
outros prometem o que nunca irão experimentar.
No fim das contas, se perde
toda a sensibilidade
de sentir o pé no chão
e perceber singularidades.
A dor ao redor não sentida
traz consigo a indiferença.
Generalizar vira regra de vida
quando se perde a consciência.
Por isso, fórmulas mágicas
se esvaziam nas paredes da casa
onde o cônjuge, abandonado
coleciona lágrimas.
De que adianta inspirar,
gravar vídeos, ser popular,
se o descaso com a família
é o que vai sobrar?
De que adianta fazer propaganda
de seu trabalho e competência
se não sabe ouvir o outro
nem interpretar além das aparências?
Comunicação serve para todos
numa via de mão dupla.
Melhor ajudar a si mesmo
antes de oferecer ajuda.
Angela Natel

quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

Armas para matar bandidos

"A população se arma para se proteger contra os bandidos... talvez sem notar que a própria população também é composta de bandidos... "Bandido" não traz estrela na testa. Ele pode ser o cardiologista que abusa de pacientes; o líder espiritual que não reconhece limites; o facínora que todos reputam ser "boa gente".... O nazista Eichmann conseguiu viver longos anos em solo argentino, de forma pacata, sendo elogiado como "bom cidadão"... Quando se facilita o acesso às armas, facilita-se o acesso às armas a todos... E esse critério de ter ou não antecedentes é para lá de insuficiente... Sempre é possível o "primeiro caso", não é? Então, muitos maridos ciumentos encontrarão meios mais fáceis de fazer valer suas vontades, em momentos de fúria... Outros não deixarão suas armas em casa, e as levarão consigo nos bancos dos carros, empunhando-as em qualquer conflito no trânsito... Outros ainda poderão atirar ao menor sinal de perigo, atingindo o azarados que possam estar no caminho dos projéteis.... Pode ser que o receio de encontrar uma arma pela frente realmente impeça a conduta de potenciais delinquentes... Creio que sim... E, repito: potenciais delinquentes não necessariamente possuem antecedentes criminais... Mas, a pergunta é saber se, no final do dia, haverá maior ou menor violência social; se isso redundará na preservação da vida ou não. A vingar essa lógica maniqueísta: "bons" versus "malvados", todos estarão armados, igual faroeste caboclo. Sobreviverá quem souber atirar com maior "maestria"... Quem puder matar mais ou neutralizar mais... Nada garante que seja você. Nada garante que seja quem tem razão. Max Weber chegou a acreditar que o elemento caracterizador do Estado seria o monopólio do uso legítimo da violência... Daí que os mecanismos de desforço incontinenti, a exemplo da prisão em flagrante, legítima defesa, estado de necessidade etc., teriam caráter absolutamente excepcional no sistema... Mas, no momento, cada vez com mais frequência, o Estado reconhece sua falência e transfere aos particulares o exercício do poder de polícia... seja por meio da criminalização de condutas omissivas (convertendo conivência em delitos), seja pela imposição de deveres de delação (whistleblower e gatekeepers), seja por meio da imposição de mecanismos de autocensura e autocobrança (lançamento por homologação, compliance etc.)... Nessa toada, não é de se admirar que a Administração Pública atribua aos particulares, pouco a pouco, a imposição da autotutela... Quantos não são os bairros em que há verdadeiro policiamento privado? Quantos não são os condomínios que mais parecem fortalezas medievais? Bom... essa é a marca dos tempos.. Todos estamos conectados, o tempo todo... Ainda assim, parece que cada sujeito carrega consigo o seu próprio fosso medieval, e sem pontes elevadiças... E aí? Já encomendou a sua Beretta 9mm?"
 Flavio Antônio da Cruz

Então é isso?

Então, o próximo passo para com os que discordam, incomodam, ferem nossa ditadura, é o enjaulamento de menores de idade, esterilização forçada, generalização de tratamento, trauma após trauma? 
Bela sociedade demoníaca nos tornamos: matar, roubar e destruir virou nosso mote, nosso hobbie - e tudo em nome de "Deus".
Usamos a Bíblia sem exegese nem hermenêutica, lutamos contra o "humanismo" para nos tornarmos gnósticos, ignoramos os erros cometidos na história para cometermos atrocidades piores.
Sem ter Cristo como referência, nos dizemos cristãos, e nos tornamos os porta-vozes do anti-reino de Deus, o próprio anticristo de nossa geração.
Duvida? Que tal estudar, ler, pesquisar, se informar, antes de emitir opinião ou repetir discurso só porque, no momento, é lógico ou faz sentido?
Que tal analisar com calma as complexidades e nuanças de cada situação?
É cristão? Que tal voltar seus olhos para Cristo antes de a qualquer um que diz representá-lo?
Angela Natel

quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Na corda bamba entre Humanismo e o Gnosticismo

Com medo de nos enxergarmos hereges de nossa pequena teologia evangélica, caminhamos na corda bamba das sutilezas que separam as caixas do humanismo e do gnosticismo - segundo nosso próprio entendimento, é claro. Digo ‘pequena teologia’, uma vez que Deus não cabe nela, na minha ou na sua, ainda que seja um produto adequado de nossa interpretação a respeito da auto revelação da divindade.
Ainda assim, o que classificamos ‘Humanismo’ pode ser um rótulo de proteção para enfim cairmos na heresia do gnosticismo. Ao fazê-lo, desumanizamos o Senhor Jesus e desvalorizamos o que o caracteriza como plenamente humano – e, consequentemente, repudiamos as manifestações humanas que glorificam o Senhor. Também, nesse sentido, podemos classificar as obras, fatos e manifestações em hierarquias que vão do mais espiritual ao menos espiritual, atribuindo-lhes juízo de valor, do melhor ao pior, respectivamente. Eis um dos riscos que a linha conservadora da Ortodoxia evangélica mais corre hoje em dia.
Há, também, por outro lado, o risco do culto ao Espírito sem o Cristo encarnado, da ação dos dons e manifestações espirituais sem que o meio e o centro de tudo seja a pessoa de Cristo. Esta é a heresia ‘gnóstica’ infiltrada no seio evangélico que centraliza seu culto em torno dos sinais e maravilhas promovidos pelo Espírito, como um fim em si mesmo.
Dessa forma, flechamos uns aos outros segundo os riscos pessoais que decidimos correr, dependendo do mal que consideramos pior. Não sei, pessoalmente, qual dos dois – se o humanismo ou o gnosticismo – o seja (creio que os dois extremos são igualmente perigosos), porém parece que essa luta pessoal em encaixotar o outro em uma ou outra classificação, com base apenas na maneira como este se expressa ou do material que compartilha e valoriza em determinado contexto, não deixa de ser um risco para nossa vida em comunidade – o que também pode ser interpretado por alguns como ‘humanista demais’.
Quaisquer que sejam a sua e a minha interpretação, que tratemos com cuidado a manifestação do outro, seja em palavras, ações, publicações, mensagens. Que olhemos com a calma que dispensamos ao interpretarmos um texto, que tenhamos amor nas conversas e apontamentos, que não olhemos sem, antes, perceber os contextos, sem buscar as intenções. Muito do que pensamos pode ser derrubado com uma simples atitude como esta, além de preservar o respeito mútuo, sem perdermos o cuidado recomendado contra as heresias.
Angela Natel

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

Martinho Lutero Negro

Martinho Lutero Negro

Relacionamento abusivo


Você pode achar isso um exagero, pesado, inapropriado. Mas é exatamente exagero, pesado e inapropriado, em minha opinião, a tendência da maior parte das pessoas, principalmente das que se dizem "espirituais", religiosas, em preferir culpar as mulheres vítimas de violência doméstica.
A gente que explode vira bruxa, louca, descompensada.
Como já cansei desses rótulos, e da mania de ouvirem e acreditarem somente na versão masculina da história, ou na versão de quem, aparentemente, tem algum tipo de poder ou autoridade, prefiro a companhia dos que não se importam em caminhar com gente defeituosa, com a vilã da história.
No final das contas, só Deus sabe as agressões físicas e psicológicas que sofri, de quantas arbitrariedades surgiram daqueles de quem pensei que teria algum tipo de apoio, de quantas oportunidades passaram simplesmente pelo fato de que já me tinham rotulado, pensaram já saber de toda a história.
Infelizmente, até hoje sofro as consequências dos traumas, seja na dificuldade em estabelecer relacionamentos, seja no medo de um simples toque físico, até na constante luta contra a insegurança e a ansiedade. Talvez conviver com a eterna incompreensão dos que me cercam seja o pior dos frutos do casamento abusivo de que me livrei.
Agora, penso eu, a vida é muito curta para me ater às conversas com quem acha que sabe o que me aconteceu somente por ter ouvido o que outros falaram a meu respeito.
Angela Natel

MANIFESTO DA UNIÃO CÍVICA EVANGÉLICA PAULISTA - 1936





A União Cívica Evangélica Paulista [vem aos] seus eleitores nesta hora solene de tanta confusão e incerteza, para reafirmar sua existência, por muitos julgada extinta, por falta de manifestações exteriores visíveis e confirma seus [princípios] exarados no manifesto de 15 de janeiro deste ano do qual extraímos os seguintes trechos que relembram nossa atuação e nossos compromissos:
A Diretoria da U. C. E. P. ratificando o aviso colocado nas folhas evangélicas em julho de 1933, tem o prazer de comunicar a todos que conosco tomaram parte na campanha eleitoral que caminhará como orientadora do movimento eleitoral evangélica no estado de São Paulo, em conexão com os ideais da legenda “Liberdade e Justiça” que foi justamente a divisa que apresentamos na última campanha eleitoral. A U. C. E. P. fica constituindo um centro evangélico de vigilância para acolher e providenciar sobre todos os casos que cheguem ao [nosso] conhecimento em que haja pressão a liberdade de consciência e desrespeito ou quebra de direitos constitucionais, que garantem a liberdade e igualdade de crenças perante a lei, como qualquer perseguição e injustiça por motivos religiosos. Assim todos aqueles que forem vítimas de coação ou receberem atos concretos que ponham em opressão a liberdade de consciência por motivos religiosos, queiram dirigir-se a diretoria que tomará as providências que no caso couberem. 
A diretoria entende também ser seu dever neste momento de confusão e incertezas, declarara francamente os pontos que a norteiam quanto a ideologias comunistas, que se debatem no país e apelar a todos os evangélicos eleitores, que se abstenham de quaisquer compromissos políticos com tais partidos e ideologias [que] são contrárias aos princípios evangélicos. 
Como orientadora de opiniões, faz suas as palavras que foram adotadas como declaração de princípios pela Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, que sintetiza todos os pontos contrários aos extremismos de direita ou de esquerda, o comunismo, o integralismo, e outros quaisquer. 
Assim, condenamos todo movimento político ou social que: 
“Considerando o momento caótico do mundo e o movimento de idéias perigosas que apelam apara as mentes cristãs e por vezes delas se apoderam, Sínodo da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil declara contrário aos princípios da Reforma – que ele crê decorrentes do Novo Testamento – qualquer movimento político e social que der os seguintes resultados:
Atentando contra a liberdade de consciência livre dentro da lei; 
Atentado contra a liberdade de consciência, de crítica, de culto e de imprensa, quando esteja ela dentro da lei e da moral; 
Atentado contra a formação livre como partido com programas claros dentro da lei; 
Atentado contra a liberdade de propriedade em si, garantida e expressão livre do individuo de da organização normal da família; 
Atentado contra as bases sagradas da família Posse do poder pela força por parte de uma facção, que se arvore em país, transformando a bandeira nacional, mãe bondosa que é para abrigar dentro da lei as divergências naturais de seus filhos, em madrasta odioso que protege uns filhos tiranizando outros; 
Exigência de juramentos incondicionais nas mãos de um homem, o que é, além de gravíssima imprudência, para não dizer imoralidade, um atentado contra o princípio básico de reforma, a saber: o livre exame e a crítica, princípio que é não só um direito, mas um dever da dignidade humana; 
Nacionalismo rubro, que é uma deturpação do verdadeiro patriotismo e que conduz fatalmente a um orgulho nacional insensato, preparando o caminho para o ódio entre as nações, a opressão e a conquista; 
Ódio de raças e orgulha da superioridade racial, que afasta indivíduos e nações, contrariamente do universalismo cristão; 
A militarização da infância escola e a inoculação da alma infantil, de idéias de violência que não somente a deturpam e alienam a cristo, mas prepara o caminho para o imperialismo, o militarismo, os gastos excessivos com preparativos bélicos, em detrimento da escola, do pão sagrado, do operário, dos hospitais; 
Toda expansão de dinheiro que acarreta parasitismo, tirania, compressão a comunidade, exploração criminosa da pessoa e do trabalho humano. 
Com estes alavantados propósitos bem definidos e com esta diretriz de ação política e social, a diretoria conta com o apoio unânime de todos os evangélicos, eleitores ou não e de ambos os sexos, de todo estado de São Paulo, para na primeira oportunidade, dar um forte exemplo de civismo na defesa de nossos ideais. 
São Paulo, julho de 1936. 
N R S Couto Esher (e outras assinaturas)

Via Max Cassin
https://www.facebook.com/max.cassin.1/posts/2223378177714726

domingo, 13 de janeiro de 2019

Caiam os ídolos

Minha oração hoje
E meu desejo mais profundo,
Esperança que me resta
Nesta vida, neste mundo
É que todos os meus ídolos
Se descubram nus diante de mim.
Que as ilusões que tenho alimentado
E as opiniões que elaboro sobre falsas premissas
Sejam, de uma vez por todas, expostas,
Deflagradas, derrubadas ao chão.
Que em momento algum eu me firme
Sobre meu próprio entendimento das coisas
Que minhas certezas e tudo aquilo que utilizo para manter-me em pé
Mostrem do que são feitos realmente
E que eu possa libertar-me do altar sobre o qual me puseram
E sobre o qual mantive-me boa parte de minha vida.
Tantos olhares de expectativa
Tantas palavras em tom altivo
Tantas promessas quebradas
Por causa de uma palavra não esperada
Uma decepção.
Nessa vida não vale a pena condicionar nossas ações a nada.
Porque as pessoas são vivas e, por causa disso, mudam.
Somos transformados a cada passo dado, a cada experiência vivida.
Por isso desejo, do fundo do meu coração,
Que meus ídolos caiam
Que sejam expostos, revelados, trazidos à luz,
Não posso me permitir acreditar que sou infalível,
Nem me firmar na hipótese de nunca me enganar.
Assim me protejo da estupidez do orgulho
E de achar que em mim mesma há algo de bom.
Porque só Deus é bom, fundamentalmente bom.
Dele procedem as fontes que alimentam meu ser.
Nele me escondo quando em dúvida, não preciso saber.
E descanso, quando tudo cai ao meu redor,
Quando faltam amigos, promessas se quebram,
Quando alguns desistem ou esquecem,
E o que me sobre são contas a pagar,
Um desejo sobre-humano
de ser envolvida num abraço demorado
medo de errar de novo
e cansaço.
Por isso, que os ídolos caiam,
Que minhas certezas não sobrevivam.
Assim poderei caminhar calmamente,
Olhos no chão,
Ao lado dos que sofrem,
Entende-los, amá-los,
Perder tudo,
Por amor,
E desgastar-me em dor.
Perder-me para me encontrar,
Angela Natel

sábado, 12 de janeiro de 2019

Somos rasos

Somos rasos
Nosso amor é raso
Nosso interesse é raso
Assim como nosso estudo e compreensão o são
Rasos
Insuficientes
Impotentes.

Rasa é nossa dedicação ao outro
Bem como nossa maneira de nos preocupar
Em ajudar, em colaborar.
Rasos somos em nossas relações
Em nosso amor, que é condicional
À resposta alheia, ao que desejamos ganhar com isso.
Somos rasos, rasos demais,
Em nosso julgamento das situações
Em nossas opiniões.
Rasos em nossas conversas
Por medo de intimidade
E vulnerabilidade.
Somos rasos nas respostas, nas perguntas
Nos cumprimentos.
Prá que se aprofundar?
Dá muito trabalho
- ai, que preguiça!
Somos extremamente rasos
Em nossas teologia,
Em nossa imitação de Cristo
Rasos naquilo que nos propomos fazer
- fazemos o mínimo, o mediano, o suficiente.
Nada mais, nada menos.
Não fazemos mais do que nossa obrigação.
Por isso somos tão descartáveis,
Irrelevantes,
Nossa mensagem não vale tanto assim,
Porque a vivemos de forma rasa,
Até o limite de nossa segurança,
De nosso conforto e acomodação.
Somos rasos no perdão
E na entrega.
Sem riscos vivemos na superficialidade das relações,
Dos comentários
Apenas nos defendendo
E defendendo o que moralmente nos acalenta.
Mas no que consideramos provocação
Levamos de forma rasa
Rotulando e determinando limites
Para nosso amor, nossa mão estendida.
Apesar de tudo isso,
Deus nunca foi raso,
Entregou-se por inteiro,
Encarnou, sofreu, sangrou e morreu.
Foi ao fundo do abismo,
E hoje perscruta as profundezas de nosso ser raso.
Não há nada que possamos esconder de Deus
E, por debaixo das máscaras de nossa hipocrisia rasa
Ele vê e revela a podridão que há lá no fundo.
Somos rasos
Porque somos podres por dentro.
É dessa podridão de incertezas, desinteresse pelo outro,
Um desamor fedido que brota de nosso interior,
A raiva contida, o ódio descabido,
Essa revolta e o desejo por estarmos sempre certos
Acima dos outros, acima de suas necessidades,
Agarrados ao osso do poder e do controle
De nossas vidas e organizações
E de todo esse lixo que se esconde em nós
Que precisamos nos desfazer.
Para sairmos, de vez, dessa superficialidade crônica da vida
É preciso morrer, abrir mão de nós mesmos,
renunciar o direito de estarmos sempre certos
nos vulnerabilizar diante do outro
a fim de amá-lo profundamente,
sem condições, sem restrições,
sem exigir reparação,
nem direitos,
sem nos assegurar com testemunhas a nosso favor.
É preciso olhar quem nos provoca tanto ódio
Por sua conduta, palavras, opiniões
E servir, entregando-nos até a morte.
Para sermos libertos de tão maldita superficialidade
É preciso calar em vez de sermos rasos.
É preciso buscar a profundidade da compreensão,
Do amor, nas relações, nas organizações.
É preciso sairmos um pouco dos esquemas,
Das facilidades, dos horários marcados e do mecanicismo.
É preciso sorrir e chorar com o outro
Em nossas debilidades.
Porque ser raso é fácil nesse mundo,
Generalizar, rotular, esquematizar
Faz parte do abismo imundo no qual nos tornamos.
Por isso não busquemos soluções rasas
para problemas de quem não desejamos nos aproximar muito,
nos envolver demais.
Nossas soluções rasas dificilmente são resultado de nosso interesse em ouvir
E compreender a situação calçando os sapatos de quem a está vivendo.
Sejamos profundos,
Amemos profundamente,
Incondicionalmente,
Com dedicação,
Sem medo de exagero,
Nos entreguemos
Como nosso Senhor se entregou.

Angela Natel

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Ele pagou

Das palavras que saem de minha boca e ferem outros até os atos de violência, justificados ou não,
todo atentado contra a vida, à criação de Deus,
a ira do Criador que tanto merecia - e ainda mereço - 
a dor que causei, as bolas fora,
tantos erros, tanta má vontade,
e a própria necessidade de me autoafirmar, de provar a mim mesma diante dos outros,
de constantemente me explicar,
e as dúvidas, insegurança, desconfiança, ansiedade, medo.
Por tudo isso Ele pagou, tudo Ele carregou - e por causa disso, nada devo, sou ficha limpa, feita nova todo dia, com uma chance interminável de acertar a cada amanhecer.
Sim, Ele pagou por tudo,, por mim e por você, pelo bandido e pelo mocinho, pelo político e pelo ativista, pagou o preço de cada erro, cada injustiça.
Porque não há um justo sequer... todos pecamos, todos erramos o caminho, o alvo, o plano. Em algum momento, todos nós nos desviamos.
Por causa dEle, há esperança, perdão, misericórdia, graça - para todos disponível.
Um Deus ressurreto todos venerariam, mas um Deus que veste minha carne e paga por meus erros, morrendo cruel morte... quem veneraria?
Um Deus crucificado, ensanguentado, loucura, escândalo - minha justiça colocada em xeque.
Violência respondida com perdão.
"Ele levou sobre si" meu pecado, meu senso de justiça, minha condenação e minha dor...
Carregou tudo com nossas doenças, neuroses e psicopatias, pagou por cada ato raivoso contra a vida alheia.
E está consumado - tudo foi realizado, resolvido naquela cruz.
Angela Natel


quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

(Não) Estou à venda


Por um presente
Posso te ouvir reclamar
E por favores
Ainda te ajudar.
Por uma oferta,
Uma ajuda financeira
Te deixo minha vida controlar
Até dizer que sou arteira.
Se faz algo em meu favor
É claro que tem direito
De dizer qual roupa devo pôr
Até de meu cabelo a cor.
E se considerar muito radical
Qualquer movimento meu
Pode reclamar, é normal
Se pagou, é direito seu.
De uma vez por todas, é preciso
Libertar-se desse mal
De ver favores como avisos
de controle gradual.
Amar é esperar muito menos
Ainda que se ofereça um bocado
Uma vez que relacionamentos
Não significam mercado.
Liberdade tem um preço
E vidas valem muito mais
Se acha que não mereço
Prenda-me se for capaz.
Angela Natel

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

Rótulos e estigmas


Já lhe aconteceu alguma vez de ouvir o nome de alguém e imediatamente junto a este nome lhe vir à mente toda uma ideologia, ideia, causa ou movimento a que este nome possa estar associado? E já lhe aconteceu de, por causa desta associação de inúmeros conceitos a determinada pessoa você, ao apenas ouvir este nome se posicionou na defensiva (ou ofensiva) contra o que pudesse ser mencionado a seguir?
É o típico caso de preconceito. Sim, preconceito pois, independentemente da postura que uma pessoa assuma a respeito de determinado assunto, somos seres dinâmicos e passíveis de mudanças, a qualquer momento. Qualquer rótulo ou estigma que se lance sobre alguém acaba por cimenta-la debaixo de ideias que, na verdade, sofrem variações constantemente.
Uma postura como essa só nos impede de aprender com o outro e nos coloca numa posição de tirania em relação ao próximo, já que nos damos o direito de determinar os traços principais através dos quais as pessoas são identificadas.
É por isso que por vezes me encontro a ignorar certos comentários, a fim de não me machucar tanto com esses juízos de valor que fazem a meu respeito. Não importa o quanto alguém me conheça, nenhuma pessoa tem o direito de me sintetizar em uma palavra, um rótulo, um estigma. Tenho tentado, por isso, me policiar nesse sentido e, quando ouço o nome de alguém, tentar não concentrar meu pensamento somente naquilo que sei a respeito dessa pessoa, mas me abrir para as novas possibilidades que ela tem a me oferecer. Sente-se desafiado nisso, também? 
Angela Natel

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

Falsos pastores, profetas e mestres



De falsos pastores e falsos profetas que, por anos, não fazem absolutamente nada para salvar mulheres que estão sendo espancadas sistematicamente por seus próprios maridos, sob seu conhecimento e cumplicidade, toda palavra de falso moralismo e pregação como sendo "absoluta" ou da parte de Deus (do deus deles) é vazia e não merece crédito.
Falsos profetas, falsos pastores e falsos mestres devem ser denunciados - tanto pela lei civil quanto pela Bíblia.
Líderes, pastores, autodenominados profetas e mestres que se colocam como infalíveis em sua interpretação das Escrituras, donos da verdade e defensores da literalidade absoluta de suas traduções nada mais são do que manipuladores e pastores de seu próprio umbigo, deuses de si mesmos. Fujam deles!
A incoerência de alguns intérpretes da fé cristã desponta já em seu conveniente silêncio a respeito da literalidade dos inúmeros textos bíblicos que revelam um Deus defensor dos marginalizados, escravizados e oprimidos, que resiste aos soberbos e até mesmo aos mais abastados.
Para falsos pastores, profetas e mestres, a salvação não é somente através da fé em Jesus Cristo, é preciso crer e pensar como eles, ter seu mesmo posicionamento político e econômico. 
Para estes, não basta somente crer e confessar que Jesus é Senhor, é preciso também confessar que César é Senhor.
Eu até entendo aqueles falsos pastores, profetas e mestres que citam, fora de contexto, o versículo "a letra mata" para falar contra o estudo teológico, porque eles nada mais fazem do que se defender contra a morte de seus dogmas, de sua fé podre e manipuladora, de suas escamas religiosas que só servem para enganar e controlar a vida das pessoas de acordo com sua conveniência e prazer 
Assim, eles mantém um grande número de pessoas em seus currais religiosos, dependentes de suas profetadas e direcionamento, de seus ritos e talismãs, fontes de suposto poder a fim de manter o que a obra de Cristo na cruz não é capaz de, por si mesma, fazer de uma vez por todas.
Angela Natel

No Reino dos deuses

Triste é o Reino dos deuses, onde aquele que perdeu sua utilidade é descartado publicamente.
O Reino dos deuses: um lugar onde quem tem mais (poder, dinheiro, título) dita as regras, muda o sistema, faz o ambiente adaptar-se.
Nesse Reino vejo gente agindo como animais, vejo ainda gente tentando ser Deus, determinando o pecado maior e mais perverso, fechando os olhos prá aquilo que não lhe convém.
No Reino dos deuses os fins justificam os meios, tenho professores descartáveis, censuro o que discordo, só defendo o direito que me afeta. Aqui é o outro que precisa mudar, melhorar, até que eu consiga atingir meus objetivos.
E se você tentar me censurar, quem você pensa que é?
No final das contas, um Reino de deuses, não de servos, que gritam para serem ouvidos e acabam por ensurdecer a multidão.
Deuses cegos invocados por egos enaltecidos que vão deixando para trás rastros de corações partidos.
Triste é o Reino dos deuses...
Angela Natel

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Descredo


Não creio no deus que criou apenas aquilo que considero santo e bom, deus limitado e explicável por sua criação.
Não creio no deus que precisa ser apaziguado para comigo se relacionar, limitado em seu poder de acordo com a vontade e ação humana, que depende da oração para intervir, que não pode fazer algo se um crente não der o primeiro passo.
Não creio no deus que só está onde é louvado, cuja presença depende do ambiente, do preparo, da ação e reação humana, deus que depende de mim, de minha semeadura, daquilo que faço ou deixo de fazer para que possa agir.
Não creio no deus cujo conhecimento é limitado àquilo que lhe confesso.
Não creio no cristo que não se identifica com o ser humano, que faz questão de estar sempre por cima.
Nem no cristo que me serve, que está 24h/dia disposto a realizar meus sonhos e desejos, a conceder todos os desígnios do meu coração.
Não creio no cristo que não incomoda o sistema político por dizer que seu Reino não é deste mundo, que defende e exalta patriotismo e nacionalidade, um cristo cuja pátria está aqui na terra, que serve à minha ideologia política, que é slogan de candidato, nem no cristo que toma partido a fim de respaldar poder de uns sobre os outros, que compactua com violência e exploração.
Não creio no cristo que prefere matar a morrer, que não dá a outra face, que se cansa de perdoar, no cristo que julga pela aparência, que é rápido em denunciar, que não ouve antes de falar, o cristo sem cruz, que foge do sofrimento, que defende seus direitos e vive de triunfalismo.
Não creio no cristo que não contraria as picuinhas religiosas e moralistas dos crentes, que se preocupa com a moral e os bons costumes, nem naquele que atenta em provar a si mesmo diante das pessoas. Nem no cristo que não vê humanidade em toda e qualquer pessoa, que demoniza gente, que quer saber cada detalhe da biografia do caído no caminho para saber se vale a pena socorrê-lo, que dá voz e microfone a demônio, que exclui pessoas e vem para condenar.
Não creio no cristo que privilegia denominações e detentores da Ortodoxia para conceder seu favor, que só trabalha com quem segue uma cartilha, uma caixinha denominacional, nem no cristo que permanece morto, deixando nas mãos daqueles que dizem levar seu nome toda a responsabilidade de sua vontade na terra, o cristo ausente e inerte na missão, ou preso às nossas estratégias e programações.
Não creio no cristo da desesperança, da condenação, do medo, da chantagem, que barganha salvação, que vende benção e prosperidade, que troca favores por uma hora, um evento, uma noite de oração.
Não creio no cristo que tem medo das pessoas em vez de amá-las, que nos deixou ao “deus dará”, que nos dá carta branca para dizer qualquer asneira em seu nome, nem no que justifica clubes com nomes de igrejas e organizações cristãs, no cristo que é demonstrado por elas.
Não creio no cristo cuja história ignoro, cujos fatos faço questão de não conhecer, no cristo a respeito de quem só ouço falar.
Não creio no cristo que convive pacificamente com Mamom, que precisa de dinheiro, que põe preço em sua criação, que dá e recebe dinheiro num sistema de perdas e lucro, que forma juízes e não discípulos, que envergonha os pobres e privilegia os ricos.
Não creio que ficaremos impunes por seguir e adorar estes falsos cristos.
Não creio no espírito que muitos chamam “santo”, que mais parece uma energia impessoal, cujo objetivo é atrair a atenção para espetáculos pirotécnicos de poder e ilusão.
Não creio na santidade da igreja instituição, nem na falsa unidade por ela apregoada a fim de manter aparências. Não creio que alguma linha teológica específica, doutrina ou denominação seja dona da patente da graça de Deus.
Não creio que nenhum sistema econômico ou linha política sejam exclusivos como marca registrada de quem é seguidor de Jesus Cristo.
Não creio que haja perdão quando o Espírito de Deus é blasfemado entre aqueles que se dizem seus.
Por isso, não creio que sairemos ilesos do julgamento que nos espera.
Porque nenhuma vida além da vida de Deus é eterna.
Não creio que, para nossa salvação e santificação, devemos crer em nada além do que está exposto no verdadeiro Credo Apostólico.
Angela Natel e Dalva Del Vigna
22 e 24/11/2018

Feliz dia do leitor!

Fazia muito tempo que não seguia um livro devocional junto com a Bíblia. Porém encontrei um irresistível, a ponto de quebrar a tradição. Nesse dia do leitor, apresento meu guia devocional de 2019: "Resist the Powers with Jacques Ellul", de Charles Ringma, aliando fé a serviço do Reino de Deus, resistência aos poderes de nossa era e uma caminhada coerente entre mente, coração e mãos.


domingo, 6 de janeiro de 2019

É impressão minha?

É impressão minha ou é normal esperarem que vc faça o melhor, dê tudo de si mas trabalhe de graça e ainda agradeça caso receba por isso?
É impressão minha ou passei dos limites quando apenas pensei que poderia dizer não ao constatar que teria de dar além do que tenho?
É impressão minha ou sou descartável, e os elogios que recebo na prática não querem dizer nada, apenas aliviam quando fico de mãos vazias, sem direitos, sem chão?
É impressão minha ou me tornei uma obra de consulta para quem precisa de ajuda, mas perfeitamente encaixável numa prateleira quando não solicitada, e ali devo permanecer, calada, para não ocupar espaço indevido?
É impressão minha ou sou ótima amiga quando atendo às solicitações, mas quando dou a entender que preciso de ajuda, que meus serviços custam alguma coisa, sou indelicada, não levada a sério e constrangida por isso?
É impressão minha ou mesmo quando aviso que algo me incomoda sou ignorada, forçada a me ajustar, mas raramente levada em consideração ao solicitar ajuste alheio?
É impressão minha? Trata-se de um mal que alimentei minha vida toda, trabalhando incessantemente, me gastando pelos outros, vivendo para ajudar, complementar, tapar buracos alheios, sem poder esperar nada, tendo ainda que agradecer quando recebo algo por isso ou, recebendo inúmeros elogios e até expressões de culpa quando não recebo, mas essa culpa alheia fica sem produzir mudança alguma na situação?
Fui eu mesma que alimentei tudo isso? Fui eu mesma que criei este monstro que constantemente me consome o fígado, tal qual Prometeu, sem nunca alcançar o descanso da alma?
Trata-se de ingratidão de minha parte ou de alguma espécie de mesquinhez de meu ser ao tentar viver do suor de meu trabalho e esperar realmente que o mínimo de condições de trabalho me sejam garantidos, como a qualquer trabalhador comum?
Será exigir demais de quem se diz meu amigo não querer que eu forneça gratuitamente meus serviços somente pelo fato de que é através deles que estou tentando reconstruir uma vida normal, cuja caracterização ainda me é desconhecida?
Será normal ser constrangida ao esperar pagamento por serviços prestados?
Será normal me sentir usada, abusada e até escravizada, ao ponto de chegar a estar exausta de mês após mês temer não receber pelos serviços prestados e ainda dar inúmeras justificativas por cada frase dita e mal interpretada, por cada olhar tido como estranho ou ameaçador, por cada sorriso torto que dei, por cada preposição mal colocada numa frase ou gesto mal medido numa conversa?
Será normal tudo isso?
Não sei mais o que é normal. Não consigo compreender a situação. Estou esgotada e realmente me sentindo escravizada, sem chão, sem direitos trabalhistas, sem perspectiva e ainda com a impressão que confiei nas pessoas erradas.
Sei até mesmo que colocar essas palavras por escrito pode me custar muito mais caro, mas nem isso me assusta mais. Já espero o pior.
Já tive de fazer empréstimos para cobrir o buraco de erros alheios que voltaram contra mim, justificando-se como se o erro fosse só meu.
Já estou no limite de minhas emoções, à mercê de quem já me deixou na mão mais de uma vez.
Elogios e palavras de sentimento de culpa e amizade são usados e abusados na tentativa de encobrir erros que nunca mudam, situações que permanecem esmagando e escravizando.
Escrevo agora, porque não sei o resultado ainda. Mas como já citado, espero o pior. Já perdi tudo mais de uma vez.
Angela Natel – 29/08/2014

sábado, 5 de janeiro de 2019

Quanto vale uma mulher?

Quanto vale uma mulher? Com que moeda você iria comprá-la?
Se tomar minha história como exemplo, valho menos que um objeto, sou coadjuvante nessa narrativa.
Fui usada, abusada, descartada e injustiçada numa família chauvinista sem exceção.
Aquele que levou a herança de filho mais velho, mesmo sendo o 4º filho não soube ser misericordioso para comigo, Tamar, sua nora.
Sim, estou falando da família de Judá, o patriarca, 4º filho de Jacó, que veio a ser o primeiro em excelência, influência e riqueza.
Casei-me com seu filho mais velho, Er, mas fui uma esposa infeliz. Aturar perversidades do marido machuca qualquer coração. Quem nunca foi machucada por causa da maldade dos outros? Mas o pior de tudo foi ter de suportar o luto sem nem ao menos ter tido um filho.
Viúva, sem filhos, dupla vergonha e marginalização. O que foi que eu fiz para merecer tal destruição?
Porém um costume da época e de nossa sociedade ditava que, se um homem morria sem filhos, o irmão a viúva tomava para manter a genealogia.
Então, após sofrer tantos desatinos, fui entregue como objeto de procriação a outro, irmão do falecido, e Onã se tornou meu segundo marido.
Por saber que o fruto gerado de nossa relação não seria seu filho considerado, Onã derramava sua semente no chão, deixando Deus muito decepcionado.
Imaginem só minha angústia e tristeza, ser usada por prazer, mas sem filhos poder ter, por mero capricho e malvadeza.
E, como se não bastasse tanta desgraça, veio Onã também a falecer e, viúva pela segunda vez, fui devolvida para casa, a fim de esperar o terceiro irmão crescer.
Promessas, promessas, promessas que nunca chegaram a vingar. Uma vida rasgada, machucada por um pai e seus três filhos. Dor na alma que não quer calar.
O terceiro filho cresceu, o pai enviuvou, mas a promessa não cumpriu, e sozinha me deixou.
Até que Judá apareceu trabalhando perto daqui. Encontrei-o, mas não me reconheceu. De prostituta me vesti.
Foi a chance da minha vida, nenhum homem a me controlar. Prazer sentido, vingança cumprida. Penhorou suas coisas prá me pagar.
Então senti crescendo em mim vida que Deus gerou. Alegria renascida, esperança que transbordou.
Ao saber da gravidez, Judá mandou-me para a morte, mas o mesmo penhor que em minhas mãos o condenava livrou minha sorte.
E após toda essa triste história de dor, sofrimento, viuvez, privação de filhos, abandono, abuso, esquecimento e injustiça, mesmo não sendo mais tocada por homem nenhum, fui abençoada com gêmeos: Perez e Zerá.
Que sofrimento é tão grande que não deixe passar uma réstia de luz? Que maldade tão esmagadora exista que não permita uma escolha diferente para si?
Não foi ideal meu caminho, nem florida minha jornada. Muitos me tiveram por pecadora, amaldiçoada. Poesia não se mostra em tudo pela vida e a injustiça grita em nossos ouvidos.
Mesmo assim sou voz ativa, não passiva, nessa história de homens que pensavam estar escrevendo no livro da redenção.
E o mais importante de tudo é que meu nome aparece na lista de quem verdadeiramente fez História para a nossa salvação.
Referências Bíblicas: Gênesis 38; Mateus1:1-3
Adaptação de Angela Natel – 01/06/2011.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Traidora!


Você não esteve em meu lugar, mas já teve que fazer uma escolha em que sabia que iria se arrepender pelo resto de sua vida?
Minha fama é de traidora. Alguém que entregou a pessoa amada nas mãos de seus piores inimigos: o meu próprio povo! Má fama é algo que se apega a você como uma tatuagem cobrindo toda a sua alma. Não há mais como se livrar dela.
Traí o homem a quem mais amei em toda a minha vida, acredite se quiser. Como você agiria em meu lugar? Tendo que escolher entre dinheiro e a vida da pessoa amada. Ele era um estrangeiro vivendo em nosso meio, então recebi a proposta. O que você escolheria?
Sim, eu sou Dalila. Ainda me acha uma traidora? Eu receberia 13 quilos de prata de cada líder filisteu caso descobrisse o segredo de sua força.
Então passei noite após noite, em terríveis tentativas, Sansão só me inventava mentiras, e caí em todas elas, delatando minhas intenções. Até que, vencido pelo cansaço e chantageado pelo nosso amor, contou-me seu precioso segredo.
Se tão somente ele tivesse me dirigido o olhar, logo após eu ter mandado arrancarem aquelas suas tranças, tenho certeza que seu olhar me seria de amor. Um olhar de amor após uma traição. Sim, ele amou uma traidora.
Penso que assim deve ser a figura de um herói, um grande guerreiro, um Rei!
Mas a culpa que carrego por ter sido responsável pelos seus olhos furados e, mais tarde, por sua morte, é assustadoramente um alívio.
Sim, porque amando-o e conhecendo-o como amei e conheci, sei de seu prazer em destruir seus inimigos, ainda que fossem meu povo, e do chamado de seu Deus, que cumpriu ao morrer.
Minha família, meu povo, quem sou, o que tenho, nada disse teve sentido sem o toque desse homem apaixonado, forte e destemido e completamente determinado a cumprir sua missão.
Nenhuma outra marca ficou mais fundo gravada em meu coração do que a marca dessa traição.
No fim das contas, não foi Sansão a quem traí, foi a mim mesma e ao fogo que ardia dentro de mim todas as vezes que ele me contava as histórias do seu povo e do seu Deus. Percebi, então, que ao tentar salvar minha família, foi que a perdi, e ao tentar defender meu povo e cultura desperdicei a chance de receber nova vida ao lado do único que verdadeiramente me amou.
Referências Bíblicas: Juízes 16
Adaptação de Angela Natel

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

Enganada


Você já foi enganado por alguém? Já experimentou essa sensação?
É um sentimento amargo que se forma na alma, gosto de mentira, gosto de traição.
No meu caso, acho que foi pior. Eu fui feita pelas mãos de Deus, de uma parte de um homem. Eu sou a primeira mulher, uma novidade, criada para completar, ajudar e caminhar lado a lado com Adão, para juntos cuidarmos da criação de Deus, termos filhos e dominarmos os animais.
Era realmente o paraíso, no pleno sentido da palavra. Mas foi bem no meio desse cenário que aconteceu... fui enganada!
É triste só de lembrar, me causa indignação.
Depois de ser criada, fui recebida com romantismo e paixão. Logo depois, Adão me repassou as ordens que tinha recebido de Deus sobre não comer do fruto de certa árvore. Prá mim, parecia simples, até o dia em que uma serpente apareceu com uma conversa estranha que me confundiu. Ela estava contradizendo o que Adão tinha falado que era a ordem de Deus mas, como ele estava comigo e não a desmentiu, julguei ter ouvido mal, e assim fui entrando no papo, ora respondendo, ora me contradizendo e... já que Adão, que estava ao meu lado, não se manifestou, aceitei comer daquele fruto, o da árvore proibida, e também entreguei a Adão, que comeu sem problemas.
Deus, mais tarde, veio e nos corrigiu, mostrando as conseqüências de nossa desobediência, do nosso erro.
Fui enganada... seja pela omissão de meu marido, seja pelas palavras distorcidas da serpente, seja pela falta de contato direto com Deus.
Sim, porque desde então vivemos tão distantes de Deus e um do outro... sofrendo, esperando ver nossos filhos crescerem e, quem sabe um dia, vencer a serpente.
Adaptação de Angela Natel.
Baseada nos textos bíblicos de Gênesis capítulos 2 e 3 e 1ª Timóteo 2:14 e no livro “O silêncio de Adão”, de Larry Crabb.

IGREJA E PSICOPATOLOGIA



"Não há a mínima dúvida de que igrejas podem criar ambientes psicopatológicos, com uma cultura e uma forma de administrar os conflitos morais dos seres humanos capazes de levar homens e mulheres à neurose crônica. Quanta energia gasta com a culpa que jamais é expiada! Quanta tentativa de transformar homem em anjo! Quanta obsessão com um aspecto da ética em detrimento daquilo sobre o que as Escrituras falam muito mais extensamente, como as condições de vida dos despossuídos, a promoção da justiça social, a defesa do direito e o amparo ao que carece de solidariedade!

Com as Escrituras abertas, todos os membros das mais diferentes igrejas deveriam fazer continuamente duas perguntas: “O modelo de espiritualidade de minha igreja fomenta a real santidade de vida?” e “O modelo de espiritualidade de minha igreja colabora para a disseminação de um comportamento neurótico?”. Vale a pena ouvir o que Freud tem a dizer sobre culturas que carecem do divã:

"Se o desenvolvimento da civilização possuiu uma semelhança de tão grande alcance com o desenvolvimento do indivíduo, e se emprega os mesmos métodos, não temos nós justificativa em diagnosticar que, sob a influência de premências culturais, algumas civilizações, ou algumas épocas, da civilização — possivelmente a totalidade da humanidade — se tornaram neuróticas? [...] Eu não diria que uma tentativa desse tipo, de transportar a psicanálise para a comunidade cultural, seja absurda ou que esteja fadada a ser infrutífera... podemos esperar que, um dia, alguém se aventure a se empenhar na elaboração de uma patologia das comunidades culturais".

Tenho profundo respeito pela psicanálise, embora não a veja como panaceia para as dores da alma. Pode ser que Freud tenha ido longe demais na proposta de usar a psicanálise para fazer análise objetiva de culturas fomentadoras de psicopatologias. Mas não tenho dúvida de que seu ponto de vista sobre a dimensão cultural das neuroses é fato irrefutável e que instituições religiosas deveriam se submeter a essa análise, a fim de refletir sobre a dor que infligem ao espírito humano por força de ideais irrealizáveis e desconectados da realidade. Contudo, é uma tarefa espinhosa e que requer imensa sabedoria, sensibilidade e diálogo com as ciências que lidam com o tema da psicopatologia."

Antonio C. Costa

Extraído do livro, "Azorrague", que foi lançado no final do ano passado pela Editora Mundo Cristão. Ele pode ser adquirido no site da Amazon.

O Barco de Pedro Pietersz



Fonte: O espelho dos mártires

Foram tempos difíceis. Não pensar como as autoridades da Igreja, que eram os responsáveis ​​por ditar a maneira como você deveria viver sua fé, como você tinha que interpretar a Bíblia, custava caro. Em suma, a sujeição ao Presbítero / Bispo devia ser total. Mas havia um grupo de rebeldes, pessoas simples com um espírito libertário que queriam viver seguindo a Jesus completamente. Em face de tal opressão, era impossível expressar abertamente a sua fé, então esconder-se era sua melhor opção. Eles eram tão boas pessoas que solidariamente muitos vieram em sua ajuda. Havia também aqueles que, por medo, ficavam em silêncio quando eram perseguidos ou aqueles que os denunciavam diretamente às autoridades eclesiásticas. Este grupo marginal era os anabatistas. Eles tinham que se encontrar em segredo e Pedro Pietersz, um barqueiro no rio Amstel, em Amsterdã, estava fazendo de seu barco um ponto de encontro.

Você imagina esse momento ?!!
Incentivar-se a ler e interpretar os ensinamentos de Jesus fora do que os líderes religiosos lhes autorizaram. Conhecer-se marginal, herético, não respeitar as práticas e doutrinas aceitas era o caminho que empreendiam.

A solidariedade de Pedro custou caro a ele, que foi descoberto e executado na fogueira em 26 de fevereiro de 1569.

Você daria sua vida por um grupo de hereges?
Você ofereceria hospitalidade àqueles que não estão sob as regras impostas pelas autoridades eclesiásticas?

Tenha um bom dia.

Luis Ma. Alman Bornes
Igreja Menonita Anabatista
Buenos Aires, Argentina

"No dia em que os Cristãos pararem de distorcer as escrituras


"No dia em que [os Cristãos] pararem de distorcer as escrituras descobrirão a liberdade e a falta de obrigatoriedade dominical. Talvez descubram que foram enganados com intermináveis sermões de autoajuda, e que também foram ensinados a consumir espiritualidade ao invés de amadurecer nela. Será um dia muito triste, pois perceberão que suas faculdades mentais e analíticas ficaram adormecidas por anos a fio sob a batuta panteísta de espertalhões vestidos de pastor ou sacerdotes - sem falar no pessoal “relevante” das igrejas-boate de modinhas Gospel. A dor e desespero seriam totais se neste dia se derem conta de que são eles os que dizem “Senhor, Senhor, em teu nome”, sem contudo conhecê-lo nem terem feito o que ele manda. Mas, talvez sejam poupados, tendo em vista que não foram ensinados o Evangelho e possivelmente nem notem que Jesus voltou. É dura essa palavra? É nada! Duro é saber que se as escrituras parassem de ser distorcidas pelos cristãos o conhecimento de Jesus encheria a terra como as águas cobrem o mar e poderia haver mais justiça e esperança! No presente momento há igrejas que sabem mais do satanás e de magias psicologizadas para regressão, cura interior e desatar maldições hereditárias do que da simplicidade, totalidade, suficiência, amor e senhorio de Cristo!"

Falsos pastores, profetas e mestres



De falsos pastores e falsos profetas que, por anos, não fazem absolutamente nada para salvar mulheres que estão sendo espancadas sistematicamente por seus próprios maridos, sob seu conhecimento e cumplicidade, toda palavra de falso moralismo e pregação como sendo "absoluta" ou da parte de Deus (do deus deles) é vazia e não merece crédito.
Falsos profetas, falsos pastores e falsos mestres devem ser denunciados - tanto pela lei civil quanto pela Bíblia.
Líderes, pastores, autodenominados profetas e mestres que se colocam como infalíveis em sua interpretação das Escrituras, donos da verdade e defensores da literalidade absoluta de suas traduções nada mais são do que manipuladores e pastores de seu próprio umbigo, deuses de si mesmos. Fujam deles!
A incoerência de alguns intérpretes da fé cristã desponta já em seu conveniente silêncio a respeito da literalidade dos inúmeros textos bíblicos que revelam um Deus defensor dos marginalizados, escravizados e oprimidos, que resiste aos soberbos e até mesmo aos mais abastados.
Para falsos pastores, profetas e mestres, a salvação não é somente através da fé em Jesus Cristo, é preciso crer e pensar como eles, ter seu mesmo posicionamento político e econômico.
Para estes, não basta somente crer e confessar que Jesus é Senhor, é preciso também confessar que César é Senhor.
Eu até entendo aqueles falsos pastores, profetas e mestres que citam, fora de contexto, o versículo "a letra mata" para falar contra o estudo teológico, porque eles nada mais fazem do que se defender contra a morte de seus dogmas, de sua fé podre e manipuladora, de suas escamas religiosas que só servem para enganar e controlar a vida das pessoas de acordo com sua conveniência e prazer
Assim, eles mantém um grande número de pessoas em seus currais religiosos, dependentes de suas profetadas e direcionamento, de seus ritos e talismãs, fontes de suposto poder a fim de manter o que a obra de Cristo na cruz não é capaz de, por si mesma, fazer de uma vez por todas.

Angela Natel - 08/01/2019

Quanta dor há nesse mundo?

Quanta dor há nesse mundo?
Quanto nós podemos suportar?
Dor, ódio, violência.
Quanta dor há nesse mundo?
Um tapa, um soco, um chute, um tiro.
Dor que gera ódio, ódio revertido em vingança.
Vingança, medo e mais dor.
Quanta dor há nesse mundo?
Nojo, descaso, rejeição, omissão.
Instinto de auto preservação
Que nos faz desejar armas
Medo que tira vidas.
Quanta dor há nesse mundo?
Cansaço, dor, confusão, pavor.
Dor física, psicológica, dor da alma.
Morte prá fugir da dor.
Quanta dor há na pessoa perto de mim?
Quanta dor ela sente?
Quanta dor já sentiu?
Vidas dilaceradas em dor.
Quanta dor no outro consigo suportar
antes que eu me torne pedra
pedra lançada contra o outro
pedra que não sente dor?
Angela Natel

Quando mais aprendo

Quando mais aprendo
e me desafio constantemente.
Quando tento ultrapassar limites
e ser alguém mais, para exemplificar.
Quando me desdobro para ser compreendida
e traduzir ideias, conceitos, de maneiras diversas
tentando alcançar as diferenças em quem me ouve
e, de múltiplas maneiras, ser ouvida.
Quando me realizo, o tempo pára,
e naquele instante, toco a eternidade.
Quando sou ministrada, e minha falta de discernimento
é alcançada, ali não me sinto sozinha.
Quando minha vida faz sentido
e todo o trabalho é recompensado.
Quando sou aluna ao ensinar
e repartir de mim aos que ouvem.
É nesse instante que sou curada.
Sim, lecionar, para mim, é isso.
Cada aula, cada oportunidade,
uma chance de ser transformada.
Angela Natel

Subliminar


Verme intragável entre os dentes
deixa ardente o paladar.
Sussurro que na noite fria
faz um demente a vagar.
Atravessa a rua e num relance
sente sufocar.
Grita, desesperado,
frente ao vil pulsar,
ao que vê do outro lado da rua:
“Tente não olhar!”
Mas já era tarde, bote da
serpente a rodear.
Foi cair semimorto
rente ao pé do mar.
A serpente segue, ainda há
gente prá enganar.
Angela Natel

Empatia


Tem pessoas que só começam a sentir empatia pela dor alheia quando passam por situações semelhantes, quando sentem dores parecidas...
Eu fui uma dessas pessoas...
Só compreendi um pouco do que é viver um relacionamento abusivo quando estive em um, sem saída, longe de meu país, sem dinheiro para voltar, e ainda com pessoas que se diziam meus amigos e líderes me chamando de mentirosa.
Agradeço a Deus pelos poucos que acreditaram em mim e que me estenderam a mão quando mais precisei. Foram pouquíssimos...
Agradeço a Deus por minha família, que me recebeu de volta e, principalmente, por minha irmã Angelita, que me defende e me ama incondicionalmente.
Depois do que passei, nunca mais vi a vida da mesma maneira. Não sou a mesma pessoa. Consigo, pela graça de Deus, perceber a dor alheia, ainda que não a sinta, me compadecer e ouvir antes de emitir julgamento.
As decisões da vida são complexas, exigem sensibilidade, empatia, mais ouvir do que emitir opinião.
Não se trata de opinião, na verdade. A vida é complexa, exige um caminhar junto, uma cumplicidade que nos desgasta, uma renúncia que nos tira do conforto. Por isso são poucos os que, de fato, caminham conosco.
A maior parte das pessoas apenas se resume a expectadores, como se estivéssemos em um palco, dando um show a elas, abertos ao julgamento e condenação.
A vida não é um show. 
Quem vive de show, na verdade, não vive.
Por isso, é preciso pedir socorro, é preciso ouvir os gritos de quem grita, ouvir as razões antes de dar opinião, pesar as razões, calçar os sapatos do outro e tentar sentir sua dor.
Muitos dizem seguir a Cristo, mas foi isso que Ele fez... quem está disposto a seguí-lO, que faça o mesmo!
Angela Natel

Dizem...

Dizem como tenho que me vestir,
se devo ou não tatuar.
Falam de meu cabelo, meu linguajar.
Dizem até o que devo ou não publicar.
Dizem que devo fazer isso ou aquilo,
o que mais querem é me controlar.
Dizem que isso é só preocupação, cuidado,
mas nunca se oferecem para ajudar.
Apenas falam, falam sem parar,
a meu respeito para outros,
falam de mim, comentam, condenam,
falam para mim, mudar-me tentam.
Cansada de tanto falatório.
Cansada de tanta opinião.
Amor e serviço é raridade
doam palavras, promessas,
sua vida, não.
Angela Natel

Eu acho que foi assim...


1934. O pastor luterano Bonhoeffer assina a Declaração de Bremen, e funda a Igreja Confessante, declaradamente oposicionista ao Nazismo.

Nazismo tava na moda.

Aí surgiu nas rodinhas de corredor de igreja: - Cê viu o Bonhoeffer arrumando confusão de novo? O cara não pára quieto. Tá lá assinando aquela Declaração subversiva. - Fez seminário, mas nunca leu Romanos 13. Tem que se sujeitar às autoridades, cara! - É um subversivo. É um passo pra heresia, vai cair no liberalismo. Fica vendo! - Esses caras não entendem que só dá pra enfrentar a crise com mão de ferro. A gente precisa de um cara que fala o que pensa! Essa crise econômica é culpa de judeu.

Aí hoje, 84 anos depois, cá estamos nós. Tem filme do Bonhoeffer. Livros dele. Sobre ele. Camisetas dele. E a gente achando o cara o mó bacana porque enfrentou o Hitler.

Mas aí, chegado, aí é fácil, né. Saca só: A gente leu a história e viu que ele se posicionou, viu que ele enfrentou uma tirania horrível e pagou com a vida o preço de ter lutado, se posicionado, enfrentado.

Agora, a gente acha o cara mó bacana. Hoje.

Mas será que lá em 1934 cê ia falar: Ô Bonhoeffer. Tâmo junto! É isso aí. Melhor fazer o mal do que ser o próprio mau.

Na boa, analisa aí. Será?

E concorrer à forca com o seu brother?

1963. O pastor batista Martin Luther King Jr. caminha em Washington e discursa para duzentas mil pessoas afirmando que ele tem um sonho. Seu sonho é ver seus filhos negros indo à mesma escola de crianças brancas.

Segregação racial tava na moda.

Aí surgiu nas rodinhas que se formaram embaixo das árvores do Monumento à Washington: - Olha lá o Luther, esse cara se acha o defensor dos fracos e oprimidos! Para ele no mundo só negros sofrem. E o sofrimento dos vietnamitas... Ele não vai falar nada? - Cara devia se concentrar em pregar o Evangelho. É pastor para quê? Fica aí nessa de direitos dos negros e injustiçados! Coisa humana. Tem que se concentrar no sagrado! - Alguém precisa avisar esse cara que se ele continuar com esse lance de política, essa conversa de esquerdista aí, ele vai morrer. - Por isso que não dá pra misturar religião e política!
Aí hoje, 55 anos depois, cá estamos nós. Novamente. Tem filme do Luther King. Camisetas. Dia do cara. E a gente achando mó bacana que ele enfrentou a Ku Klux Klan.

Será que lá em 1963, estaríamos nós braços dados com ele, tomando bicuda na cara dos policiais e sendo cuspidos direto, dizendo: aguenta firme, irmão!

Hoje, tudo bem, né.
Mas e lá? Na hora de fazer a história?
Porque hoje o maluco que tá tomando as pedradas e você sentando o pau pode ser o cara da história amanhã. Porque, não sei, mas... parece que sempre é assim com os heróis do passado. Eles antes eram uns Zés Ruelas nos corredores e bate-papos dos "bacanas" e das "pessoas de bem". Difícil entender o momento histórico e se posicionar. Tem que ter peito.

Por isso que eu reavalio minha consciência para enfrentar esse momento histórico e me posicionar de modo que amanhã eu não venha a me arrepender. E tem um jeito de acertar. Ficando ao lado dos oprimidos. Dos ferrados. Dos injustiçados. E em amor, em boa consciência, em afeto e Graça.
Cê pode até perder, morrer, ser enforcado ou levar um tiro no peito, mas... a história, meu chapa, ela te absolverá.
Dois pastores protestantes. Um negro. Americano. Um branco. Alemão. Dois resistentes. Subversivos. Heróis de hoje. Malvistos do passado. Respeitados pela igreja de hoje. Excomungados pela de ontem. Que temeram muito mais a vergonha de não enfrentar o caos do que a morte. E honraram a Deus servindo ao próximo.

Deles eu não me envergonharei.
Tampouco dos irmãos que lutam hoje, neste momento histórico e que são tachados de tudo pelos comentaristas da história. Que comentam, mas não a alteram.

Sou inspirado por estes tais "vilões do presente".
Na contramão dos que escolhem Barrabás.
Sou discípulo do preso político da cruz do meio.
Sentenciado por dois poderes paralelos. Que não morreu de trombada de camelo em esquina movimentada de Jerusalém. Foi morto. Assassinado. Acusado de subversão ao Império e Heresia à religião.

Que entrou na história pra mudar a minha sorte. Peço a Ele que me ajude a me posicionar. Sem medo do que virá. Com a coragem e a loucura de quem sabe que não veio a este mundo de passagem, nem rolézinho.
Gito Wendel via Instagram

Comunicação...

Há os que usam o nome de Deus
para exercer influência, mentorear.
Há coachings e PhDs
que tentam, a todo custo, se autoafirmar.
Defesas que já abandonei,
estigmas inúteis, vão falar.
Uns mentem e manipulam,
outros prometem o que nunca irão experimentar.
No fim das contas, se perde
toda a sensibilidade
de sentir o pé no chão
e perceber singularidades.
A dor ao redor não sentida
traz consigo a indiferença.
Generalizar vira regra de vida
quando se perde a consciência.
Por isso, fórmulas mágicas
se esvaziam nas paredes da casa
onde o cônjuge, abandonado
coleciona lágrimas.
De que adianta inspirar,
gravar vídeos, ser popular,
se o descaso com a família
é o que vai sobrar?
De que adianta fazer propaganda
de seu trabalho e competência
se não sabe ouvir o outro
nem interpretar além das aparências?
Comunicação serve para todos
numa via de mão dupla.
Melhor ajudar a si mesmo
antes de oferecer ajuda.
Angela Natel

Armas para matar bandidos

"A população se arma para se proteger contra os bandidos... talvez sem notar que a própria população também é composta de bandidos... "Bandido" não traz estrela na testa. Ele pode ser o cardiologista que abusa de pacientes; o líder espiritual que não reconhece limites; o facínora que todos reputam ser "boa gente".... O nazista Eichmann conseguiu viver longos anos em solo argentino, de forma pacata, sendo elogiado como "bom cidadão"... Quando se facilita o acesso às armas, facilita-se o acesso às armas a todos... E esse critério de ter ou não antecedentes é para lá de insuficiente... Sempre é possível o "primeiro caso", não é? Então, muitos maridos ciumentos encontrarão meios mais fáceis de fazer valer suas vontades, em momentos de fúria... Outros não deixarão suas armas em casa, e as levarão consigo nos bancos dos carros, empunhando-as em qualquer conflito no trânsito... Outros ainda poderão atirar ao menor sinal de perigo, atingindo o azarados que possam estar no caminho dos projéteis.... Pode ser que o receio de encontrar uma arma pela frente realmente impeça a conduta de potenciais delinquentes... Creio que sim... E, repito: potenciais delinquentes não necessariamente possuem antecedentes criminais... Mas, a pergunta é saber se, no final do dia, haverá maior ou menor violência social; se isso redundará na preservação da vida ou não. A vingar essa lógica maniqueísta: "bons" versus "malvados", todos estarão armados, igual faroeste caboclo. Sobreviverá quem souber atirar com maior "maestria"... Quem puder matar mais ou neutralizar mais... Nada garante que seja você. Nada garante que seja quem tem razão. Max Weber chegou a acreditar que o elemento caracterizador do Estado seria o monopólio do uso legítimo da violência... Daí que os mecanismos de desforço incontinenti, a exemplo da prisão em flagrante, legítima defesa, estado de necessidade etc., teriam caráter absolutamente excepcional no sistema... Mas, no momento, cada vez com mais frequência, o Estado reconhece sua falência e transfere aos particulares o exercício do poder de polícia... seja por meio da criminalização de condutas omissivas (convertendo conivência em delitos), seja pela imposição de deveres de delação (whistleblower e gatekeepers), seja por meio da imposição de mecanismos de autocensura e autocobrança (lançamento por homologação, compliance etc.)... Nessa toada, não é de se admirar que a Administração Pública atribua aos particulares, pouco a pouco, a imposição da autotutela... Quantos não são os bairros em que há verdadeiro policiamento privado? Quantos não são os condomínios que mais parecem fortalezas medievais? Bom... essa é a marca dos tempos.. Todos estamos conectados, o tempo todo... Ainda assim, parece que cada sujeito carrega consigo o seu próprio fosso medieval, e sem pontes elevadiças... E aí? Já encomendou a sua Beretta 9mm?"
 Flavio Antônio da Cruz

Então é isso?

Então, o próximo passo para com os que discordam, incomodam, ferem nossa ditadura, é o enjaulamento de menores de idade, esterilização forçada, generalização de tratamento, trauma após trauma? 
Bela sociedade demoníaca nos tornamos: matar, roubar e destruir virou nosso mote, nosso hobbie - e tudo em nome de "Deus".
Usamos a Bíblia sem exegese nem hermenêutica, lutamos contra o "humanismo" para nos tornarmos gnósticos, ignoramos os erros cometidos na história para cometermos atrocidades piores.
Sem ter Cristo como referência, nos dizemos cristãos, e nos tornamos os porta-vozes do anti-reino de Deus, o próprio anticristo de nossa geração.
Duvida? Que tal estudar, ler, pesquisar, se informar, antes de emitir opinião ou repetir discurso só porque, no momento, é lógico ou faz sentido?
Que tal analisar com calma as complexidades e nuanças de cada situação?
É cristão? Que tal voltar seus olhos para Cristo antes de a qualquer um que diz representá-lo?
Angela Natel

Na corda bamba entre Humanismo e o Gnosticismo

Com medo de nos enxergarmos hereges de nossa pequena teologia evangélica, caminhamos na corda bamba das sutilezas que separam as caixas do humanismo e do gnosticismo - segundo nosso próprio entendimento, é claro. Digo ‘pequena teologia’, uma vez que Deus não cabe nela, na minha ou na sua, ainda que seja um produto adequado de nossa interpretação a respeito da auto revelação da divindade.
Ainda assim, o que classificamos ‘Humanismo’ pode ser um rótulo de proteção para enfim cairmos na heresia do gnosticismo. Ao fazê-lo, desumanizamos o Senhor Jesus e desvalorizamos o que o caracteriza como plenamente humano – e, consequentemente, repudiamos as manifestações humanas que glorificam o Senhor. Também, nesse sentido, podemos classificar as obras, fatos e manifestações em hierarquias que vão do mais espiritual ao menos espiritual, atribuindo-lhes juízo de valor, do melhor ao pior, respectivamente. Eis um dos riscos que a linha conservadora da Ortodoxia evangélica mais corre hoje em dia.
Há, também, por outro lado, o risco do culto ao Espírito sem o Cristo encarnado, da ação dos dons e manifestações espirituais sem que o meio e o centro de tudo seja a pessoa de Cristo. Esta é a heresia ‘gnóstica’ infiltrada no seio evangélico que centraliza seu culto em torno dos sinais e maravilhas promovidos pelo Espírito, como um fim em si mesmo.
Dessa forma, flechamos uns aos outros segundo os riscos pessoais que decidimos correr, dependendo do mal que consideramos pior. Não sei, pessoalmente, qual dos dois – se o humanismo ou o gnosticismo – o seja (creio que os dois extremos são igualmente perigosos), porém parece que essa luta pessoal em encaixotar o outro em uma ou outra classificação, com base apenas na maneira como este se expressa ou do material que compartilha e valoriza em determinado contexto, não deixa de ser um risco para nossa vida em comunidade – o que também pode ser interpretado por alguns como ‘humanista demais’.
Quaisquer que sejam a sua e a minha interpretação, que tratemos com cuidado a manifestação do outro, seja em palavras, ações, publicações, mensagens. Que olhemos com a calma que dispensamos ao interpretarmos um texto, que tenhamos amor nas conversas e apontamentos, que não olhemos sem, antes, perceber os contextos, sem buscar as intenções. Muito do que pensamos pode ser derrubado com uma simples atitude como esta, além de preservar o respeito mútuo, sem perdermos o cuidado recomendado contra as heresias.
Angela Natel

Martinho Lutero Negro

Martinho Lutero Negro

Relacionamento abusivo


Você pode achar isso um exagero, pesado, inapropriado. Mas é exatamente exagero, pesado e inapropriado, em minha opinião, a tendência da maior parte das pessoas, principalmente das que se dizem "espirituais", religiosas, em preferir culpar as mulheres vítimas de violência doméstica.
A gente que explode vira bruxa, louca, descompensada.
Como já cansei desses rótulos, e da mania de ouvirem e acreditarem somente na versão masculina da história, ou na versão de quem, aparentemente, tem algum tipo de poder ou autoridade, prefiro a companhia dos que não se importam em caminhar com gente defeituosa, com a vilã da história.
No final das contas, só Deus sabe as agressões físicas e psicológicas que sofri, de quantas arbitrariedades surgiram daqueles de quem pensei que teria algum tipo de apoio, de quantas oportunidades passaram simplesmente pelo fato de que já me tinham rotulado, pensaram já saber de toda a história.
Infelizmente, até hoje sofro as consequências dos traumas, seja na dificuldade em estabelecer relacionamentos, seja no medo de um simples toque físico, até na constante luta contra a insegurança e a ansiedade. Talvez conviver com a eterna incompreensão dos que me cercam seja o pior dos frutos do casamento abusivo de que me livrei.
Agora, penso eu, a vida é muito curta para me ater às conversas com quem acha que sabe o que me aconteceu somente por ter ouvido o que outros falaram a meu respeito.
Angela Natel

MANIFESTO DA UNIÃO CÍVICA EVANGÉLICA PAULISTA - 1936





A União Cívica Evangélica Paulista [vem aos] seus eleitores nesta hora solene de tanta confusão e incerteza, para reafirmar sua existência, por muitos julgada extinta, por falta de manifestações exteriores visíveis e confirma seus [princípios] exarados no manifesto de 15 de janeiro deste ano do qual extraímos os seguintes trechos que relembram nossa atuação e nossos compromissos:
A Diretoria da U. C. E. P. ratificando o aviso colocado nas folhas evangélicas em julho de 1933, tem o prazer de comunicar a todos que conosco tomaram parte na campanha eleitoral que caminhará como orientadora do movimento eleitoral evangélica no estado de São Paulo, em conexão com os ideais da legenda “Liberdade e Justiça” que foi justamente a divisa que apresentamos na última campanha eleitoral. A U. C. E. P. fica constituindo um centro evangélico de vigilância para acolher e providenciar sobre todos os casos que cheguem ao [nosso] conhecimento em que haja pressão a liberdade de consciência e desrespeito ou quebra de direitos constitucionais, que garantem a liberdade e igualdade de crenças perante a lei, como qualquer perseguição e injustiça por motivos religiosos. Assim todos aqueles que forem vítimas de coação ou receberem atos concretos que ponham em opressão a liberdade de consciência por motivos religiosos, queiram dirigir-se a diretoria que tomará as providências que no caso couberem. 
A diretoria entende também ser seu dever neste momento de confusão e incertezas, declarara francamente os pontos que a norteiam quanto a ideologias comunistas, que se debatem no país e apelar a todos os evangélicos eleitores, que se abstenham de quaisquer compromissos políticos com tais partidos e ideologias [que] são contrárias aos princípios evangélicos. 
Como orientadora de opiniões, faz suas as palavras que foram adotadas como declaração de princípios pela Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, que sintetiza todos os pontos contrários aos extremismos de direita ou de esquerda, o comunismo, o integralismo, e outros quaisquer. 
Assim, condenamos todo movimento político ou social que: 
“Considerando o momento caótico do mundo e o movimento de idéias perigosas que apelam apara as mentes cristãs e por vezes delas se apoderam, Sínodo da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil declara contrário aos princípios da Reforma – que ele crê decorrentes do Novo Testamento – qualquer movimento político e social que der os seguintes resultados:
Atentando contra a liberdade de consciência livre dentro da lei; 
Atentado contra a liberdade de consciência, de crítica, de culto e de imprensa, quando esteja ela dentro da lei e da moral; 
Atentado contra a formação livre como partido com programas claros dentro da lei; 
Atentado contra a liberdade de propriedade em si, garantida e expressão livre do individuo de da organização normal da família; 
Atentado contra as bases sagradas da família Posse do poder pela força por parte de uma facção, que se arvore em país, transformando a bandeira nacional, mãe bondosa que é para abrigar dentro da lei as divergências naturais de seus filhos, em madrasta odioso que protege uns filhos tiranizando outros; 
Exigência de juramentos incondicionais nas mãos de um homem, o que é, além de gravíssima imprudência, para não dizer imoralidade, um atentado contra o princípio básico de reforma, a saber: o livre exame e a crítica, princípio que é não só um direito, mas um dever da dignidade humana; 
Nacionalismo rubro, que é uma deturpação do verdadeiro patriotismo e que conduz fatalmente a um orgulho nacional insensato, preparando o caminho para o ódio entre as nações, a opressão e a conquista; 
Ódio de raças e orgulha da superioridade racial, que afasta indivíduos e nações, contrariamente do universalismo cristão; 
A militarização da infância escola e a inoculação da alma infantil, de idéias de violência que não somente a deturpam e alienam a cristo, mas prepara o caminho para o imperialismo, o militarismo, os gastos excessivos com preparativos bélicos, em detrimento da escola, do pão sagrado, do operário, dos hospitais; 
Toda expansão de dinheiro que acarreta parasitismo, tirania, compressão a comunidade, exploração criminosa da pessoa e do trabalho humano. 
Com estes alavantados propósitos bem definidos e com esta diretriz de ação política e social, a diretoria conta com o apoio unânime de todos os evangélicos, eleitores ou não e de ambos os sexos, de todo estado de São Paulo, para na primeira oportunidade, dar um forte exemplo de civismo na defesa de nossos ideais. 
São Paulo, julho de 1936. 
N R S Couto Esher (e outras assinaturas)

Via Max Cassin
https://www.facebook.com/max.cassin.1/posts/2223378177714726

Caiam os ídolos

Minha oração hoje
E meu desejo mais profundo,
Esperança que me resta
Nesta vida, neste mundo
É que todos os meus ídolos
Se descubram nus diante de mim.
Que as ilusões que tenho alimentado
E as opiniões que elaboro sobre falsas premissas
Sejam, de uma vez por todas, expostas,
Deflagradas, derrubadas ao chão.
Que em momento algum eu me firme
Sobre meu próprio entendimento das coisas
Que minhas certezas e tudo aquilo que utilizo para manter-me em pé
Mostrem do que são feitos realmente
E que eu possa libertar-me do altar sobre o qual me puseram
E sobre o qual mantive-me boa parte de minha vida.
Tantos olhares de expectativa
Tantas palavras em tom altivo
Tantas promessas quebradas
Por causa de uma palavra não esperada
Uma decepção.
Nessa vida não vale a pena condicionar nossas ações a nada.
Porque as pessoas são vivas e, por causa disso, mudam.
Somos transformados a cada passo dado, a cada experiência vivida.
Por isso desejo, do fundo do meu coração,
Que meus ídolos caiam
Que sejam expostos, revelados, trazidos à luz,
Não posso me permitir acreditar que sou infalível,
Nem me firmar na hipótese de nunca me enganar.
Assim me protejo da estupidez do orgulho
E de achar que em mim mesma há algo de bom.
Porque só Deus é bom, fundamentalmente bom.
Dele procedem as fontes que alimentam meu ser.
Nele me escondo quando em dúvida, não preciso saber.
E descanso, quando tudo cai ao meu redor,
Quando faltam amigos, promessas se quebram,
Quando alguns desistem ou esquecem,
E o que me sobre são contas a pagar,
Um desejo sobre-humano
de ser envolvida num abraço demorado
medo de errar de novo
e cansaço.
Por isso, que os ídolos caiam,
Que minhas certezas não sobrevivam.
Assim poderei caminhar calmamente,
Olhos no chão,
Ao lado dos que sofrem,
Entende-los, amá-los,
Perder tudo,
Por amor,
E desgastar-me em dor.
Perder-me para me encontrar,
Angela Natel

Somos rasos

Somos rasos
Nosso amor é raso
Nosso interesse é raso
Assim como nosso estudo e compreensão o são
Rasos
Insuficientes
Impotentes.

Rasa é nossa dedicação ao outro
Bem como nossa maneira de nos preocupar
Em ajudar, em colaborar.
Rasos somos em nossas relações
Em nosso amor, que é condicional
À resposta alheia, ao que desejamos ganhar com isso.
Somos rasos, rasos demais,
Em nosso julgamento das situações
Em nossas opiniões.
Rasos em nossas conversas
Por medo de intimidade
E vulnerabilidade.
Somos rasos nas respostas, nas perguntas
Nos cumprimentos.
Prá que se aprofundar?
Dá muito trabalho
- ai, que preguiça!
Somos extremamente rasos
Em nossas teologia,
Em nossa imitação de Cristo
Rasos naquilo que nos propomos fazer
- fazemos o mínimo, o mediano, o suficiente.
Nada mais, nada menos.
Não fazemos mais do que nossa obrigação.
Por isso somos tão descartáveis,
Irrelevantes,
Nossa mensagem não vale tanto assim,
Porque a vivemos de forma rasa,
Até o limite de nossa segurança,
De nosso conforto e acomodação.
Somos rasos no perdão
E na entrega.
Sem riscos vivemos na superficialidade das relações,
Dos comentários
Apenas nos defendendo
E defendendo o que moralmente nos acalenta.
Mas no que consideramos provocação
Levamos de forma rasa
Rotulando e determinando limites
Para nosso amor, nossa mão estendida.
Apesar de tudo isso,
Deus nunca foi raso,
Entregou-se por inteiro,
Encarnou, sofreu, sangrou e morreu.
Foi ao fundo do abismo,
E hoje perscruta as profundezas de nosso ser raso.
Não há nada que possamos esconder de Deus
E, por debaixo das máscaras de nossa hipocrisia rasa
Ele vê e revela a podridão que há lá no fundo.
Somos rasos
Porque somos podres por dentro.
É dessa podridão de incertezas, desinteresse pelo outro,
Um desamor fedido que brota de nosso interior,
A raiva contida, o ódio descabido,
Essa revolta e o desejo por estarmos sempre certos
Acima dos outros, acima de suas necessidades,
Agarrados ao osso do poder e do controle
De nossas vidas e organizações
E de todo esse lixo que se esconde em nós
Que precisamos nos desfazer.
Para sairmos, de vez, dessa superficialidade crônica da vida
É preciso morrer, abrir mão de nós mesmos,
renunciar o direito de estarmos sempre certos
nos vulnerabilizar diante do outro
a fim de amá-lo profundamente,
sem condições, sem restrições,
sem exigir reparação,
nem direitos,
sem nos assegurar com testemunhas a nosso favor.
É preciso olhar quem nos provoca tanto ódio
Por sua conduta, palavras, opiniões
E servir, entregando-nos até a morte.
Para sermos libertos de tão maldita superficialidade
É preciso calar em vez de sermos rasos.
É preciso buscar a profundidade da compreensão,
Do amor, nas relações, nas organizações.
É preciso sairmos um pouco dos esquemas,
Das facilidades, dos horários marcados e do mecanicismo.
É preciso sorrir e chorar com o outro
Em nossas debilidades.
Porque ser raso é fácil nesse mundo,
Generalizar, rotular, esquematizar
Faz parte do abismo imundo no qual nos tornamos.
Por isso não busquemos soluções rasas
para problemas de quem não desejamos nos aproximar muito,
nos envolver demais.
Nossas soluções rasas dificilmente são resultado de nosso interesse em ouvir
E compreender a situação calçando os sapatos de quem a está vivendo.
Sejamos profundos,
Amemos profundamente,
Incondicionalmente,
Com dedicação,
Sem medo de exagero,
Nos entreguemos
Como nosso Senhor se entregou.

Angela Natel

Ele pagou

Das palavras que saem de minha boca e ferem outros até os atos de violência, justificados ou não,
todo atentado contra a vida, à criação de Deus,
a ira do Criador que tanto merecia - e ainda mereço - 
a dor que causei, as bolas fora,
tantos erros, tanta má vontade,
e a própria necessidade de me autoafirmar, de provar a mim mesma diante dos outros,
de constantemente me explicar,
e as dúvidas, insegurança, desconfiança, ansiedade, medo.
Por tudo isso Ele pagou, tudo Ele carregou - e por causa disso, nada devo, sou ficha limpa, feita nova todo dia, com uma chance interminável de acertar a cada amanhecer.
Sim, Ele pagou por tudo,, por mim e por você, pelo bandido e pelo mocinho, pelo político e pelo ativista, pagou o preço de cada erro, cada injustiça.
Porque não há um justo sequer... todos pecamos, todos erramos o caminho, o alvo, o plano. Em algum momento, todos nós nos desviamos.
Por causa dEle, há esperança, perdão, misericórdia, graça - para todos disponível.
Um Deus ressurreto todos venerariam, mas um Deus que veste minha carne e paga por meus erros, morrendo cruel morte... quem veneraria?
Um Deus crucificado, ensanguentado, loucura, escândalo - minha justiça colocada em xeque.
Violência respondida com perdão.
"Ele levou sobre si" meu pecado, meu senso de justiça, minha condenação e minha dor...
Carregou tudo com nossas doenças, neuroses e psicopatias, pagou por cada ato raivoso contra a vida alheia.
E está consumado - tudo foi realizado, resolvido naquela cruz.
Angela Natel


(Não) Estou à venda


Por um presente
Posso te ouvir reclamar
E por favores
Ainda te ajudar.
Por uma oferta,
Uma ajuda financeira
Te deixo minha vida controlar
Até dizer que sou arteira.
Se faz algo em meu favor
É claro que tem direito
De dizer qual roupa devo pôr
Até de meu cabelo a cor.
E se considerar muito radical
Qualquer movimento meu
Pode reclamar, é normal
Se pagou, é direito seu.
De uma vez por todas, é preciso
Libertar-se desse mal
De ver favores como avisos
de controle gradual.
Amar é esperar muito menos
Ainda que se ofereça um bocado
Uma vez que relacionamentos
Não significam mercado.
Liberdade tem um preço
E vidas valem muito mais
Se acha que não mereço
Prenda-me se for capaz.
Angela Natel

Rótulos e estigmas


Já lhe aconteceu alguma vez de ouvir o nome de alguém e imediatamente junto a este nome lhe vir à mente toda uma ideologia, ideia, causa ou movimento a que este nome possa estar associado? E já lhe aconteceu de, por causa desta associação de inúmeros conceitos a determinada pessoa você, ao apenas ouvir este nome se posicionou na defensiva (ou ofensiva) contra o que pudesse ser mencionado a seguir?
É o típico caso de preconceito. Sim, preconceito pois, independentemente da postura que uma pessoa assuma a respeito de determinado assunto, somos seres dinâmicos e passíveis de mudanças, a qualquer momento. Qualquer rótulo ou estigma que se lance sobre alguém acaba por cimenta-la debaixo de ideias que, na verdade, sofrem variações constantemente.
Uma postura como essa só nos impede de aprender com o outro e nos coloca numa posição de tirania em relação ao próximo, já que nos damos o direito de determinar os traços principais através dos quais as pessoas são identificadas.
É por isso que por vezes me encontro a ignorar certos comentários, a fim de não me machucar tanto com esses juízos de valor que fazem a meu respeito. Não importa o quanto alguém me conheça, nenhuma pessoa tem o direito de me sintetizar em uma palavra, um rótulo, um estigma. Tenho tentado, por isso, me policiar nesse sentido e, quando ouço o nome de alguém, tentar não concentrar meu pensamento somente naquilo que sei a respeito dessa pessoa, mas me abrir para as novas possibilidades que ela tem a me oferecer. Sente-se desafiado nisso, também? 
Angela Natel

Falsos pastores, profetas e mestres



De falsos pastores e falsos profetas que, por anos, não fazem absolutamente nada para salvar mulheres que estão sendo espancadas sistematicamente por seus próprios maridos, sob seu conhecimento e cumplicidade, toda palavra de falso moralismo e pregação como sendo "absoluta" ou da parte de Deus (do deus deles) é vazia e não merece crédito.
Falsos profetas, falsos pastores e falsos mestres devem ser denunciados - tanto pela lei civil quanto pela Bíblia.
Líderes, pastores, autodenominados profetas e mestres que se colocam como infalíveis em sua interpretação das Escrituras, donos da verdade e defensores da literalidade absoluta de suas traduções nada mais são do que manipuladores e pastores de seu próprio umbigo, deuses de si mesmos. Fujam deles!
A incoerência de alguns intérpretes da fé cristã desponta já em seu conveniente silêncio a respeito da literalidade dos inúmeros textos bíblicos que revelam um Deus defensor dos marginalizados, escravizados e oprimidos, que resiste aos soberbos e até mesmo aos mais abastados.
Para falsos pastores, profetas e mestres, a salvação não é somente através da fé em Jesus Cristo, é preciso crer e pensar como eles, ter seu mesmo posicionamento político e econômico. 
Para estes, não basta somente crer e confessar que Jesus é Senhor, é preciso também confessar que César é Senhor.
Eu até entendo aqueles falsos pastores, profetas e mestres que citam, fora de contexto, o versículo "a letra mata" para falar contra o estudo teológico, porque eles nada mais fazem do que se defender contra a morte de seus dogmas, de sua fé podre e manipuladora, de suas escamas religiosas que só servem para enganar e controlar a vida das pessoas de acordo com sua conveniência e prazer 
Assim, eles mantém um grande número de pessoas em seus currais religiosos, dependentes de suas profetadas e direcionamento, de seus ritos e talismãs, fontes de suposto poder a fim de manter o que a obra de Cristo na cruz não é capaz de, por si mesma, fazer de uma vez por todas.
Angela Natel

No Reino dos deuses

Triste é o Reino dos deuses, onde aquele que perdeu sua utilidade é descartado publicamente.
O Reino dos deuses: um lugar onde quem tem mais (poder, dinheiro, título) dita as regras, muda o sistema, faz o ambiente adaptar-se.
Nesse Reino vejo gente agindo como animais, vejo ainda gente tentando ser Deus, determinando o pecado maior e mais perverso, fechando os olhos prá aquilo que não lhe convém.
No Reino dos deuses os fins justificam os meios, tenho professores descartáveis, censuro o que discordo, só defendo o direito que me afeta. Aqui é o outro que precisa mudar, melhorar, até que eu consiga atingir meus objetivos.
E se você tentar me censurar, quem você pensa que é?
No final das contas, um Reino de deuses, não de servos, que gritam para serem ouvidos e acabam por ensurdecer a multidão.
Deuses cegos invocados por egos enaltecidos que vão deixando para trás rastros de corações partidos.
Triste é o Reino dos deuses...
Angela Natel

Descredo


Não creio no deus que criou apenas aquilo que considero santo e bom, deus limitado e explicável por sua criação.
Não creio no deus que precisa ser apaziguado para comigo se relacionar, limitado em seu poder de acordo com a vontade e ação humana, que depende da oração para intervir, que não pode fazer algo se um crente não der o primeiro passo.
Não creio no deus que só está onde é louvado, cuja presença depende do ambiente, do preparo, da ação e reação humana, deus que depende de mim, de minha semeadura, daquilo que faço ou deixo de fazer para que possa agir.
Não creio no deus cujo conhecimento é limitado àquilo que lhe confesso.
Não creio no cristo que não se identifica com o ser humano, que faz questão de estar sempre por cima.
Nem no cristo que me serve, que está 24h/dia disposto a realizar meus sonhos e desejos, a conceder todos os desígnios do meu coração.
Não creio no cristo que não incomoda o sistema político por dizer que seu Reino não é deste mundo, que defende e exalta patriotismo e nacionalidade, um cristo cuja pátria está aqui na terra, que serve à minha ideologia política, que é slogan de candidato, nem no cristo que toma partido a fim de respaldar poder de uns sobre os outros, que compactua com violência e exploração.
Não creio no cristo que prefere matar a morrer, que não dá a outra face, que se cansa de perdoar, no cristo que julga pela aparência, que é rápido em denunciar, que não ouve antes de falar, o cristo sem cruz, que foge do sofrimento, que defende seus direitos e vive de triunfalismo.
Não creio no cristo que não contraria as picuinhas religiosas e moralistas dos crentes, que se preocupa com a moral e os bons costumes, nem naquele que atenta em provar a si mesmo diante das pessoas. Nem no cristo que não vê humanidade em toda e qualquer pessoa, que demoniza gente, que quer saber cada detalhe da biografia do caído no caminho para saber se vale a pena socorrê-lo, que dá voz e microfone a demônio, que exclui pessoas e vem para condenar.
Não creio no cristo que privilegia denominações e detentores da Ortodoxia para conceder seu favor, que só trabalha com quem segue uma cartilha, uma caixinha denominacional, nem no cristo que permanece morto, deixando nas mãos daqueles que dizem levar seu nome toda a responsabilidade de sua vontade na terra, o cristo ausente e inerte na missão, ou preso às nossas estratégias e programações.
Não creio no cristo da desesperança, da condenação, do medo, da chantagem, que barganha salvação, que vende benção e prosperidade, que troca favores por uma hora, um evento, uma noite de oração.
Não creio no cristo que tem medo das pessoas em vez de amá-las, que nos deixou ao “deus dará”, que nos dá carta branca para dizer qualquer asneira em seu nome, nem no que justifica clubes com nomes de igrejas e organizações cristãs, no cristo que é demonstrado por elas.
Não creio no cristo cuja história ignoro, cujos fatos faço questão de não conhecer, no cristo a respeito de quem só ouço falar.
Não creio no cristo que convive pacificamente com Mamom, que precisa de dinheiro, que põe preço em sua criação, que dá e recebe dinheiro num sistema de perdas e lucro, que forma juízes e não discípulos, que envergonha os pobres e privilegia os ricos.
Não creio que ficaremos impunes por seguir e adorar estes falsos cristos.
Não creio no espírito que muitos chamam “santo”, que mais parece uma energia impessoal, cujo objetivo é atrair a atenção para espetáculos pirotécnicos de poder e ilusão.
Não creio na santidade da igreja instituição, nem na falsa unidade por ela apregoada a fim de manter aparências. Não creio que alguma linha teológica específica, doutrina ou denominação seja dona da patente da graça de Deus.
Não creio que nenhum sistema econômico ou linha política sejam exclusivos como marca registrada de quem é seguidor de Jesus Cristo.
Não creio que haja perdão quando o Espírito de Deus é blasfemado entre aqueles que se dizem seus.
Por isso, não creio que sairemos ilesos do julgamento que nos espera.
Porque nenhuma vida além da vida de Deus é eterna.
Não creio que, para nossa salvação e santificação, devemos crer em nada além do que está exposto no verdadeiro Credo Apostólico.
Angela Natel e Dalva Del Vigna
22 e 24/11/2018

Feliz dia do leitor!

Fazia muito tempo que não seguia um livro devocional junto com a Bíblia. Porém encontrei um irresistível, a ponto de quebrar a tradição. Nesse dia do leitor, apresento meu guia devocional de 2019: "Resist the Powers with Jacques Ellul", de Charles Ringma, aliando fé a serviço do Reino de Deus, resistência aos poderes de nossa era e uma caminhada coerente entre mente, coração e mãos.


É impressão minha?

É impressão minha ou é normal esperarem que vc faça o melhor, dê tudo de si mas trabalhe de graça e ainda agradeça caso receba por isso?
É impressão minha ou passei dos limites quando apenas pensei que poderia dizer não ao constatar que teria de dar além do que tenho?
É impressão minha ou sou descartável, e os elogios que recebo na prática não querem dizer nada, apenas aliviam quando fico de mãos vazias, sem direitos, sem chão?
É impressão minha ou me tornei uma obra de consulta para quem precisa de ajuda, mas perfeitamente encaixável numa prateleira quando não solicitada, e ali devo permanecer, calada, para não ocupar espaço indevido?
É impressão minha ou sou ótima amiga quando atendo às solicitações, mas quando dou a entender que preciso de ajuda, que meus serviços custam alguma coisa, sou indelicada, não levada a sério e constrangida por isso?
É impressão minha ou mesmo quando aviso que algo me incomoda sou ignorada, forçada a me ajustar, mas raramente levada em consideração ao solicitar ajuste alheio?
É impressão minha? Trata-se de um mal que alimentei minha vida toda, trabalhando incessantemente, me gastando pelos outros, vivendo para ajudar, complementar, tapar buracos alheios, sem poder esperar nada, tendo ainda que agradecer quando recebo algo por isso ou, recebendo inúmeros elogios e até expressões de culpa quando não recebo, mas essa culpa alheia fica sem produzir mudança alguma na situação?
Fui eu mesma que alimentei tudo isso? Fui eu mesma que criei este monstro que constantemente me consome o fígado, tal qual Prometeu, sem nunca alcançar o descanso da alma?
Trata-se de ingratidão de minha parte ou de alguma espécie de mesquinhez de meu ser ao tentar viver do suor de meu trabalho e esperar realmente que o mínimo de condições de trabalho me sejam garantidos, como a qualquer trabalhador comum?
Será exigir demais de quem se diz meu amigo não querer que eu forneça gratuitamente meus serviços somente pelo fato de que é através deles que estou tentando reconstruir uma vida normal, cuja caracterização ainda me é desconhecida?
Será normal ser constrangida ao esperar pagamento por serviços prestados?
Será normal me sentir usada, abusada e até escravizada, ao ponto de chegar a estar exausta de mês após mês temer não receber pelos serviços prestados e ainda dar inúmeras justificativas por cada frase dita e mal interpretada, por cada olhar tido como estranho ou ameaçador, por cada sorriso torto que dei, por cada preposição mal colocada numa frase ou gesto mal medido numa conversa?
Será normal tudo isso?
Não sei mais o que é normal. Não consigo compreender a situação. Estou esgotada e realmente me sentindo escravizada, sem chão, sem direitos trabalhistas, sem perspectiva e ainda com a impressão que confiei nas pessoas erradas.
Sei até mesmo que colocar essas palavras por escrito pode me custar muito mais caro, mas nem isso me assusta mais. Já espero o pior.
Já tive de fazer empréstimos para cobrir o buraco de erros alheios que voltaram contra mim, justificando-se como se o erro fosse só meu.
Já estou no limite de minhas emoções, à mercê de quem já me deixou na mão mais de uma vez.
Elogios e palavras de sentimento de culpa e amizade são usados e abusados na tentativa de encobrir erros que nunca mudam, situações que permanecem esmagando e escravizando.
Escrevo agora, porque não sei o resultado ainda. Mas como já citado, espero o pior. Já perdi tudo mais de uma vez.
Angela Natel – 29/08/2014

Quanto vale uma mulher?

Quanto vale uma mulher? Com que moeda você iria comprá-la?
Se tomar minha história como exemplo, valho menos que um objeto, sou coadjuvante nessa narrativa.
Fui usada, abusada, descartada e injustiçada numa família chauvinista sem exceção.
Aquele que levou a herança de filho mais velho, mesmo sendo o 4º filho não soube ser misericordioso para comigo, Tamar, sua nora.
Sim, estou falando da família de Judá, o patriarca, 4º filho de Jacó, que veio a ser o primeiro em excelência, influência e riqueza.
Casei-me com seu filho mais velho, Er, mas fui uma esposa infeliz. Aturar perversidades do marido machuca qualquer coração. Quem nunca foi machucada por causa da maldade dos outros? Mas o pior de tudo foi ter de suportar o luto sem nem ao menos ter tido um filho.
Viúva, sem filhos, dupla vergonha e marginalização. O que foi que eu fiz para merecer tal destruição?
Porém um costume da época e de nossa sociedade ditava que, se um homem morria sem filhos, o irmão a viúva tomava para manter a genealogia.
Então, após sofrer tantos desatinos, fui entregue como objeto de procriação a outro, irmão do falecido, e Onã se tornou meu segundo marido.
Por saber que o fruto gerado de nossa relação não seria seu filho considerado, Onã derramava sua semente no chão, deixando Deus muito decepcionado.
Imaginem só minha angústia e tristeza, ser usada por prazer, mas sem filhos poder ter, por mero capricho e malvadeza.
E, como se não bastasse tanta desgraça, veio Onã também a falecer e, viúva pela segunda vez, fui devolvida para casa, a fim de esperar o terceiro irmão crescer.
Promessas, promessas, promessas que nunca chegaram a vingar. Uma vida rasgada, machucada por um pai e seus três filhos. Dor na alma que não quer calar.
O terceiro filho cresceu, o pai enviuvou, mas a promessa não cumpriu, e sozinha me deixou.
Até que Judá apareceu trabalhando perto daqui. Encontrei-o, mas não me reconheceu. De prostituta me vesti.
Foi a chance da minha vida, nenhum homem a me controlar. Prazer sentido, vingança cumprida. Penhorou suas coisas prá me pagar.
Então senti crescendo em mim vida que Deus gerou. Alegria renascida, esperança que transbordou.
Ao saber da gravidez, Judá mandou-me para a morte, mas o mesmo penhor que em minhas mãos o condenava livrou minha sorte.
E após toda essa triste história de dor, sofrimento, viuvez, privação de filhos, abandono, abuso, esquecimento e injustiça, mesmo não sendo mais tocada por homem nenhum, fui abençoada com gêmeos: Perez e Zerá.
Que sofrimento é tão grande que não deixe passar uma réstia de luz? Que maldade tão esmagadora exista que não permita uma escolha diferente para si?
Não foi ideal meu caminho, nem florida minha jornada. Muitos me tiveram por pecadora, amaldiçoada. Poesia não se mostra em tudo pela vida e a injustiça grita em nossos ouvidos.
Mesmo assim sou voz ativa, não passiva, nessa história de homens que pensavam estar escrevendo no livro da redenção.
E o mais importante de tudo é que meu nome aparece na lista de quem verdadeiramente fez História para a nossa salvação.
Referências Bíblicas: Gênesis 38; Mateus1:1-3
Adaptação de Angela Natel – 01/06/2011.

Traidora!


Você não esteve em meu lugar, mas já teve que fazer uma escolha em que sabia que iria se arrepender pelo resto de sua vida?
Minha fama é de traidora. Alguém que entregou a pessoa amada nas mãos de seus piores inimigos: o meu próprio povo! Má fama é algo que se apega a você como uma tatuagem cobrindo toda a sua alma. Não há mais como se livrar dela.
Traí o homem a quem mais amei em toda a minha vida, acredite se quiser. Como você agiria em meu lugar? Tendo que escolher entre dinheiro e a vida da pessoa amada. Ele era um estrangeiro vivendo em nosso meio, então recebi a proposta. O que você escolheria?
Sim, eu sou Dalila. Ainda me acha uma traidora? Eu receberia 13 quilos de prata de cada líder filisteu caso descobrisse o segredo de sua força.
Então passei noite após noite, em terríveis tentativas, Sansão só me inventava mentiras, e caí em todas elas, delatando minhas intenções. Até que, vencido pelo cansaço e chantageado pelo nosso amor, contou-me seu precioso segredo.
Se tão somente ele tivesse me dirigido o olhar, logo após eu ter mandado arrancarem aquelas suas tranças, tenho certeza que seu olhar me seria de amor. Um olhar de amor após uma traição. Sim, ele amou uma traidora.
Penso que assim deve ser a figura de um herói, um grande guerreiro, um Rei!
Mas a culpa que carrego por ter sido responsável pelos seus olhos furados e, mais tarde, por sua morte, é assustadoramente um alívio.
Sim, porque amando-o e conhecendo-o como amei e conheci, sei de seu prazer em destruir seus inimigos, ainda que fossem meu povo, e do chamado de seu Deus, que cumpriu ao morrer.
Minha família, meu povo, quem sou, o que tenho, nada disse teve sentido sem o toque desse homem apaixonado, forte e destemido e completamente determinado a cumprir sua missão.
Nenhuma outra marca ficou mais fundo gravada em meu coração do que a marca dessa traição.
No fim das contas, não foi Sansão a quem traí, foi a mim mesma e ao fogo que ardia dentro de mim todas as vezes que ele me contava as histórias do seu povo e do seu Deus. Percebi, então, que ao tentar salvar minha família, foi que a perdi, e ao tentar defender meu povo e cultura desperdicei a chance de receber nova vida ao lado do único que verdadeiramente me amou.
Referências Bíblicas: Juízes 16
Adaptação de Angela Natel

Enganada


Você já foi enganado por alguém? Já experimentou essa sensação?
É um sentimento amargo que se forma na alma, gosto de mentira, gosto de traição.
No meu caso, acho que foi pior. Eu fui feita pelas mãos de Deus, de uma parte de um homem. Eu sou a primeira mulher, uma novidade, criada para completar, ajudar e caminhar lado a lado com Adão, para juntos cuidarmos da criação de Deus, termos filhos e dominarmos os animais.
Era realmente o paraíso, no pleno sentido da palavra. Mas foi bem no meio desse cenário que aconteceu... fui enganada!
É triste só de lembrar, me causa indignação.
Depois de ser criada, fui recebida com romantismo e paixão. Logo depois, Adão me repassou as ordens que tinha recebido de Deus sobre não comer do fruto de certa árvore. Prá mim, parecia simples, até o dia em que uma serpente apareceu com uma conversa estranha que me confundiu. Ela estava contradizendo o que Adão tinha falado que era a ordem de Deus mas, como ele estava comigo e não a desmentiu, julguei ter ouvido mal, e assim fui entrando no papo, ora respondendo, ora me contradizendo e... já que Adão, que estava ao meu lado, não se manifestou, aceitei comer daquele fruto, o da árvore proibida, e também entreguei a Adão, que comeu sem problemas.
Deus, mais tarde, veio e nos corrigiu, mostrando as conseqüências de nossa desobediência, do nosso erro.
Fui enganada... seja pela omissão de meu marido, seja pelas palavras distorcidas da serpente, seja pela falta de contato direto com Deus.
Sim, porque desde então vivemos tão distantes de Deus e um do outro... sofrendo, esperando ver nossos filhos crescerem e, quem sabe um dia, vencer a serpente.
Adaptação de Angela Natel.
Baseada nos textos bíblicos de Gênesis capítulos 2 e 3 e 1ª Timóteo 2:14 e no livro “O silêncio de Adão”, de Larry Crabb.