sábado, 24 de dezembro de 2022

O deus que acreditamos orienta o modo como vivemos e nos relacionamos

 


Toda espiritualidade é uma narrativa de mundo, cabe a nós avaliar quais promovem a vida e quais são centradas na culpa e no medo.
O criacionismo cristão é uma estratégia que busca dar sentido à dívida original.
Deus, criador de tudo, seria superior às suas criaturas. Uma hierarquia transposta na família cristã, em que os filhos devem obedecer aos pais, que assim como Deus, teriam o direito inclusive de agredi-los, desde que "para o seu bem".
Se Deus é eternamente bom e poderoso, por que haveria no mundo a violência? Para manter intacta essa imagem é que se inventa a noção de livre-arbítrio, que desloca para o humano toda a culpa. "Não teve fé, escolheu mal" ou então, novamente, aquela violência aconteceu "para o seu bem".
Ficaria estranho castigar inocentes, por isso a ideia de consciência é fundamental para qualificar alguém como culpa(do). A obsessão em "levar a palavra" é parte disso: não dá pra condenar ao inferno quem não sabe que está pecando. Na Bíblia, Jesus diz: pai, perdoe-os, pois não sabem o que fazem. Ele não diz: perdoe os que sabem (têm consciência) do que fazem.
Todos já chegariam no mundo como pecadores que pagam eternamente a dívida de Eva. Sem essa dívida, o pagamento de Jesus dessa culpa seria obsoleto, desnecessário. Se ninguém ao nascer fosse visto como pecador, não teria motivo algum para sacrifício.
O prêmio aos "poucos escolhidos" dessa corrida contra a carne, desejos, contra si é fundamental para que os fiéis vejam sentido nas renúncias que fazem. Esse seria seu pagamento à prestação pela entrada no céu.
Todo esse amor é absolutamente coercitivo e chantagista, pautado no temor e no rebaixamento de si.
Os rios, as matas, os ventos, tudo isso existe, mas seriam mesmo criação de um único ser? Isso lembra os colonizadores que dizem ter "descoberto" o que já existia. Esse deus é monogâmico, não admite concomitâncias.
E se quem "originou" todas as coisas forem bilhões de seres?
Se a autoria da vida for coletiva?
E se nenhuma vida iniciar em pecado?
A água me escuta quando tenho sede
A terra me alimenta quando tenho fome
Sem sobrenatural, nem sobrenatureza, não há nada acima dela, é tudo!
Não lhe devemos nada, somos a terra.

Geni Nuñez - @genipapos no Instagram
Assista a live "Descatequizar para Descolonizar", com Geni Nuñez em meu canal do Youtube (Angela Natel), na playlist "Só lives" - acesse o canal pelo link - https://www.youtube.com/watch?v=mhtXVH-kO3I&t=2115s


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O deus que acreditamos orienta o modo como vivemos e nos relacionamos

 


Toda espiritualidade é uma narrativa de mundo, cabe a nós avaliar quais promovem a vida e quais são centradas na culpa e no medo.
O criacionismo cristão é uma estratégia que busca dar sentido à dívida original.
Deus, criador de tudo, seria superior às suas criaturas. Uma hierarquia transposta na família cristã, em que os filhos devem obedecer aos pais, que assim como Deus, teriam o direito inclusive de agredi-los, desde que "para o seu bem".
Se Deus é eternamente bom e poderoso, por que haveria no mundo a violência? Para manter intacta essa imagem é que se inventa a noção de livre-arbítrio, que desloca para o humano toda a culpa. "Não teve fé, escolheu mal" ou então, novamente, aquela violência aconteceu "para o seu bem".
Ficaria estranho castigar inocentes, por isso a ideia de consciência é fundamental para qualificar alguém como culpa(do). A obsessão em "levar a palavra" é parte disso: não dá pra condenar ao inferno quem não sabe que está pecando. Na Bíblia, Jesus diz: pai, perdoe-os, pois não sabem o que fazem. Ele não diz: perdoe os que sabem (têm consciência) do que fazem.
Todos já chegariam no mundo como pecadores que pagam eternamente a dívida de Eva. Sem essa dívida, o pagamento de Jesus dessa culpa seria obsoleto, desnecessário. Se ninguém ao nascer fosse visto como pecador, não teria motivo algum para sacrifício.
O prêmio aos "poucos escolhidos" dessa corrida contra a carne, desejos, contra si é fundamental para que os fiéis vejam sentido nas renúncias que fazem. Esse seria seu pagamento à prestação pela entrada no céu.
Todo esse amor é absolutamente coercitivo e chantagista, pautado no temor e no rebaixamento de si.
Os rios, as matas, os ventos, tudo isso existe, mas seriam mesmo criação de um único ser? Isso lembra os colonizadores que dizem ter "descoberto" o que já existia. Esse deus é monogâmico, não admite concomitâncias.
E se quem "originou" todas as coisas forem bilhões de seres?
Se a autoria da vida for coletiva?
E se nenhuma vida iniciar em pecado?
A água me escuta quando tenho sede
A terra me alimenta quando tenho fome
Sem sobrenatural, nem sobrenatureza, não há nada acima dela, é tudo!
Não lhe devemos nada, somos a terra.

Geni Nuñez - @genipapos no Instagram
Assista a live "Descatequizar para Descolonizar", com Geni Nuñez em meu canal do Youtube (Angela Natel), na playlist "Só lives" - acesse o canal pelo link - https://www.youtube.com/watch?v=mhtXVH-kO3I&t=2115s