sábado, 29 de dezembro de 2018

Tudo tem limite


Sim, meus amigos, tudo na vida tem limite: o saldo na sua conta bancária, a sua paciência, os livros em sua estante, o cartão de crédito (‘Malditos Ewoks’), a sua estabilidade emocional, a disposição em ouvir e sorrir educadamente para seu interlocutor, o número de vezes que se vê na mesma situação tendo que oferecer as mesmas explicações somente para manter a paz e a harmonia neste planeta...
Pena que quando o limite está fora de nós, temos de nos virar nos trinta e seja o que Deus quiser, já que a situação foge ao nosso controle, ainda que possivelmente faça parte de consequências diretas ou indiretas de decisões, palavras e/ou ações nossas, i.e., de nossa responsabilidade.
Mas, quando o limite expirado está em nós, e nos vemos engalfinhados numa luta previamente perdida, ridicularizados por nossa própria falta de controle, expostos, trazidos à realidade por choques letais de adrenalina que a pressão geralmente tende a nos aplicar de vez em quando, por vezes nos encontramos num ponto em que desejamos correr, gritar ou somente tatuar bem no meio da testa alheia a frase: ‘tudo tem limite’.
Este mês o dinheiro apertou, o jogo de cintura foi grande, mas as coisas foram sendo levadas. Aparentemente tudo bem, até um momento (nem sei determinar bem quando, nem sei bem onde), quando o limite acabou. Trabalhar de graça foi um fenômeno muito comum durante um período que durou em torno de vinte anos de minha vida. E muitas pessoas ainda me diziam: ‘mas a Igreja te pagava’, ‘a Missão tal te sustentava’, ‘as pessoas te davam oferta’, e tantas outras coisas eu ouvi como se nunca tivesse movido uma palha, como se não tivesse estudado, trabalhado e nem me esforçado, e ainda assim vivia como que constantemente pedindo ‘esmola’ para viver, ouvindo reclamações de um lado, que não tinham obrigações a meu respeito, pedindo, insinuando, dependendo, controlando para ‘não esbanjar dinheiro alheio’, como que constantemente prestando contas e relatórios, ao ponto de chegar a colecionar envelopes e mais envelopes de recibos de tudo o que eu comprava, de tudo o que eu comia. As neuroses começaram a se multiplicar e as recriminações também. É claro que os inúmeros cursos de administração financeira surgiram (a um preço, obviamente), e me vi num ciclo vicioso de pedir, anotar procedência, somar, utilizar, anotar gastos e comprovantes, prestar contas, fotografar para comprovar, e assim sucessivamente, para evitar desconfianças.
E foi assim que iniciei minhas barganhas, trocando valores calóricos de minha alimentação por material escolar aos alunos, invertendo papéis, sustentando o insustentável, adoecendo e finalmente descobrindo que minha saúde também tem limite. E como tem. Limites e mais limites que me desafiam diariamente na postura da vítima/não vítima das circunstâncias. Ora tenho que me posicionar e não me dar por vencida, me fazer de forte, fazer meu trabalho a despeito da dor física ou na alma, ora tentando impor os limites ao redor para me dar o direito de me prostrar, pedir ajuda, pedir um tempo, pedir socorro, apenas pedir, sem ter que me explicar.
E nesse redemoinho de limitações físicas e emocionais ainda ter de ouvir certas coisas, ter de manter o sorriso amigável, os compromissos assumidos, vestir o papel de ignorante e seguir em frente como se nada estivesse acontecendo, como se andar mais uma milha fosse coisa passageira, quando o que, na verdade se percebe, é que a luz no fim do túnel não existe, bem como a previsão de chegada, mesmo que tudo tenha limite nesta vida.
Pensei ter vencido a etapa dos limites financeiros quando ganhei a bolsa do Mestrado, mas o que encontrei foram novos limites aos quais preciso me adaptar para viver, novas disciplinas, novos horizontes e novos planos. São desafios constantes para que eu não caia nos mesmos erros do passado, com o diferencial de que não preciso ‘mendigar’ valores que me são prometidos em contrato, ainda que de vez em quando tenha de lembrar das datas de vencimento. Pensei estar alargando limites ao, esporadicamente, ofertar aulas particulares de língua estrangeira, cursos livres, prestar serviços aqui e ali sem vínculo empregatício, mas os limites são tantos que já me vejo num deja vu dos tempos em que me prometeram uma coisa e fizeram outra, como se essa lição eu não tivesse aprendido e estivesse em plena prova de recuperação.
São horas de trabalho que ainda não me trazem retorno financeiro, são compromissos assumidos, planos de aula jogados no lixo porque cancelaram em cima da hora, não dava para marcar outra coisa, tempo e dinheiro desperdiçados, saúde que escorre pelo ralo, e não há como me fazer entender quando os limites são meus, inteiramente meus.
E quando se projetam os valores para o macro, é um casamento que não consegui manter, um filho que ainda não consegui ter, uma casa que não consigo comprar, uma conta que não deu prá pagar, uma noite atrás da outra que não consigo dormir, e a voz vai me sumindo porque um segundo siso na boca vai surgindo e, sabe lá Deus o porquê de tudo isso, como um elástico me vejo esticada, com medo de ser solta e levar comigo muita gente machucada. Meu Deus, tudo tem limite.
Eu sei que tudo o que existe neste mundo tem limite. E posso atentar filosoficamente para o fato de que Deus simplesmente não existe, Ele é, acima de tudo e de todos, e que por esse motivo é ilimitado em si mesmo. Sei que tudo o que tenho e ainda sou não é fruto de minhas limitações, é graça ilimitada desse mesmo Deus.
Por isso, apesar de desejar ardentemente escrever uma crônica mais alegre, ainda me encontro cercada numa visão um tanto quanto limitada da vida, esperançosa de um dia expandir os horizontes e ser bem mais otimista ao escrever. Por hora, faço-me de desentendida de mim mesma, limitada em minha paciência e condição física. A asma que limita até o ar que eu respiro me lembra do quão valiosos são os momentos que passo chorando de tanto rir em família, ou de quão maravilhoso é o semblante do aluno que acabou de ter uma descoberta pessoal em meio à enchente de palavras que acabei de derramar em sua cabeça – essa é a prova de que não há limites para as misericórdias de Deus, que insiste em agir em ambientes tão limitados como a vida de um ser humano tão miserável como o que sou.
Angela Natel
Crônicas de uma Divorciada - Abril de 2014

sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

Você se acostuma


Hoje acordei com o corpo pesado, talvez porque finalmente consegui relaxar, após uma semana de substituição de aulas na Faculdade, meu siso nascendo, dor de garganta, febre e, para fechar a semana com chave de ouro: Show do Guns N’ Roses em Curitiba (debaixo de chuva).
Ainda cambaleando, me arrastei para fora da cama, obrigando-me a acordar. Dor pelo corpo, peso na cabeça, sono sem fim. Tem coisas que a gente passa e nem sabe bem o porquê, então ouve alguém dizer: ‘Você se acostuma’. Essa frase se encaixa em qualquer situação, talvez como um tipo de prêmio de consolação, talvez não. Só sei que já ouvi isso muitas vezes, de pessoas e em lugares bem diferentes.
Hoje é primeiro de Abril, o famoso ‘dia da mentira’, em que as pessoas se dividem nas opiniões e manifestações pelas redes sociais. Há os que aproveitam e brincam à bessa. É divertido. Você se acostuma rápido. A mentira é tida como um ato de liberdade humana, parte da natureza. Há os que levantam a bandeira contra o ‘pai da mentira’, num discurso farisaico de que esse dia não será entregue em suas mãos. Você se acostuma com os versículos bíblicos que exaltam a verdade e condenam a mentira, citados aos montes em sua timeline.
Há a ação dos ‘justiceiros’, que ainda mostra resquícios nas menções de falta de postes diante das injustiças. Você se acostuma a ver as imagens de pessoas amarradas como animais nesses postes, de sangue no asfalto, imagens de violência para pagar pela violência. Você se acostuma.
E agora a febre do momento é a indignação contra ideia que por muito tempo se manteve velada a respeito da culpabilidade das vítimas de estupro. Você se acostuma a pensar e a repetir o discurso, sem pensar em suas implicações, sem levar em conta o ser humano dentro de cada casca, você simplesmente se acostuma.
E o princípio atinge as camadas mais pessoais da minha vida, quando as pessoas fazem seus comentários preconceituosos do tipo ‘ela só quer aparecer’, ou ‘é bipolar’ após um comentário ou exposição de minha parte. Você se acostuma.
Você se acostuma a ser cobrado por coisas que não são fundamentais na vida, se acostuma a viver tentando suprir as expectativas da maioria, a trabalhar para preencher vazios cuja procedência nada nem ninguém consegue explicar.
Você se acostuma com a injustiça, com a falta de misericórdia, com dois pesos, duas medidas, se acostuma a procurar sempre uma explicação plausível prá tudo, sem levar em conta a singularidade do momento, das pessoas, das circunstâncias. É fácil se acostumar com bordões numa época como a nossa: “Deus me falou”, “eu profetizo na tua vida”, “tudo vai acabar bem”, “tudo coopera para o seu bem”, justificando nossos desejos, anseios, esperanças e o peso de nossa alma em palavras vazias de sentido, pois não expressam mais o mesmo de suas fontes.
E você se acostuma a receber tudo pronto, seja da TV, aula ou microondas, sem questionar o que se ouve nos púlpitos e palanques da vida. Você se acostuma a não ser compreendido e se cala, num mar de desilusão.
Hoje li que “Pior do que contar uma mentira é viver uma mentira” (Hermes Carvalho Fernandes), e fui repentinamente chacoalhada por dentro desse marasmo interior. Não quero e não vou me acostumar.
Não vou me acostumar a ser pau mandado, nem papagaio num mar de discursos desconexos. Não vou me acostumar a ser parasita religioso, sugando ideias, doutrinas, vida dos que bebem diretamente das fontes da salvação.
Não quero e não vou me acostumar com a injustiça, com os rótulos, com o descaso diante da desumanidade de quem pode e deve se posicionar. Não vou me acostumar a ser silenciada só porque acham que quero aparecer quando manifesto opinião, quando coloco minha posição ou decido me expor. Não sou vítima das situações, quero ser agente coerente e responsável, que olha o nu e decide agir em favor, não contra, que entende que a “ira do homem não opera a justiça de Deus” (Tiago 1:20).
Não vou me acostumar com cobranças inúteis que não me ajudam a melhorar, só acrescentam mais peso sobre meus ombros, um peso morto que não estou disposta a carregar.
Como se vê, nem sempre acordo com o melhor dos humores, e num dia pesado como este, em que meu corpo não responde tão rápido como eu desejaria, quando o cansaço decide mostrar sua verdadeira face, quando me sinto exausta de tentar dar tanta explicação, decido não me acostumar com nada disso, e melhor do que falar a verdade quero vivê-la, nem que prá isso eu tenha por companheiro um eterno desconforto.
Angela Natel
Crônicas de uma Divorciada - Abril de 2014

quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Sou ninguém

Sou ninguém
Em busca de sentido
De vida, de sangue vertido.
Sou ninguém.
A quem muitos buscam
Atrás de conselho, verdade,
Mas apenas encontram
Humanidade.
Olhos que veem o injusto
com capa de humildade
Fazendo-se deus
em nome de Deus.
Pés machucados das pedras que se lhe impuseram no caminho.
Pássaro fora do ninho.
Leão que ruge em derredor
Lobo voraz, Veado veloz.
Abraço de urso a me esmagar
Serpente atroz.
Mãos estendidas tentando ajudar
Não sou ninguém
Prá que se importar?
Dor que cala a voz da razão
Me ponho em chamas
Tal qual um dragão.
Uma guerra travada em meu coração
Ou ganho ou morro
Não há exceção.
Angela Natel

quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Para minha irmã Angelita, em seu aniversário:



Sua letra cravada 
em minha pele,
Memória de sangue
Levo onde vou.

Mãos dadas
Sempre segura
Cuidado bendito
Que me marcou.

Seus passos 
sempre tão firmes
Na mente eu vejo
A quem imitar.

Palavras ditas 
num tempo
Em que eu te olhava
a me ensinar.

Saudades sentimos
Dores trocadas
Ausência e falta
Outra vida viver.

Sempre, porém,
Quando tudo é escuro,
Posso, 
A você recorrer.

Irmã, amiga, 
Parte de mim
Que me chora 
Estando a sorrir.

Lado a lado vivemos
Onde estivermos
Ainda que doa
Ver-me partir.

Angela Natel - 26/12/2018

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Quando o Natal é todo dia


Realmente temos alguma razão para tratar o Natal com tanta diferença de outras datas como estamos acostumados a fazer?
Será que temos bases suficientes para combater o consumismo nessa época e rebatermos qualquer mensagem ou personagem que tome o lugar da pessoa de Cristo no centro das celebrações natalinas?
Perguntas que me chegam à mente nestes dias que antecedem as comemorações de fim de ano, em meio ao trabalho, ao cansaço de um ano repleto de mudanças e muitas incertezas pela frente.
Como cristã, creio ser inútil defender uma mensagem de paz, esperança, luz, comunhão, perdão e salvação nessa época se não o fazemos durante todo o ano, no dia-a-dia, da mesma maneira que qualquer demonstração de preocupação para com a vida alheia num momento específico – seja num momento extremo ou apenas por causa de uma festa – enquanto se vive como se o outro não existisse no resto do tempo.
Outra questão é a atitude de reverência inusitada que surge por causa de uma data que - sabido dos que conhecem as Escrituras – não difere em nada das demais. Entendo o valor da cultura e da tradição, principalmente como metodologia de ensino, porém não deixa de parecer hipocrisia tentar corrigir a reverência do outro mesmo que isso possa ferí-lo ou afastá-lo. Muito se fala em nome da verdade sem que haja compreensão e sensibilidade, porém o que se vê é pouco de Cristo nas atitudes que se mostram.
Com isso, quero te convidar a refletir comigo sobre a pessoa de Jesus Cristo, a razão de nossa existência e trabalho, por quem vivemos, a quem dobramos todas as certezas que podemos obter. Cristo, o autor e consumador de nossa fé, a razão de estarmos onde estamos, de recebermos de Deus a graça e a misericórdia de que necessitamos.
E essa graça e misericórdia é o que precisamos viver e compartilhar todos os dias do ano, em cada palavra, mensagem e atitude. Cristo, ao andar por essa terra, olhava para as pessoas e transmitia mais do que uma mensagem: Ele era a mensagem, a aceitação de Deus, o olhar de misericórdia, a vida que poderia saciar a sede de todo e qualquer que dEle se aproximasse.  Que desafio ser como Cristo!
De que vale o trabalho, o ministério, a empatia, o serviço, se o trato com o outro não reflete a mão estendida de Cristo? Que mérito uma grande obra pode trazer, que alegria a realização de um grande ministério pode gerar se não poderia estar mais distante da imagem de Cristo que precisamos refletir?
É por isso que mais uma vez desejo me aquietar nestes dias de tanta agitação, e escolho olhar para Jesus, de quem procedem as fontes da vida eterna, para dEle receber a compreensão, o alívio e o descanso de que tanto necessito. Olho para Jesus e sou salva, salva de mim mesma, de minhas decepções, das rejeições e tristezas que me acometeram durante o ano, dos erros e impotências que inevitavelmente afloraram em minha caminhada.
É por isso que não consigo boicotar Papai Noel, principalmente porque tenho consciência de que de forma alguma ele poderia ser uma ameaça ao centro da mensagem do evangelho, que é a pessoa de Jesus Cristo. Não é possível tal competição, não há o que possa ofuscar Sua verdadeira obra em nossa vida, obra tal que pode ser percebida todos os dias do ano, e não apenas em dezembro.
Que privilégio não estarmos presos a um calendário para podermos viver e refletir tão preciosa salvação! Que Jesus Cristo continue sendo engrandecido, seja em nossa vida, seja em nossa morte, em meio a alegrias e sofrimentos, com dúvidas ou certezas, e que aqueles que nos cercam percebam Sua vida, atitudes e presença todos os dias do ano em nós, para a glória única e exclusiva de Deus.
Feliz Natal, queridos!

Angela Natel

domingo, 23 de dezembro de 2018

O Reino de Deus está próximo! - 4o Domingo de Advento


Este é o quarto domingo de advento, momento para refletirmos sobre a manifestação do Reino de Deus.
O Reino de Deus tem um aspecto interessante: o já e o ainda não. Para nós, isso significa que o Reino de Deus já chegou a nós por meio da vinda de Jesus ao mundo, sua morte e ressurreição. Entretanto, este Reino não está completamente manifesto, o que só ocorrerá em Seu retorno a este mundo, no fim dos tempos.
Mas, uma coisa me chama a atenção quando aparece, na Bíblia, a expressão 'o Reino de Deus está próximo'. No sentido do texto grego, língua na qual ele foi originalmente escrito, este próximo não se refere à dimensão temporal, mas geográfica. Isso quer dizer que o importante não é o quando, mas o onde - não quando as coisas vão acontecer, mas onde elas acontecem.
O Reino de Deus não está longe de nós, inacessível, não é limitado a fronteiras geográficas, muros, barreiras, cercas de arame farpado. O Reino de Deus está dentro de nós.
Nesta vida, podemos perder tudo: nossa reputação, nossos entes queridos, nosso sutento, nossos bens, mas o Reino de Deus não pode ser arrancado de dentro de nós. Este Reino se manifesta automaticamente onde Jesus está, onde Ele decide, onde Ele é reconhecido, engrandecido e imitado.
Assim, independentemente de nossas emoções, sensações e desejos, o Reino de Deus, que não pertence a nenhum partido político, nenhuma denominação, a nenhuma teologia, se manifesta e está pronto a mostrar seus sinais onde muitos menos esperam, em lugares à margem da sociedade, naqueles que, muitas vezes, são julgados impróprios, deslocados, inadequados à nossa régua moral e estética.
Para nosso descanso, todas as condenações terminam onde o Reino de Deus é estabelecido, pois Seu julgamento sobre nós é amor!



"Pois o Filho do homem veio buscar e salvar o que estava perdido." - Lucas 19:10 - NVI


sábado, 22 de dezembro de 2018

Demonizar cultura

Samba, forró e funk
Demonizar certos estilos musicais
Dizer-se escandalizado
Seria algo esperado
Dos pelo texto identificados 
como "fracos na fé".
Mas são os cães de guarda da religião
Que se prezam a esse papelão
Proibindo pela própria conveniência
E julgando pela aparência.
Não me calo nem vou concordar
Que em nome de Deus
Se usem meias verdades,
Dois pesos e duas medidas
E por ignorância se espalhe
Que isso é ser cristão.
Censurar parte de uma cultura
Tratar com generalidades
Não tem relação alguma
Com a pessoa de Cristo,
Mas só evidencia vaidades.
Se é maduro e bem estudado
Não finja desconhecimento
Não use o nome de Deus para defender preferências pessoais
Não seja dissimulado
Como se todas as teologias
fossem redondamente iguais.
Angela Natel

Bethlehemian Rhapsody (with lyrics)

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Algumas das lições que (re)aprendi em 2018:


1. Bandido bom não é bandido morto. Cada um de nós carrega o potencial criminoso, uma vez que nascemos com uma natureza corrupta e destinada à destruição. Bandido bom é aquele a quem é dada a chance e as condições para uma nova vida.
2. De nada vale estar em um “ministério” ou posição de influência, se não trato com respeito e dignidade a todos os que me cercam ou tenho contato.
3. Ninguém precisa de minha esmola. Dar do que me sobra não faz de mim uma pessoa melhor – só revela a ganância que habita em mim. O verdadeiro sacrifício é repartir do que tenho, mesmo que não me sobre. Uma atitude assim me ensina que somos todos iguais e carentes da mesma graça.
4. Ao proferir condenação a outro coloco-me em posição superior e reconheço que meus erros e pecados são de menor valor. Isso deflagra uma atitude hipócrita e moralista de quem vê o cisco do olho alheio sem se importar com a própria trave.
5. Convivo com a tentação de, caso erre, culpar o diabo e, caso acerte, dizer que foi Deus. Com isso, acabo não assumindo responsabilidade sobre meus atos, muito menos sobre suas consequências. Além disso, corro o sério risco de não reconhecer a ação de Deus por trás de toda e qualquer situação, inclusive das que me fazem sofrer.
6. Tenho a tendência de emitir julgamento a respeito de qualquer coisa sem refletir sobre as complexidades da vida e do ser humano. Isso pode causar distanciamento das pessoas com as quais posso aprender e a quem posso ajudar e servir. Lidar com situações de forma generalizada me tira da realidade e me faz exigir dos outros o que não podem oferecer.
7. Educação sem pensamento crítico é adestramento. Ensinar não é dar respostas prontas, mas caminhar junto e trocar vida e experiência.
8. Lidar com as questões da vida em termos de bem e mal, numa polarização extrema, é ignorar a própria vida e Aquele que é o verdadeiro protagonista dela em todas as suas dimensões.
9. Sempre procurarei um bode expiatório, um elemento que chamarei de “mau” para culpar por aquilo que considero a causa de meu sofrimento no momento. Isso é uma atitude natural a cada um de nós, o que não a justifica.
10. Vivemos em busca de heróis, salvadores da Pátria, pessoas que encarnem a libertação de nossos problemas. Isso porque possivelmente nosso inconsciente tente nos avisar dessa maneira o quanto somos impotentes diante dos desafios da vida. Entretanto, nenhuma pessoa neste mundo poderá encarnar a salvação de que realmente necessitamos, uma vez que isso já foi realizado há mais de dois mil anos atrás. Expectativas demais sobre qualquer outra pessoa nesse sentido só trarão inevitáveis frustrações e podem sobrecarregar quem for seu alvo.
11. Rótulos, estigmas e comparações são extremamente nocivos a qualquer pessoa. Nenhum nome, rótulo, designação é capaz de representar adequada e completamente a complexidade humana.
12. Somos todos iguais, independentemente de nossa condição, qualquer que seja. Privilégios podem ser agradáveis para quem os recebe, mas causam mais mal do que bem.
13. Não, não há oportunidades iguais para as mulheres, e isso sinto na pele, seja como linguista, teóloga, professora, escritora ou qualquer outra função que ocupe, em qualquer lugar. Títulos falam alto, mas se um homem tiver um título terá a preferência (e às vezes terá a preferência mesmo sem titulo, apenas por ser homem). Para conquistar um espaço sem ser indicado por alguém já consagrado, as mulheres precisam ralar muito mais do que os homens.
14. Caso alguém confesse que tem alguma doença mental (transtornos, psicoses, etc), mesmo sendo tratado e em perfeitas condições de trabalho, será discriminado, não importa a instituição.
15. Um evangelho que não tenha como referência a pessoa de Jesus Cristo é falso. Doutrinas e ritos ou qualquer manifestação religiosa não substitui a pessoa de Cristo, Sua obra e referência.
16. A indústria da moda (vestuário, em sua maioria) não está preocupada em atender adequadamente pessoas que não se encaixem no padrão de beleza instituído culturalmente. Por isso não me importo de preferir roupas e calçados masculinos quando estes atendem ao meu tamanho e preferência.
17. Não existe ‘chamado missionário’. A responsabilidade em participar da Missão de Deus em revelar a pessoa de Jesus ao mundo é de todo cristão, da Igreja como um todo. Não é possível terceirizar o trabalho missionário me contentando em orar por missões ou sustentar financeiramente algum missionário sem fugir dessa responsabilidade que é de cada um de nós.
18. Prefiro morrer do que matar. Nesse sentido, não consigo, por respeito à minha própria consciência, concordar com o porte de armas ou seu uso. Ainda tenho dificuldades em conciliar a ideia de ser cristã e apoiar o uso de armas, porém reconheço que sou limitada, mas assim como respeito quem pensa diferente, espero que respeitem meu pensamento também.
19. Definitivamente, a gente não colhe o que planta. Conhecendo-me como me conheço sei do que sou capaz e do que já pensei, falei ou fiz nesta vida. Minha consciência (de que o que todos os seres humanos naturalmente merecem seja o inferno) não me permite entender que qualquer coisa boa que me sobrevenha eu tenha sido capaz de gerar por mim mesma. Entendo também que o texto bíblico utilizado de forma generalizada para embasar a ideia de que colhemos o que plantamos tem sido interpretado fora de seu contexto e de maneira equivocada por muitos. Assim, entendo que tudo o que é bom e/ou proveitoso é resultado única e exclusivamente da graça de Deus sobre nós.
20. Corremos o risco de tentar gerenciar a obra e a missão de Deus. Isso quando tentamos controlar o que e como Deus faz as coisas na vida de outras pessoas, também na tentativa de reproduzirmos o que nos acontece em outrem. Porém isso pode cegar nosso entendimento quanto à multiforme graça de Deus e o tratar personalizado na vida de cada um. Ao tentar determinar como e quando as pessoas devem agir em sua vida diária em seu ministério, tento me colocar no lugar de Deus ou como gerente de Sua ação. Nesse sentido, ainda que justifiquemos que estamos cuidando uns dos outros, a linha tênue entre cuidado e controle pode ser ultrapassada, causando um grande equívoco em nossa verdadeira vocação e podendo arruinar e oprimir a vida de outras pessoas.
21. Discordar não significa não saber ser contrariado.
22. Nenhuma autoridade está acima da lei.
23. É muito perigoso quando confundo Deus com Organizações, Instituições, CNPJ, prédios, estatutos ou partidos políticos. Acabo me colocando em defesa do indefensável, a despeito do que fui realmente chamada a fazer e a quem devo servir.
24. Não temos autorização para usar o nome de Deus para fins politico-partidários. Usar Deus como justificativa de uso de poder de uns sobre outros é característica do Anticristo e seu anti-Reino.
Puxa! 2018 foi um ano de muitas lições. Com certeza ainda tenho muito a aprender. Talvez eu mude de ideia, talvez não. O mais importante é não ficar parado, buscar o aprendizado, nunca deixar de caminhar.
Tenham um feliz fim de ano!
Grande abraço
Angela Natel

quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Motivo de escândalo



A roupa
A maquiagem
O trejeito
O palavrão.
Motivos de sobra
Para comentário
E pedidos de satisfação.
Mas o que me é motivo de escândalo
Não é nada disso, não.
Mas sim crente que se põe no lugar de Deus
Que distribui condenação.
Me escandalizo com fofoca e maledicência
Com gente duas caras, que não me conhece
E se acha no direito de exigir algo de mim.
Me escandalizo por usarem textos bíblicos
Com o fim de controlar comportamento alheio
Com tradutor que não sabe interpretar texto na própria língua.
Com consultor que manipula o texto em sua própria teologia.
Sim, é motivo de escândalo quem prega o amor
Mas vive distribuindo coice no dia-a-dia,
Quem julga por um palavrão mas não percebe o desserviço que faz, porque se atém na exterioridade, sem buscar o coração.
Sim, estou escandalizada
Por quem me lê somente através das redes sociais
E que somente por isso se acha capaz de distinguir o bem do mal que há em mim.
Se o texto bíblico dissesse o que muitos dizem por aí, então todos estes que me escandalizaram condenados estão.
Acima de uma instituição, olho para Cristo
Que não julga como os demais
Não põe etiqueta de acordo com o comportamento
Mas estende a todos Sua misericordiosa mão.

Angela Natel

quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Incomparável



Dor não se compara
comparação mata
morrer de dor
morrer de amor
morte,
incomparável dor.

Sofrimento alheio
não ameniza minha dor
não a torna melhor ou pior
ninguém sofre comigo
ninguém vive minha dor
só comparam com outras dores.

Vingança não é justiça
uma dor não ameniza a outra
um mal não cobre outro
ninguém paga por ninguém
nada se justifica a si mesmo.

Dor incomparável
dor sem igual
porque é minha,
só eu sei como ela é
porque está em minha pele
em meu interior.

Sofrimento do outro não me dói
por isso amenizo
ignoro, sou omisso
comparo com o que considero pior
não choro junto
não sou compassivo
porque não sinto sua dor.

assim me justifico
no injustificável
não calço outras sandálias
que não sejam minhas
que não me identificam.

Dor incomparável
daquele que sentiu a dor do outro
e se esvaziou de si mesmo
não comparou, sentiu
a dor de ser o outro
e assim justificou a todos.

Angela Natel

terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Realmente tentando não ser feio



Nós vivemos em um tempo feio. É assim que eu vejo, assim mesmo. O racismo está em ascensão, a xenofobia está em voga e a misericórdia anda pela prancha. As crianças são presas, os jornalistas são desmembrados e a raiva é total. É um momento feio. Então estou tentando não ser feio. Mas não é fácil. Ser feio a respeito de toda a feiura é fácil. É claro que quando insiro minha própria feiura na briga eu não a chamo de feia, eu a chamo de certa. Digo a mim mesmo que minha raiva é como o Cristo que vira a mesa no templo. Mas nos meus momentos mais contemplativos, tenho que admitir que na maioria das vezes a minha raiva é mais como o fato de Pedro cortar uma orelha do que a limpeza do templo por Jesus. Só porque Jesus fez algo não significa que eu deveria tentar fazer isso. Afinal, Jesus andou sobre a água também.
Então, quero resistir à feiura, não sendo feio, não furioso, não insultando os que são apanhados pela feiura mimética, mas sendo algo diferente. O que estou dizendo é que eu quero tentar ser bonito. Não estou certo de que sou chamado a imitar a Cristo em sua ira, mas sei que sou chamado a imitar a Cristo na cruz. É a forma cruciforme que é a forma definitiva da beleza cristã. A crucificação é feia a menos que imitemos a Cristo e oremos: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”. Essa é a beleza que salva o mundo.
Na cruz, o pecado do mundo se uniu a uma monstruosa singularidade de deicídio - o assassinato de Deus. Mas Deus em Cristo absorveu a singularidade do pecado e perdoou o mundo. É por isso que descrevemos a crucificação em termos de beleza artística. Sexta-feira Santa foi simultaneamente o momento mais feio e o momento mais lindo da história. O bode expiatório, a zombaria, a crueldade, a barbárie, a violência eram todos feios. Mas a feiura foi superada pela beleza de Jesus perdoando tudo. Na colisão da feiura humana e da beleza divina, a beleza vence. A beleza salvará o mundo.
Talvez você seja confiável para exercer a raiva com justiça, mas tenho certeza que não posso. Minha raiva provavelmente fará pouco mais do que aumentar a feiura. Então, ao tentar não ser feio, preciso escolher uma postura de compaixão. Não quero dizer um quietismo ou uma passividade que evite o confronto profético, mas quero dizer um confronto profético que vem de um lugar de amor genuíno por todos - amor não apenas pelas vítimas, mas também pelos algozes. Sim, isso é difícil; mas quando decidimos que alguns pecadores são indignos de ser amados, nos colocamos ao lado da multidão contra Cristo. O fenômeno do satanás pode operar tão diabolicamente entre aqueles que estão do lado direito da questão.
Quando a multidão de fariseus cruéis estava pronta para apedrejar a mulher apanhada em adultério, Jesus não incitou uma multidão justa a apedrejar a multidão cruel - é assim que o satanás vence. O que Jesus fez foi quebrar o feitiço da multidão com um chamado à autorreflexão individual.
“Disse-lhes Jesus: 'Quem dentre vós que estiver sem pecado seja o primeiro a atirar nela uma pedra'… Quando ouviram isto, foram-se um por um, começando pelos anciãos” (João 8: 7, 9)
Esta é uma bela história porque Jesus tirou a feiura da multidão. Eles vieram como uma turba sedenta de sangue, mas se dispersaram como indivíduos contemplando seu próprio pecado. Raiva, não importa o quão justificada, não poderia ter feito isso. A multidão pronta para apedrejar a mulher sabia que eles estavam certos - eles tinham versículos bíblicos para provar isso. E tenho certeza de que Jesus poderia ter reunido uma segunda multidão que sabia que eles estavam certos em apedrejar a primeira multidão. (Nós nunca somos mais hipócritas do que quando estamos atacando os hipócritas.) Mas jogar pedras em atiradores de pedras não é o caminho de Jesus, porque não é o caminho do amor. Jesus não estava apenas tentando salvar a mulher apanhada em adultério de ser apedrejada, Jesus também estava tentando salvar os indivíduos apanhados no mimeses satânico da multidão. A ira justa teria terminado com a feiura de alguém ser apedrejado. Mas Jesus salvou todos os envolvidos através de atos de contemplação e perdão. Isso é lindo. E esta é a beleza que eu quero tentar imitar.
Nós não podemos nos impedir de imitar os outros - nós somos moldados para mimesis. O que podemos fazer é escolher quem imitar. Em vez de imitar os enraivecidos - que podem muito bem estar certos sobre o que estão furiosos - eu quero imitar a Jesus que, de uma maneira bonita, desarmou uma multidão e perdoou um pecador.
Eu vou fazer um esforço concentrado para evitar a perpetuação da raiva. Eu vou dar mais tempo para oração contemplativa e longas caminhadas em lugares tranquilos. Eu vou ler mais Thomas Merton. Acho que vou desistir de artigos de opinião para a Quaresma. Eu realmente quero desistir da raiva. Eu quero tentar me tornar um sábio. Isso provavelmente parece pretensioso, mas é exatamente o que eu aspiro humildemente a desejar. Quando me aproximo dos sessenta, posso pelo menos tentar me tornar um sábio. O que mais eu vou fazer? Como o poeta francês Charles Péguy disse: "Há apenas uma tragédia no final: não ter sido um santo".
Então estou tentando.
Eu estou tentando não ser feio.
Eu quero viver uma vida mais bonita.
Eu sei que não posso confiar em mim mesmo com raiva.
Na beira dos sessenta, quero tentar me tornar um sábio.
Se você pensar nisso, ore por mim.

Brian Zahnd
Arte de John Martin Borg.

https://brianzahnd.com/2018/12/trying-hard-not-ugly/#more-6592
acessado em 18/12/2018 às 13:32h

Tradução de Angela Natel

Caminho

Pelo caminho encontro
os que pregam amor e não amam,
os que desejam liberdade oprimindo outros,
os que se dizem servos, amantes do poder,
os que ganham o mundo mas perdem a própria alma.

Vendilhões do Templo,
vendidos em sua própria consciência,
supervalorizam o externo, a aparência
em detrimento do princípio, do coração.

Os que se colocam como deuses do alheio,
mandando sobre o que não lhes pertence,
não abertos a negociação.

Enxergam no outro o que apodrece sua alma,
delimitam o tamanho e os limites de Deus.
Reconhecem o divino somente no espelho de si mesmos,
os que se veem detentores da última palavra.

Sim, encontro os que se recusam a perder
principalmente numa discussão,
que não se calam, não se aquietam,
até provarem seu ponto, sua razão.

Encontro também os sem voz,
que, no afã de serem ouvidos, agridem, machucam,
e de oprimidos passam a oprimir.
São muitos ternos e máscaras,
fachadas que cobrem a podridão de caráter.

Algumas vezes me encontro com um desses
e, depois de horas analisando a figura
percebo o detalhe, a luz refletida no espelho
bem diante de meu nariz.

Por isso, frequentemente me calo,
distinguindo em mim o que tanto condeno.
Por isso é melhor aquietar-se.
E se permitir assumir o erro, calar a condenação,
assumindo que não sou Deus, não sou ninguém.

Angela Natel

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Amizade verdadeira



Como ter certeza de que se encontrou um amigo verdadeiro?
Vale a pena a reflexão.
De que maneira entenderei que posso confiar
E encontrar apoio e compreensão?

Como saber se o cuidado não é tentativa de controle
E me sentir livre ao me expressar?
De que forma sei que não serei de primeira condenada
Ao me despir das máscaras de verdadeiramente me mostrar?

Como falar do que me inquieta
Sem ser de cara rechaçada?
Como compartilhar coisas que amo
E ainda ser incentivada?

E, ao trabalhar, será que serei respeitada
Em meu silêncio e necessidade de isolamento?
Será que preciso o tempo todo ser disponibilizada
e ter que concordar em qualquer momento?

Amigos verdadeiros são raros de encontrar
Mesmo que alguns pensem que não.
Quem acha ser amigo precisa, então, pensar
Se reclamam de tudo mas exigem aceitação.

Por isso o que penso ser um amigo de verdade
Gira em torno de muito respeito
Um apreciar do outro a singularidade
E não impor-se do seu modo e do seu jeito.

Nesse sentido, cada um tem seu limite
De tempo, espaço e emoções
Cada um busca alguém que o abrigue
Diferentes, porém companheiros corações.

Angela Natel

sábado, 15 de dezembro de 2018

Quer participar de algo especial na missão? Aproveite esta oportunidade:

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O que me resta

E, no mais, o que me resta nessa vida?
Uma ferida curada, uma máscara caída.

O chão roto de manchas de sangue
do dedo dilacerado em ansiedade.

Não me sobrou muito além do verniz na cara, brilhando em vaidade.

A pergunta que sobe n'alma, medo, desgosto, da infância o trauma.

A dor que a pressão me traz
e a tentativa de controlar minha vida arregaça.

O que me sobrou? Só um pouco.
O resto do lixo de minha emoção vacilante, inconstante.

De quando tudo é vivido à flor da pele.
Sangue, lágrimas, suor, excremento.
Tudo vivido, jogado na cara.

Depois disso, além disso, não me sobra nada. Sou negativada em meu interior.

Menos que nada: o não ser, reprovada.
Vacilando em respostas, tropeçando nas mesmas pedras.

Errando toda vez que ergo os olhos em busca de aprovação.

Uma história contada ao vento
que, no fim, dá em nada.

Mudança que houve com o tempo,
um sonhar acordada.

Para, então, descobrir que o tempo não existe, que a vida passa, e o que sobrou...
foi nada.

Angela Natel

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Qual o seu partido? (A Missão Real)


Qual o seu partido?
Seu lado, sua tendência, sua pendência?
Nessa nossa luta dialética de cada dia
Interagindo nas redes, nas relações
Mostramos nossa verdadeira face
Antes oculta sob as máscaras da conveniência.

Então, qual o seu partido?
Seu lado – o que determina suas escolhas e discursos?
É Batista? Presbiteriano? Anabatista? Luterano?
Sim, qual o seu partido?
Já que estes, há muito, deixaram de seguir o original plano.

Como bons brasileiros seguimos deslumbrados
Com tudo o que procede dos Estados Unidos da América
E como bons seguidores pisamos no mesmo caminho
Levantando bandeiras,
Transformando nossos clubes/igrejas em sedes partidárias
Aonde servimos uma mensagem não acessível a todos.

Evangelho? Qual deles?
O da Bíblia mal interpretada, o da bala para quem não se encaixa,
Ou o que serve ao interesse de alguns?
A escolha é livre, o choro também.

E como os irmãos do Norte,
seguimos defendendo e repetindo discurso alheio,
adestrados por porta vozes vendidos,
prostituídos em sua missão.

A bancada evangélica tem muitos representantes
espalhados pelas esquinas e organizações do país.
Segue em seu grito alucinante
De que é preciso sempre ganhar
Desumanizar e até matar
Para ser feliz.

De que partido você é?
Batista, Presbiteriano, Anabatista, Luterano?
Na missão real há rostos, etnias, diferença,
não bandeiras nacionais - representações das conquistas coloniais.
Porque na missão real não há espaço para triunfalismo,
não há chance para partidarismos denominacionais.

Entretanto, se você não se conformar
Ao padrão desses partidos
Nem se encaixar na visão desses gritos
Então enxergará a missão real que se nos foi apresentada.

Fácil é emitirem veredictos a respeito
Dos que se engajam nessa missão
sem contexto, sem conhecimento de causa.
Encaixotando Deus e seus servos
na imagem criada sistematicamente em suas mentes e liturgia.

Na missão real você chora, ri, lamenta, reclama,
porque é feito de carne e osso, não de ferro.
Alguns missionários já tentaram suicídio, outros conseguiram,
enquanto os autodenominados cristãos devoram-se uns aos outros
por causa de seus posicionamentos, de seu partidarismo
e de seu evangelho, que não é para todos.

Muitas das vezes, na missão real,
você tomará decisões sem muita convicção
de que está fazendo a coisa certa.
Porque na missão real não há espaço para triunfalismo,
não há chance para partidarismos denominacionais.
Nem tudo é preto e branco, fácil de distinguir.

Na missão real há lágrimas, tristeza,
decepção e dúvida,
já que todas as certezas encontram-se na verdade relacional.

E a verdade?
A verdade é uma pessoa,
não uma ideia a ser defendida com unhas e dentes.
A verdade é testemunhada na missão,
não provada com argumentos e ódio.

É por isso que na missão real
Se tem consciência das limitações,
É um aprendizado e constante, diária correção.
Por isso não é mau mudar de ideia,
parar um pouco, confessar.
Faz bem, faz jus ao nome de cristão.

Mas o que se vê hoje em dia é o avesso da real missão:
máscaras por todo lado,
vida colocada numa balança para ver se é digna de viver
Missionários encaixotados, podados, chantageados
- caso não se encaixem, só tem a perder.

Angela Natel 

quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Olhe para mim

Olhe para mim
Me enxergue.
Será que, por não depilar minhas pernas
Sou feminista?
Transformista?
Lésbica?
Rebelde?
Desleixada?
Roqueira?
Ou apenas alguém que decidiu não se depilar, independentemente de suas razões?
Você realmente precisa me dar um rótulo?
Precisa tanto colocar legendas em minhas imagens?
Por que não apenas olhar e, de fato, enxergar?
Se mudei o cabelo ou
Se minha pele é tatuada,
Isso precisa significar algo para você?
Por que, em sua mente, não continuo sendo a mesma pessoa?
Não olhe, apenas, enxergue!

Angela Natel

P.S.: Fui indagada por algumas pessoas a respeito de meu corte e cor de cabelo e tatuagens: o porquê.

Interessante é que as pessoas que me questionam a esse respeito, mesmo ouvindo falar de mim há muito tempo nunca antes tiveram a oportunidade de me dirigir a palavra. Ou seja: Só por ouvir falar, supõe-se conhecer? Supõe-se entender as razões?

Então me pergunto: a cor de meu cabelo, seu comprimento, as tatuagens e brincos possuem um único significado possível? As caixinhas na mente das pessoas são tão sólidas que as tornam incapazes de olhar sem, antes, fazer suposições?

quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

A imagem te incomoda?




Pois é exatamente isso que a Igreja espera de seus obreiros, e espera de seus missionários, senão eles até podem perder o sustento!
Dá para acreditar?

Se você faz um trabalho voluntário intercultural
e não divulga uma imagem em que você pareça a solução para aquele grupo, o "salvador estrangeiro", é como se não prestasse contas do dinheiro recebido para o trabalho.

Então, parece que o missionário/voluntário é constrangido a produzir esse tipo de imagem, esse tipo de agressão àqueles que são o alvo de seu serviço.

Trata-se de uma cultura criada sem se pensar nas implicações: quando se expõe o outro em benefício próprio, quando se fotografa sem pedir permissão, quando o missionário/voluntário se coloca numa posição de superioridade em relação ao outro, simplesmente com a justificativa de prestação de contas aos financiadores de um projeto, ou de arrecadação financeira para manutenção do mesmo - ou, pior, apenas para própria sobrevivência.

Sim, porque se o resultado não é visível, aquilo que mantenedores/financiadores esperam, de acordo com os moldes esperados, corre-se o risco de ser deixado de lado e até a perda da própria subsistência.
Já fiz muito disso em minha vida e trabalho. Hoje percebo com um pouco mais de clareza essas questões... me arrependo, reflito, tento corrigir.
Ainda há um longo caminho ao repensarmos nosso serviço ao próximo, tanto na maneira como nos vemos quanto na forma como decidimos servir.

Situação ainda incômoda?
Que tal refletirmos sobre isso em nossas comunidades, falarmos abertamente sobre isso, buscarmos juntos melhores maneiras de sermos como Jesus em nossa vida e serviço, sem exposição do outro, sem parecermos melhores que ninguém, sem condicionarmos nosso engajamento a uma maneira única e fechada de prestação de contas?

Vamos juntos nessa?

Angela Natel
Reflexão inspirada em comentário de Cleber Sá Dos Santos à imagem - obrigada!
10/01/2018

terça-feira, 11 de dezembro de 2018

X-MEN: missionário/voluntário



Apesar de estar envolvida no trabalho missionário/voluntário há mais de 20 anos, ainda encontro-me aprendendo a respeito de nossos limites.
E se repito o discurso sobre meus limites, é porque ainda se faz necessária tal repetição.
Ainda se ignora a humanidade do missionário/voluntário.
Ainda ele é tido por super-herói, inumano, mutante, feito única e exclusivamente para oferecer-se a si mesmo e o que tem a outros, indiscriminadamente.
E eis que este ser se torna incômodo quando pede ajuda voluntária e financeira para seu sustento, quando faz campanhas, quando pede para si.
Porque pedir ajuda e mostrar limitações descaracteriza este ser mutante, feito para servir e se desgastar. Dizer ‘não’ é algo impensável em sua realidade, por isso assusta, e até escandaliza.
E é por isso que tenho encontrado, nesses anos todos de caminhada, vários missionários/voluntários que me impedem de publicar suas fotos em um momento de alegria, descanso ou diversão, com medo de perder seu sustento, seus apoiadores, qualquer ajuda financeira.
Não, porque ao missionário/voluntário não é permitido descansar, se divertir, muito menos às custas dos outros. Seria um abuso.
Talvez seja por isso essa constante incerteza e insegurança em que me encontro atualmente na vida. Durante 11 meses no ano realizo um trabalho missionário/voluntário, sem qualquer expectativa de retorno. Porém, quando tenho a oportunidade, não escondo um momento de descanso, diversão, renovo de forças. Assim, somente aqueles que de fato compreendem todas as implicações dessa vida de missionário/voluntário é que se engajam em apoiar-me e ajudar em meu sustento. E, por isso, posso dizer: são muito poucos os que compreendem.
Até mesmo este texto, que agora escrevo, implica em risco de perda de apoiadores, perda de sustento financeiro, perda de empatia para com meu trabalho e o que tenho a oferecer. Entretanto, se o escrevo, não é pensando em mim, mas nas próximas gerações de missionários/voluntários.
E, com tristeza, ainda afirmo: nem dentro das agências missionárias há essa compreensão. Temos nossas funções, um lugar para repousar a cabeça. Mas, caso digamos ‘não’ para alguém ou alguma atividade, somos tentados a nos sentirmos culpados e até indagados a dar explicações.
Não nos é permitido o descanso, seja no campo, seja na base - isso seria impensável. Alguns, com posição de maior responsabilidade, com cargos de maior reconhecimento, até podem se dar ao luxo de tirar um mês de férias. Mas sem esse reconhecimento, uma semana sem atender às demandas da missão seria abuso.
Não, o missionário/voluntário é tratado de acordo com sua produtividade, é um ser-máquina que, quando der problema, deverá ser trocado por outro que melhor atenda às necessidades de onde serve. Deve ceder sua casa, caso não seja sua, deve ceder seu posto a alguém que atenda à demanda.
Não, não pode se dar ao luxo de postar uma foto se divertindo, não pode recusar uma atividade que o desgaste, precisa seguir o fluxo do que é considerado normalidade, e precisa sempre enviar relatórios de sua produtividade e dar explicações de suas impossibilidades.
Não, o missionário/voluntário não é humano. Deve ser esperado dele sempre o maior rendimento, exigido dele até que se manifeste em seu limite.
E este ser é descaracterizado quando se torna parte de uma instituição missionária/voluntária. Perde sua identidade individual e a ele não é permitido manifestar-se sem que esteja dentro dos padrões da referida instituição.
Não, não é uma pessoa – é um missionário/voluntário.

Angela Natel

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Coliseu



Tantos apertos de um lado e do outro
Gritos alvoroçados
Muitos se espremem para ver o espetáculo
Ansiosos e hipnotizados.

Suor que escorre pelos rostos
Todo desconforto vale a pena
Não importa a fome que massacra o corpo
Contanto que eletrizante seja a cena.

Então os tambores soam, impetuosos
Arrepio que corre a pele toda
Tremores chacoalham os corpos
Sob o escaldante sol a trompa soa.

Entram eles, espetáculo público,
Todos os que consideramos a escória da humanidade:
Os falhos, inferiores, os que nos decepcionam de súbito
Os subordinados, os vis, os que traem lealdade.

Sim, o massacre vai começar
E as feras são, devidamente, soltas,
Exposição pública, flagelo, palavras ao ar,
E muitas formas de violência para serem servidas estão prontas.

A laceração do outro excita
E traz satisfação
A posição de juiz é atraente e evita
Que sejamos o alvo da humilhação.

Assim esquecemos a fome
A injustiça e nossa própria responsabilidade.
Damos para cada demônio um nome
E tratamos tudo com leviandade.

Dessa forma, nos justificamos a nós mesmos
E endeusamos nosso comportamento
Jogamos todas as palavras torpes que temos
A fim de produzir um belo julgamento.

Ao ignorar que podemos estar errados
Celebramos um belo espetáculo
De carne, sangue, pele e vísceras no tablado
De nosso santo tabernáculo.

Angela Natel

domingo, 9 de dezembro de 2018

Segundo Domingo de Advento


Hoje é o Segundo Domingo de Advento, um ótimo momento para refletirmos sobre onde temos depositado nossas expectativas.
No contexto onde estamos inseridos, é muito fácil sermos levados pela decepção, desânimo e vivermos sob o estigma da frustração.
Entretanto, é necessário que façamos um balanço do que tem nos movido. Nossas motivações revelam, por si só, os valores que regem a vida, e nossas decepções apontam para o alvo de nossa esperança maior.
Por isso, é preciso lembrar que todos somos falhos, não há um justo sequer, todos erramos. Colocar a esperança na segurança dos bens, do dinheiro, em quem admiramos, pessoas de destaque, 'salvadores da pátria',  autoproclamados profetas, pastores, políticos, familiares e amigos, por mais que tenham conquistado nosso apreço, só nos trará uma vida de constantes amarguras.
Que nesse segundo domingo de Advento, lembremos de colocar nossas expectativas na vida e palavras de Jesus, que não veio para condenar nem ser servido, mas para salvar e dar a vida por todas as pessoas, sem exceções.
Que sejamos ajustados em nossas expectativas, tranquilizados em nossas angústias, e que voltemos nossos olhos para o único que pode aliviar o pesado fardo de viver num mundo de tanto pesar.
Um abençoado domingo de Advento a todos!
Angela Natel


sábado, 8 de dezembro de 2018

Palavras de Avivamento



Ore contra a corrupção
Pela intervenção divina,
Mas não seja corrupto
Nem injusto no seu dia a dia.

Lute contra a injustiça
Mas não pegue os nomes de pecados
Que pessoas cometem
E diga que são nomes de demônios,
A Bíblia não ensina isso.

Viva e ensine as pessoas
A se responsabilizarem por seus atos.
Lutar contra a corrupção
É ser honesto e denunciar o erro
Não esbofetear demônio.

Levante-se, defenda as causas
Que Jesus defenderia
Ele mesmo não precisa da sua defesa.
Olhe para as pessoas como Jesus olharia
Isso é, por demais, subversivo.

Jesus não forçou ninguém a seguir sua cartilha,
Nem institucionalizou o cristianismo.
Ele não obrigou que as escolas falassem dele
Ou somente o que lhe agradavam.

Ele defendeu os marginalizados
Deu acesso a quem os religiosos ignoravam.
Sim, na maioria das vezes,
Jesus fez o que não costumamos fazer,
Sua pauta era bem diferente da nossa.

Na vida, passo a passo,
Foi acessível, pessoal,
Revelando o Pai em sua vida
E estabelecendo Seu Reino.

Um Reino que não compactua com o Estado
Nem com os sistemas criados pelas pessoas
Muito menos com as instituições.
Um Reino que se manifesta sem precisar pagar aluguel
Que impede os justiceiros de apedrejarem pecadores
E que, através do sacrifício, serve e ama até o fim.

Angela Natel

sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

Generalidades



Nem toda pessoa é igual
nem todo crente é cristão
nem todo desviado está fora da igreja
assim como nem todo o que está fora da igreja
é desviado.

Nem todo homossexual é promíscuo
nem toda palavra é literal
nem todo casamento é verdadeira união
nem todo sorriso é real.

Nem todo o que promete cumpre
assim como nem todo o que faz, fala.
Nem toda resposta é sincera
nem sempre é mau o que cala.

Nem todo o que se diz profeta fala a verdade
nem todo palavrão é pesado
assim como nem toda palavra doce abençoa
pois pode encobrir maior pecado.

Nem todo o que pede perdão se arrependeu de fato
nem todo o que se diz preocupado pensa no outro
assim como nem todo arrependido pede perdão
e nem todo o que pensa no outro se diz preocupado.

São generalidades as que nos confundem
estigmas e padrões de pensamento
nos afastam da realidade
prejudicam nossa análise da situação.

Por isso não suponha, pergunte.
Converse antes de tomar decisão.
Não fale de alguém, tente entender
não perca a paciência, nem a razão.

Cada pessoa é singular,
é complexa, tem história.
Como é possível avaliar
ignorando sua memória?

Por isso, não generalize.
Se te decepcionarem, não rotule
não tranque ninguém num conceito, num estigma.
Se aproxime.
Caminhe junto.
Aceita o desafio?

Angela Natel

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Missionário não serve


Missionário não serve para fazer em seu lugar
tudo o que há na missão para fazer
muito menos
o que você não quer realizar.

Missionário não serve
para ser lembrado somente em eventos
relacionados à missão.
Missionário é gente
ainda que às vezes pareça que não.

Missionário não serve para tapar buraco
quando alguém não comparece.
Também não serve para dizer que na igreja
a missão acontece.

Missionário não serve de 'garoto propaganda'
de igreja, evento, instituição.
Missionário não serve de objeto
de decoração.

Missionário não serve de voz de Deus
em qualquer situação,
ele também erra, também precisa
de repreensão.

Missionário não serve prá ser ignorado
quando emite opinião
- ninguém, neste caso, serve,
é preciso respeito, consideração.

Missionário não serve
prá determinar a teologia
do outro, de quem quer que seja.
Missionário não serve prá ser guia.

Missionário não serve para ostentar título,
controlar vidas, nem usar o nome de Deus
a fim de influenciar outros a realizar sua vontade.
Missionário não serve para exigir
nem para ser exigido.

Missionário não serve para mendigar sustento
nem tentar convencer outros
a respeito da missão de Deus.
Missionário não serve de Espírito Santo
na vida de ninguém.

Missionário não serve para trabalhar
24h/dia, nem 7 dias/semana.
Missionário não serve sem descanso,
sem lazer, sem diversão.

Missionário não serve sozinho,
sem amigos, companheiros de trabalho,
sem família, sem irmãos.

Missionário não serve para ser esquecido
ou somente lembrado quando convém.
Missionário, porque está longe,
não serve para ser ignorado.

Missionário não serve sem saúde,
sem cuidados, alimentação.
Às vezes não serve sem um exercício,
nem sem medicação.

Missionário não serve para só receber sustento
se for constante e fiel num relatório,
se fizer-se lembrado.
Missionário não serve, afinal, para ser controlado.

Missionário não serve sem consciência própria,
sem relacionamento com Deus.
Missionário não serve sem disposição para o sofrimento,
sem abrir mão da companhia dos seus.

Missionário não serve se não puder ter opinião
se não puder ser fiel à sua consciência
diante de Deus e do que acredita.
Missionário não serve somente para prestigiar seus eventos
nem falar somente em ambientes relativos à missão.

Missionário não serve somente como lhe agrada
nem somente de forma a agradar outros.
Missionário, por vezes, não serve por conta
mesmo assim agrada a poucos.

Missionário, enfim, não serve pisando em ovos
preocupado com o que outros vão pensar, dizer.
Missionário não serve à ansiedade alheia
Vive pela fé, não pelo que vê.

Missionário não serve em missão própria,
pessoal, não serve em lugar do outro.
Missionário serve a Deus,
não a você.

Angela Natel 

Tudo tem limite


Sim, meus amigos, tudo na vida tem limite: o saldo na sua conta bancária, a sua paciência, os livros em sua estante, o cartão de crédito (‘Malditos Ewoks’), a sua estabilidade emocional, a disposição em ouvir e sorrir educadamente para seu interlocutor, o número de vezes que se vê na mesma situação tendo que oferecer as mesmas explicações somente para manter a paz e a harmonia neste planeta...
Pena que quando o limite está fora de nós, temos de nos virar nos trinta e seja o que Deus quiser, já que a situação foge ao nosso controle, ainda que possivelmente faça parte de consequências diretas ou indiretas de decisões, palavras e/ou ações nossas, i.e., de nossa responsabilidade.
Mas, quando o limite expirado está em nós, e nos vemos engalfinhados numa luta previamente perdida, ridicularizados por nossa própria falta de controle, expostos, trazidos à realidade por choques letais de adrenalina que a pressão geralmente tende a nos aplicar de vez em quando, por vezes nos encontramos num ponto em que desejamos correr, gritar ou somente tatuar bem no meio da testa alheia a frase: ‘tudo tem limite’.
Este mês o dinheiro apertou, o jogo de cintura foi grande, mas as coisas foram sendo levadas. Aparentemente tudo bem, até um momento (nem sei determinar bem quando, nem sei bem onde), quando o limite acabou. Trabalhar de graça foi um fenômeno muito comum durante um período que durou em torno de vinte anos de minha vida. E muitas pessoas ainda me diziam: ‘mas a Igreja te pagava’, ‘a Missão tal te sustentava’, ‘as pessoas te davam oferta’, e tantas outras coisas eu ouvi como se nunca tivesse movido uma palha, como se não tivesse estudado, trabalhado e nem me esforçado, e ainda assim vivia como que constantemente pedindo ‘esmola’ para viver, ouvindo reclamações de um lado, que não tinham obrigações a meu respeito, pedindo, insinuando, dependendo, controlando para ‘não esbanjar dinheiro alheio’, como que constantemente prestando contas e relatórios, ao ponto de chegar a colecionar envelopes e mais envelopes de recibos de tudo o que eu comprava, de tudo o que eu comia. As neuroses começaram a se multiplicar e as recriminações também. É claro que os inúmeros cursos de administração financeira surgiram (a um preço, obviamente), e me vi num ciclo vicioso de pedir, anotar procedência, somar, utilizar, anotar gastos e comprovantes, prestar contas, fotografar para comprovar, e assim sucessivamente, para evitar desconfianças.
E foi assim que iniciei minhas barganhas, trocando valores calóricos de minha alimentação por material escolar aos alunos, invertendo papéis, sustentando o insustentável, adoecendo e finalmente descobrindo que minha saúde também tem limite. E como tem. Limites e mais limites que me desafiam diariamente na postura da vítima/não vítima das circunstâncias. Ora tenho que me posicionar e não me dar por vencida, me fazer de forte, fazer meu trabalho a despeito da dor física ou na alma, ora tentando impor os limites ao redor para me dar o direito de me prostrar, pedir ajuda, pedir um tempo, pedir socorro, apenas pedir, sem ter que me explicar.
E nesse redemoinho de limitações físicas e emocionais ainda ter de ouvir certas coisas, ter de manter o sorriso amigável, os compromissos assumidos, vestir o papel de ignorante e seguir em frente como se nada estivesse acontecendo, como se andar mais uma milha fosse coisa passageira, quando o que, na verdade se percebe, é que a luz no fim do túnel não existe, bem como a previsão de chegada, mesmo que tudo tenha limite nesta vida.
Pensei ter vencido a etapa dos limites financeiros quando ganhei a bolsa do Mestrado, mas o que encontrei foram novos limites aos quais preciso me adaptar para viver, novas disciplinas, novos horizontes e novos planos. São desafios constantes para que eu não caia nos mesmos erros do passado, com o diferencial de que não preciso ‘mendigar’ valores que me são prometidos em contrato, ainda que de vez em quando tenha de lembrar das datas de vencimento. Pensei estar alargando limites ao, esporadicamente, ofertar aulas particulares de língua estrangeira, cursos livres, prestar serviços aqui e ali sem vínculo empregatício, mas os limites são tantos que já me vejo num deja vu dos tempos em que me prometeram uma coisa e fizeram outra, como se essa lição eu não tivesse aprendido e estivesse em plena prova de recuperação.
São horas de trabalho que ainda não me trazem retorno financeiro, são compromissos assumidos, planos de aula jogados no lixo porque cancelaram em cima da hora, não dava para marcar outra coisa, tempo e dinheiro desperdiçados, saúde que escorre pelo ralo, e não há como me fazer entender quando os limites são meus, inteiramente meus.
E quando se projetam os valores para o macro, é um casamento que não consegui manter, um filho que ainda não consegui ter, uma casa que não consigo comprar, uma conta que não deu prá pagar, uma noite atrás da outra que não consigo dormir, e a voz vai me sumindo porque um segundo siso na boca vai surgindo e, sabe lá Deus o porquê de tudo isso, como um elástico me vejo esticada, com medo de ser solta e levar comigo muita gente machucada. Meu Deus, tudo tem limite.
Eu sei que tudo o que existe neste mundo tem limite. E posso atentar filosoficamente para o fato de que Deus simplesmente não existe, Ele é, acima de tudo e de todos, e que por esse motivo é ilimitado em si mesmo. Sei que tudo o que tenho e ainda sou não é fruto de minhas limitações, é graça ilimitada desse mesmo Deus.
Por isso, apesar de desejar ardentemente escrever uma crônica mais alegre, ainda me encontro cercada numa visão um tanto quanto limitada da vida, esperançosa de um dia expandir os horizontes e ser bem mais otimista ao escrever. Por hora, faço-me de desentendida de mim mesma, limitada em minha paciência e condição física. A asma que limita até o ar que eu respiro me lembra do quão valiosos são os momentos que passo chorando de tanto rir em família, ou de quão maravilhoso é o semblante do aluno que acabou de ter uma descoberta pessoal em meio à enchente de palavras que acabei de derramar em sua cabeça – essa é a prova de que não há limites para as misericórdias de Deus, que insiste em agir em ambientes tão limitados como a vida de um ser humano tão miserável como o que sou.
Angela Natel
Crônicas de uma Divorciada - Abril de 2014

Você se acostuma


Hoje acordei com o corpo pesado, talvez porque finalmente consegui relaxar, após uma semana de substituição de aulas na Faculdade, meu siso nascendo, dor de garganta, febre e, para fechar a semana com chave de ouro: Show do Guns N’ Roses em Curitiba (debaixo de chuva).
Ainda cambaleando, me arrastei para fora da cama, obrigando-me a acordar. Dor pelo corpo, peso na cabeça, sono sem fim. Tem coisas que a gente passa e nem sabe bem o porquê, então ouve alguém dizer: ‘Você se acostuma’. Essa frase se encaixa em qualquer situação, talvez como um tipo de prêmio de consolação, talvez não. Só sei que já ouvi isso muitas vezes, de pessoas e em lugares bem diferentes.
Hoje é primeiro de Abril, o famoso ‘dia da mentira’, em que as pessoas se dividem nas opiniões e manifestações pelas redes sociais. Há os que aproveitam e brincam à bessa. É divertido. Você se acostuma rápido. A mentira é tida como um ato de liberdade humana, parte da natureza. Há os que levantam a bandeira contra o ‘pai da mentira’, num discurso farisaico de que esse dia não será entregue em suas mãos. Você se acostuma com os versículos bíblicos que exaltam a verdade e condenam a mentira, citados aos montes em sua timeline.
Há a ação dos ‘justiceiros’, que ainda mostra resquícios nas menções de falta de postes diante das injustiças. Você se acostuma a ver as imagens de pessoas amarradas como animais nesses postes, de sangue no asfalto, imagens de violência para pagar pela violência. Você se acostuma.
E agora a febre do momento é a indignação contra ideia que por muito tempo se manteve velada a respeito da culpabilidade das vítimas de estupro. Você se acostuma a pensar e a repetir o discurso, sem pensar em suas implicações, sem levar em conta o ser humano dentro de cada casca, você simplesmente se acostuma.
E o princípio atinge as camadas mais pessoais da minha vida, quando as pessoas fazem seus comentários preconceituosos do tipo ‘ela só quer aparecer’, ou ‘é bipolar’ após um comentário ou exposição de minha parte. Você se acostuma.
Você se acostuma a ser cobrado por coisas que não são fundamentais na vida, se acostuma a viver tentando suprir as expectativas da maioria, a trabalhar para preencher vazios cuja procedência nada nem ninguém consegue explicar.
Você se acostuma com a injustiça, com a falta de misericórdia, com dois pesos, duas medidas, se acostuma a procurar sempre uma explicação plausível prá tudo, sem levar em conta a singularidade do momento, das pessoas, das circunstâncias. É fácil se acostumar com bordões numa época como a nossa: “Deus me falou”, “eu profetizo na tua vida”, “tudo vai acabar bem”, “tudo coopera para o seu bem”, justificando nossos desejos, anseios, esperanças e o peso de nossa alma em palavras vazias de sentido, pois não expressam mais o mesmo de suas fontes.
E você se acostuma a receber tudo pronto, seja da TV, aula ou microondas, sem questionar o que se ouve nos púlpitos e palanques da vida. Você se acostuma a não ser compreendido e se cala, num mar de desilusão.
Hoje li que “Pior do que contar uma mentira é viver uma mentira” (Hermes Carvalho Fernandes), e fui repentinamente chacoalhada por dentro desse marasmo interior. Não quero e não vou me acostumar.
Não vou me acostumar a ser pau mandado, nem papagaio num mar de discursos desconexos. Não vou me acostumar a ser parasita religioso, sugando ideias, doutrinas, vida dos que bebem diretamente das fontes da salvação.
Não quero e não vou me acostumar com a injustiça, com os rótulos, com o descaso diante da desumanidade de quem pode e deve se posicionar. Não vou me acostumar a ser silenciada só porque acham que quero aparecer quando manifesto opinião, quando coloco minha posição ou decido me expor. Não sou vítima das situações, quero ser agente coerente e responsável, que olha o nu e decide agir em favor, não contra, que entende que a “ira do homem não opera a justiça de Deus” (Tiago 1:20).
Não vou me acostumar com cobranças inúteis que não me ajudam a melhorar, só acrescentam mais peso sobre meus ombros, um peso morto que não estou disposta a carregar.
Como se vê, nem sempre acordo com o melhor dos humores, e num dia pesado como este, em que meu corpo não responde tão rápido como eu desejaria, quando o cansaço decide mostrar sua verdadeira face, quando me sinto exausta de tentar dar tanta explicação, decido não me acostumar com nada disso, e melhor do que falar a verdade quero vivê-la, nem que prá isso eu tenha por companheiro um eterno desconforto.
Angela Natel
Crônicas de uma Divorciada - Abril de 2014

Sou ninguém

Sou ninguém
Em busca de sentido
De vida, de sangue vertido.
Sou ninguém.
A quem muitos buscam
Atrás de conselho, verdade,
Mas apenas encontram
Humanidade.
Olhos que veem o injusto
com capa de humildade
Fazendo-se deus
em nome de Deus.
Pés machucados das pedras que se lhe impuseram no caminho.
Pássaro fora do ninho.
Leão que ruge em derredor
Lobo voraz, Veado veloz.
Abraço de urso a me esmagar
Serpente atroz.
Mãos estendidas tentando ajudar
Não sou ninguém
Prá que se importar?
Dor que cala a voz da razão
Me ponho em chamas
Tal qual um dragão.
Uma guerra travada em meu coração
Ou ganho ou morro
Não há exceção.
Angela Natel

Para minha irmã Angelita, em seu aniversário:



Sua letra cravada 
em minha pele,
Memória de sangue
Levo onde vou.

Mãos dadas
Sempre segura
Cuidado bendito
Que me marcou.

Seus passos 
sempre tão firmes
Na mente eu vejo
A quem imitar.

Palavras ditas 
num tempo
Em que eu te olhava
a me ensinar.

Saudades sentimos
Dores trocadas
Ausência e falta
Outra vida viver.

Sempre, porém,
Quando tudo é escuro,
Posso, 
A você recorrer.

Irmã, amiga, 
Parte de mim
Que me chora 
Estando a sorrir.

Lado a lado vivemos
Onde estivermos
Ainda que doa
Ver-me partir.

Angela Natel - 26/12/2018

Quando o Natal é todo dia


Realmente temos alguma razão para tratar o Natal com tanta diferença de outras datas como estamos acostumados a fazer?
Será que temos bases suficientes para combater o consumismo nessa época e rebatermos qualquer mensagem ou personagem que tome o lugar da pessoa de Cristo no centro das celebrações natalinas?
Perguntas que me chegam à mente nestes dias que antecedem as comemorações de fim de ano, em meio ao trabalho, ao cansaço de um ano repleto de mudanças e muitas incertezas pela frente.
Como cristã, creio ser inútil defender uma mensagem de paz, esperança, luz, comunhão, perdão e salvação nessa época se não o fazemos durante todo o ano, no dia-a-dia, da mesma maneira que qualquer demonstração de preocupação para com a vida alheia num momento específico – seja num momento extremo ou apenas por causa de uma festa – enquanto se vive como se o outro não existisse no resto do tempo.
Outra questão é a atitude de reverência inusitada que surge por causa de uma data que - sabido dos que conhecem as Escrituras – não difere em nada das demais. Entendo o valor da cultura e da tradição, principalmente como metodologia de ensino, porém não deixa de parecer hipocrisia tentar corrigir a reverência do outro mesmo que isso possa ferí-lo ou afastá-lo. Muito se fala em nome da verdade sem que haja compreensão e sensibilidade, porém o que se vê é pouco de Cristo nas atitudes que se mostram.
Com isso, quero te convidar a refletir comigo sobre a pessoa de Jesus Cristo, a razão de nossa existência e trabalho, por quem vivemos, a quem dobramos todas as certezas que podemos obter. Cristo, o autor e consumador de nossa fé, a razão de estarmos onde estamos, de recebermos de Deus a graça e a misericórdia de que necessitamos.
E essa graça e misericórdia é o que precisamos viver e compartilhar todos os dias do ano, em cada palavra, mensagem e atitude. Cristo, ao andar por essa terra, olhava para as pessoas e transmitia mais do que uma mensagem: Ele era a mensagem, a aceitação de Deus, o olhar de misericórdia, a vida que poderia saciar a sede de todo e qualquer que dEle se aproximasse.  Que desafio ser como Cristo!
De que vale o trabalho, o ministério, a empatia, o serviço, se o trato com o outro não reflete a mão estendida de Cristo? Que mérito uma grande obra pode trazer, que alegria a realização de um grande ministério pode gerar se não poderia estar mais distante da imagem de Cristo que precisamos refletir?
É por isso que mais uma vez desejo me aquietar nestes dias de tanta agitação, e escolho olhar para Jesus, de quem procedem as fontes da vida eterna, para dEle receber a compreensão, o alívio e o descanso de que tanto necessito. Olho para Jesus e sou salva, salva de mim mesma, de minhas decepções, das rejeições e tristezas que me acometeram durante o ano, dos erros e impotências que inevitavelmente afloraram em minha caminhada.
É por isso que não consigo boicotar Papai Noel, principalmente porque tenho consciência de que de forma alguma ele poderia ser uma ameaça ao centro da mensagem do evangelho, que é a pessoa de Jesus Cristo. Não é possível tal competição, não há o que possa ofuscar Sua verdadeira obra em nossa vida, obra tal que pode ser percebida todos os dias do ano, e não apenas em dezembro.
Que privilégio não estarmos presos a um calendário para podermos viver e refletir tão preciosa salvação! Que Jesus Cristo continue sendo engrandecido, seja em nossa vida, seja em nossa morte, em meio a alegrias e sofrimentos, com dúvidas ou certezas, e que aqueles que nos cercam percebam Sua vida, atitudes e presença todos os dias do ano em nós, para a glória única e exclusiva de Deus.
Feliz Natal, queridos!

Angela Natel

O Reino de Deus está próximo! - 4o Domingo de Advento


Este é o quarto domingo de advento, momento para refletirmos sobre a manifestação do Reino de Deus.
O Reino de Deus tem um aspecto interessante: o já e o ainda não. Para nós, isso significa que o Reino de Deus já chegou a nós por meio da vinda de Jesus ao mundo, sua morte e ressurreição. Entretanto, este Reino não está completamente manifesto, o que só ocorrerá em Seu retorno a este mundo, no fim dos tempos.
Mas, uma coisa me chama a atenção quando aparece, na Bíblia, a expressão 'o Reino de Deus está próximo'. No sentido do texto grego, língua na qual ele foi originalmente escrito, este próximo não se refere à dimensão temporal, mas geográfica. Isso quer dizer que o importante não é o quando, mas o onde - não quando as coisas vão acontecer, mas onde elas acontecem.
O Reino de Deus não está longe de nós, inacessível, não é limitado a fronteiras geográficas, muros, barreiras, cercas de arame farpado. O Reino de Deus está dentro de nós.
Nesta vida, podemos perder tudo: nossa reputação, nossos entes queridos, nosso sutento, nossos bens, mas o Reino de Deus não pode ser arrancado de dentro de nós. Este Reino se manifesta automaticamente onde Jesus está, onde Ele decide, onde Ele é reconhecido, engrandecido e imitado.
Assim, independentemente de nossas emoções, sensações e desejos, o Reino de Deus, que não pertence a nenhum partido político, nenhuma denominação, a nenhuma teologia, se manifesta e está pronto a mostrar seus sinais onde muitos menos esperam, em lugares à margem da sociedade, naqueles que, muitas vezes, são julgados impróprios, deslocados, inadequados à nossa régua moral e estética.
Para nosso descanso, todas as condenações terminam onde o Reino de Deus é estabelecido, pois Seu julgamento sobre nós é amor!



"Pois o Filho do homem veio buscar e salvar o que estava perdido." - Lucas 19:10 - NVI


Demonizar cultura

Samba, forró e funk
Demonizar certos estilos musicais
Dizer-se escandalizado
Seria algo esperado
Dos pelo texto identificados 
como "fracos na fé".
Mas são os cães de guarda da religião
Que se prezam a esse papelão
Proibindo pela própria conveniência
E julgando pela aparência.
Não me calo nem vou concordar
Que em nome de Deus
Se usem meias verdades,
Dois pesos e duas medidas
E por ignorância se espalhe
Que isso é ser cristão.
Censurar parte de uma cultura
Tratar com generalidades
Não tem relação alguma
Com a pessoa de Cristo,
Mas só evidencia vaidades.
Se é maduro e bem estudado
Não finja desconhecimento
Não use o nome de Deus para defender preferências pessoais
Não seja dissimulado
Como se todas as teologias
fossem redondamente iguais.
Angela Natel

Bethlehemian Rhapsody (with lyrics)

Algumas das lições que (re)aprendi em 2018:


1. Bandido bom não é bandido morto. Cada um de nós carrega o potencial criminoso, uma vez que nascemos com uma natureza corrupta e destinada à destruição. Bandido bom é aquele a quem é dada a chance e as condições para uma nova vida.
2. De nada vale estar em um “ministério” ou posição de influência, se não trato com respeito e dignidade a todos os que me cercam ou tenho contato.
3. Ninguém precisa de minha esmola. Dar do que me sobra não faz de mim uma pessoa melhor – só revela a ganância que habita em mim. O verdadeiro sacrifício é repartir do que tenho, mesmo que não me sobre. Uma atitude assim me ensina que somos todos iguais e carentes da mesma graça.
4. Ao proferir condenação a outro coloco-me em posição superior e reconheço que meus erros e pecados são de menor valor. Isso deflagra uma atitude hipócrita e moralista de quem vê o cisco do olho alheio sem se importar com a própria trave.
5. Convivo com a tentação de, caso erre, culpar o diabo e, caso acerte, dizer que foi Deus. Com isso, acabo não assumindo responsabilidade sobre meus atos, muito menos sobre suas consequências. Além disso, corro o sério risco de não reconhecer a ação de Deus por trás de toda e qualquer situação, inclusive das que me fazem sofrer.
6. Tenho a tendência de emitir julgamento a respeito de qualquer coisa sem refletir sobre as complexidades da vida e do ser humano. Isso pode causar distanciamento das pessoas com as quais posso aprender e a quem posso ajudar e servir. Lidar com situações de forma generalizada me tira da realidade e me faz exigir dos outros o que não podem oferecer.
7. Educação sem pensamento crítico é adestramento. Ensinar não é dar respostas prontas, mas caminhar junto e trocar vida e experiência.
8. Lidar com as questões da vida em termos de bem e mal, numa polarização extrema, é ignorar a própria vida e Aquele que é o verdadeiro protagonista dela em todas as suas dimensões.
9. Sempre procurarei um bode expiatório, um elemento que chamarei de “mau” para culpar por aquilo que considero a causa de meu sofrimento no momento. Isso é uma atitude natural a cada um de nós, o que não a justifica.
10. Vivemos em busca de heróis, salvadores da Pátria, pessoas que encarnem a libertação de nossos problemas. Isso porque possivelmente nosso inconsciente tente nos avisar dessa maneira o quanto somos impotentes diante dos desafios da vida. Entretanto, nenhuma pessoa neste mundo poderá encarnar a salvação de que realmente necessitamos, uma vez que isso já foi realizado há mais de dois mil anos atrás. Expectativas demais sobre qualquer outra pessoa nesse sentido só trarão inevitáveis frustrações e podem sobrecarregar quem for seu alvo.
11. Rótulos, estigmas e comparações são extremamente nocivos a qualquer pessoa. Nenhum nome, rótulo, designação é capaz de representar adequada e completamente a complexidade humana.
12. Somos todos iguais, independentemente de nossa condição, qualquer que seja. Privilégios podem ser agradáveis para quem os recebe, mas causam mais mal do que bem.
13. Não, não há oportunidades iguais para as mulheres, e isso sinto na pele, seja como linguista, teóloga, professora, escritora ou qualquer outra função que ocupe, em qualquer lugar. Títulos falam alto, mas se um homem tiver um título terá a preferência (e às vezes terá a preferência mesmo sem titulo, apenas por ser homem). Para conquistar um espaço sem ser indicado por alguém já consagrado, as mulheres precisam ralar muito mais do que os homens.
14. Caso alguém confesse que tem alguma doença mental (transtornos, psicoses, etc), mesmo sendo tratado e em perfeitas condições de trabalho, será discriminado, não importa a instituição.
15. Um evangelho que não tenha como referência a pessoa de Jesus Cristo é falso. Doutrinas e ritos ou qualquer manifestação religiosa não substitui a pessoa de Cristo, Sua obra e referência.
16. A indústria da moda (vestuário, em sua maioria) não está preocupada em atender adequadamente pessoas que não se encaixem no padrão de beleza instituído culturalmente. Por isso não me importo de preferir roupas e calçados masculinos quando estes atendem ao meu tamanho e preferência.
17. Não existe ‘chamado missionário’. A responsabilidade em participar da Missão de Deus em revelar a pessoa de Jesus ao mundo é de todo cristão, da Igreja como um todo. Não é possível terceirizar o trabalho missionário me contentando em orar por missões ou sustentar financeiramente algum missionário sem fugir dessa responsabilidade que é de cada um de nós.
18. Prefiro morrer do que matar. Nesse sentido, não consigo, por respeito à minha própria consciência, concordar com o porte de armas ou seu uso. Ainda tenho dificuldades em conciliar a ideia de ser cristã e apoiar o uso de armas, porém reconheço que sou limitada, mas assim como respeito quem pensa diferente, espero que respeitem meu pensamento também.
19. Definitivamente, a gente não colhe o que planta. Conhecendo-me como me conheço sei do que sou capaz e do que já pensei, falei ou fiz nesta vida. Minha consciência (de que o que todos os seres humanos naturalmente merecem seja o inferno) não me permite entender que qualquer coisa boa que me sobrevenha eu tenha sido capaz de gerar por mim mesma. Entendo também que o texto bíblico utilizado de forma generalizada para embasar a ideia de que colhemos o que plantamos tem sido interpretado fora de seu contexto e de maneira equivocada por muitos. Assim, entendo que tudo o que é bom e/ou proveitoso é resultado única e exclusivamente da graça de Deus sobre nós.
20. Corremos o risco de tentar gerenciar a obra e a missão de Deus. Isso quando tentamos controlar o que e como Deus faz as coisas na vida de outras pessoas, também na tentativa de reproduzirmos o que nos acontece em outrem. Porém isso pode cegar nosso entendimento quanto à multiforme graça de Deus e o tratar personalizado na vida de cada um. Ao tentar determinar como e quando as pessoas devem agir em sua vida diária em seu ministério, tento me colocar no lugar de Deus ou como gerente de Sua ação. Nesse sentido, ainda que justifiquemos que estamos cuidando uns dos outros, a linha tênue entre cuidado e controle pode ser ultrapassada, causando um grande equívoco em nossa verdadeira vocação e podendo arruinar e oprimir a vida de outras pessoas.
21. Discordar não significa não saber ser contrariado.
22. Nenhuma autoridade está acima da lei.
23. É muito perigoso quando confundo Deus com Organizações, Instituições, CNPJ, prédios, estatutos ou partidos políticos. Acabo me colocando em defesa do indefensável, a despeito do que fui realmente chamada a fazer e a quem devo servir.
24. Não temos autorização para usar o nome de Deus para fins politico-partidários. Usar Deus como justificativa de uso de poder de uns sobre outros é característica do Anticristo e seu anti-Reino.
Puxa! 2018 foi um ano de muitas lições. Com certeza ainda tenho muito a aprender. Talvez eu mude de ideia, talvez não. O mais importante é não ficar parado, buscar o aprendizado, nunca deixar de caminhar.
Tenham um feliz fim de ano!
Grande abraço
Angela Natel

Motivo de escândalo



A roupa
A maquiagem
O trejeito
O palavrão.
Motivos de sobra
Para comentário
E pedidos de satisfação.
Mas o que me é motivo de escândalo
Não é nada disso, não.
Mas sim crente que se põe no lugar de Deus
Que distribui condenação.
Me escandalizo com fofoca e maledicência
Com gente duas caras, que não me conhece
E se acha no direito de exigir algo de mim.
Me escandalizo por usarem textos bíblicos
Com o fim de controlar comportamento alheio
Com tradutor que não sabe interpretar texto na própria língua.
Com consultor que manipula o texto em sua própria teologia.
Sim, é motivo de escândalo quem prega o amor
Mas vive distribuindo coice no dia-a-dia,
Quem julga por um palavrão mas não percebe o desserviço que faz, porque se atém na exterioridade, sem buscar o coração.
Sim, estou escandalizada
Por quem me lê somente através das redes sociais
E que somente por isso se acha capaz de distinguir o bem do mal que há em mim.
Se o texto bíblico dissesse o que muitos dizem por aí, então todos estes que me escandalizaram condenados estão.
Acima de uma instituição, olho para Cristo
Que não julga como os demais
Não põe etiqueta de acordo com o comportamento
Mas estende a todos Sua misericordiosa mão.

Angela Natel

Incomparável



Dor não se compara
comparação mata
morrer de dor
morrer de amor
morte,
incomparável dor.

Sofrimento alheio
não ameniza minha dor
não a torna melhor ou pior
ninguém sofre comigo
ninguém vive minha dor
só comparam com outras dores.

Vingança não é justiça
uma dor não ameniza a outra
um mal não cobre outro
ninguém paga por ninguém
nada se justifica a si mesmo.

Dor incomparável
dor sem igual
porque é minha,
só eu sei como ela é
porque está em minha pele
em meu interior.

Sofrimento do outro não me dói
por isso amenizo
ignoro, sou omisso
comparo com o que considero pior
não choro junto
não sou compassivo
porque não sinto sua dor.

assim me justifico
no injustificável
não calço outras sandálias
que não sejam minhas
que não me identificam.

Dor incomparável
daquele que sentiu a dor do outro
e se esvaziou de si mesmo
não comparou, sentiu
a dor de ser o outro
e assim justificou a todos.

Angela Natel

Realmente tentando não ser feio



Nós vivemos em um tempo feio. É assim que eu vejo, assim mesmo. O racismo está em ascensão, a xenofobia está em voga e a misericórdia anda pela prancha. As crianças são presas, os jornalistas são desmembrados e a raiva é total. É um momento feio. Então estou tentando não ser feio. Mas não é fácil. Ser feio a respeito de toda a feiura é fácil. É claro que quando insiro minha própria feiura na briga eu não a chamo de feia, eu a chamo de certa. Digo a mim mesmo que minha raiva é como o Cristo que vira a mesa no templo. Mas nos meus momentos mais contemplativos, tenho que admitir que na maioria das vezes a minha raiva é mais como o fato de Pedro cortar uma orelha do que a limpeza do templo por Jesus. Só porque Jesus fez algo não significa que eu deveria tentar fazer isso. Afinal, Jesus andou sobre a água também.
Então, quero resistir à feiura, não sendo feio, não furioso, não insultando os que são apanhados pela feiura mimética, mas sendo algo diferente. O que estou dizendo é que eu quero tentar ser bonito. Não estou certo de que sou chamado a imitar a Cristo em sua ira, mas sei que sou chamado a imitar a Cristo na cruz. É a forma cruciforme que é a forma definitiva da beleza cristã. A crucificação é feia a menos que imitemos a Cristo e oremos: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”. Essa é a beleza que salva o mundo.
Na cruz, o pecado do mundo se uniu a uma monstruosa singularidade de deicídio - o assassinato de Deus. Mas Deus em Cristo absorveu a singularidade do pecado e perdoou o mundo. É por isso que descrevemos a crucificação em termos de beleza artística. Sexta-feira Santa foi simultaneamente o momento mais feio e o momento mais lindo da história. O bode expiatório, a zombaria, a crueldade, a barbárie, a violência eram todos feios. Mas a feiura foi superada pela beleza de Jesus perdoando tudo. Na colisão da feiura humana e da beleza divina, a beleza vence. A beleza salvará o mundo.
Talvez você seja confiável para exercer a raiva com justiça, mas tenho certeza que não posso. Minha raiva provavelmente fará pouco mais do que aumentar a feiura. Então, ao tentar não ser feio, preciso escolher uma postura de compaixão. Não quero dizer um quietismo ou uma passividade que evite o confronto profético, mas quero dizer um confronto profético que vem de um lugar de amor genuíno por todos - amor não apenas pelas vítimas, mas também pelos algozes. Sim, isso é difícil; mas quando decidimos que alguns pecadores são indignos de ser amados, nos colocamos ao lado da multidão contra Cristo. O fenômeno do satanás pode operar tão diabolicamente entre aqueles que estão do lado direito da questão.
Quando a multidão de fariseus cruéis estava pronta para apedrejar a mulher apanhada em adultério, Jesus não incitou uma multidão justa a apedrejar a multidão cruel - é assim que o satanás vence. O que Jesus fez foi quebrar o feitiço da multidão com um chamado à autorreflexão individual.
“Disse-lhes Jesus: 'Quem dentre vós que estiver sem pecado seja o primeiro a atirar nela uma pedra'… Quando ouviram isto, foram-se um por um, começando pelos anciãos” (João 8: 7, 9)
Esta é uma bela história porque Jesus tirou a feiura da multidão. Eles vieram como uma turba sedenta de sangue, mas se dispersaram como indivíduos contemplando seu próprio pecado. Raiva, não importa o quão justificada, não poderia ter feito isso. A multidão pronta para apedrejar a mulher sabia que eles estavam certos - eles tinham versículos bíblicos para provar isso. E tenho certeza de que Jesus poderia ter reunido uma segunda multidão que sabia que eles estavam certos em apedrejar a primeira multidão. (Nós nunca somos mais hipócritas do que quando estamos atacando os hipócritas.) Mas jogar pedras em atiradores de pedras não é o caminho de Jesus, porque não é o caminho do amor. Jesus não estava apenas tentando salvar a mulher apanhada em adultério de ser apedrejada, Jesus também estava tentando salvar os indivíduos apanhados no mimeses satânico da multidão. A ira justa teria terminado com a feiura de alguém ser apedrejado. Mas Jesus salvou todos os envolvidos através de atos de contemplação e perdão. Isso é lindo. E esta é a beleza que eu quero tentar imitar.
Nós não podemos nos impedir de imitar os outros - nós somos moldados para mimesis. O que podemos fazer é escolher quem imitar. Em vez de imitar os enraivecidos - que podem muito bem estar certos sobre o que estão furiosos - eu quero imitar a Jesus que, de uma maneira bonita, desarmou uma multidão e perdoou um pecador.
Eu vou fazer um esforço concentrado para evitar a perpetuação da raiva. Eu vou dar mais tempo para oração contemplativa e longas caminhadas em lugares tranquilos. Eu vou ler mais Thomas Merton. Acho que vou desistir de artigos de opinião para a Quaresma. Eu realmente quero desistir da raiva. Eu quero tentar me tornar um sábio. Isso provavelmente parece pretensioso, mas é exatamente o que eu aspiro humildemente a desejar. Quando me aproximo dos sessenta, posso pelo menos tentar me tornar um sábio. O que mais eu vou fazer? Como o poeta francês Charles Péguy disse: "Há apenas uma tragédia no final: não ter sido um santo".
Então estou tentando.
Eu estou tentando não ser feio.
Eu quero viver uma vida mais bonita.
Eu sei que não posso confiar em mim mesmo com raiva.
Na beira dos sessenta, quero tentar me tornar um sábio.
Se você pensar nisso, ore por mim.

Brian Zahnd
Arte de John Martin Borg.

https://brianzahnd.com/2018/12/trying-hard-not-ugly/#more-6592
acessado em 18/12/2018 às 13:32h

Tradução de Angela Natel

Caminho

Pelo caminho encontro
os que pregam amor e não amam,
os que desejam liberdade oprimindo outros,
os que se dizem servos, amantes do poder,
os que ganham o mundo mas perdem a própria alma.

Vendilhões do Templo,
vendidos em sua própria consciência,
supervalorizam o externo, a aparência
em detrimento do princípio, do coração.

Os que se colocam como deuses do alheio,
mandando sobre o que não lhes pertence,
não abertos a negociação.

Enxergam no outro o que apodrece sua alma,
delimitam o tamanho e os limites de Deus.
Reconhecem o divino somente no espelho de si mesmos,
os que se veem detentores da última palavra.

Sim, encontro os que se recusam a perder
principalmente numa discussão,
que não se calam, não se aquietam,
até provarem seu ponto, sua razão.

Encontro também os sem voz,
que, no afã de serem ouvidos, agridem, machucam,
e de oprimidos passam a oprimir.
São muitos ternos e máscaras,
fachadas que cobrem a podridão de caráter.

Algumas vezes me encontro com um desses
e, depois de horas analisando a figura
percebo o detalhe, a luz refletida no espelho
bem diante de meu nariz.

Por isso, frequentemente me calo,
distinguindo em mim o que tanto condeno.
Por isso é melhor aquietar-se.
E se permitir assumir o erro, calar a condenação,
assumindo que não sou Deus, não sou ninguém.

Angela Natel

Amizade verdadeira



Como ter certeza de que se encontrou um amigo verdadeiro?
Vale a pena a reflexão.
De que maneira entenderei que posso confiar
E encontrar apoio e compreensão?

Como saber se o cuidado não é tentativa de controle
E me sentir livre ao me expressar?
De que forma sei que não serei de primeira condenada
Ao me despir das máscaras de verdadeiramente me mostrar?

Como falar do que me inquieta
Sem ser de cara rechaçada?
Como compartilhar coisas que amo
E ainda ser incentivada?

E, ao trabalhar, será que serei respeitada
Em meu silêncio e necessidade de isolamento?
Será que preciso o tempo todo ser disponibilizada
e ter que concordar em qualquer momento?

Amigos verdadeiros são raros de encontrar
Mesmo que alguns pensem que não.
Quem acha ser amigo precisa, então, pensar
Se reclamam de tudo mas exigem aceitação.

Por isso o que penso ser um amigo de verdade
Gira em torno de muito respeito
Um apreciar do outro a singularidade
E não impor-se do seu modo e do seu jeito.

Nesse sentido, cada um tem seu limite
De tempo, espaço e emoções
Cada um busca alguém que o abrigue
Diferentes, porém companheiros corações.

Angela Natel

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O que me resta

E, no mais, o que me resta nessa vida?
Uma ferida curada, uma máscara caída.

O chão roto de manchas de sangue
do dedo dilacerado em ansiedade.

Não me sobrou muito além do verniz na cara, brilhando em vaidade.

A pergunta que sobe n'alma, medo, desgosto, da infância o trauma.

A dor que a pressão me traz
e a tentativa de controlar minha vida arregaça.

O que me sobrou? Só um pouco.
O resto do lixo de minha emoção vacilante, inconstante.

De quando tudo é vivido à flor da pele.
Sangue, lágrimas, suor, excremento.
Tudo vivido, jogado na cara.

Depois disso, além disso, não me sobra nada. Sou negativada em meu interior.

Menos que nada: o não ser, reprovada.
Vacilando em respostas, tropeçando nas mesmas pedras.

Errando toda vez que ergo os olhos em busca de aprovação.

Uma história contada ao vento
que, no fim, dá em nada.

Mudança que houve com o tempo,
um sonhar acordada.

Para, então, descobrir que o tempo não existe, que a vida passa, e o que sobrou...
foi nada.

Angela Natel

Qual o seu partido? (A Missão Real)


Qual o seu partido?
Seu lado, sua tendência, sua pendência?
Nessa nossa luta dialética de cada dia
Interagindo nas redes, nas relações
Mostramos nossa verdadeira face
Antes oculta sob as máscaras da conveniência.

Então, qual o seu partido?
Seu lado – o que determina suas escolhas e discursos?
É Batista? Presbiteriano? Anabatista? Luterano?
Sim, qual o seu partido?
Já que estes, há muito, deixaram de seguir o original plano.

Como bons brasileiros seguimos deslumbrados
Com tudo o que procede dos Estados Unidos da América
E como bons seguidores pisamos no mesmo caminho
Levantando bandeiras,
Transformando nossos clubes/igrejas em sedes partidárias
Aonde servimos uma mensagem não acessível a todos.

Evangelho? Qual deles?
O da Bíblia mal interpretada, o da bala para quem não se encaixa,
Ou o que serve ao interesse de alguns?
A escolha é livre, o choro também.

E como os irmãos do Norte,
seguimos defendendo e repetindo discurso alheio,
adestrados por porta vozes vendidos,
prostituídos em sua missão.

A bancada evangélica tem muitos representantes
espalhados pelas esquinas e organizações do país.
Segue em seu grito alucinante
De que é preciso sempre ganhar
Desumanizar e até matar
Para ser feliz.

De que partido você é?
Batista, Presbiteriano, Anabatista, Luterano?
Na missão real há rostos, etnias, diferença,
não bandeiras nacionais - representações das conquistas coloniais.
Porque na missão real não há espaço para triunfalismo,
não há chance para partidarismos denominacionais.

Entretanto, se você não se conformar
Ao padrão desses partidos
Nem se encaixar na visão desses gritos
Então enxergará a missão real que se nos foi apresentada.

Fácil é emitirem veredictos a respeito
Dos que se engajam nessa missão
sem contexto, sem conhecimento de causa.
Encaixotando Deus e seus servos
na imagem criada sistematicamente em suas mentes e liturgia.

Na missão real você chora, ri, lamenta, reclama,
porque é feito de carne e osso, não de ferro.
Alguns missionários já tentaram suicídio, outros conseguiram,
enquanto os autodenominados cristãos devoram-se uns aos outros
por causa de seus posicionamentos, de seu partidarismo
e de seu evangelho, que não é para todos.

Muitas das vezes, na missão real,
você tomará decisões sem muita convicção
de que está fazendo a coisa certa.
Porque na missão real não há espaço para triunfalismo,
não há chance para partidarismos denominacionais.
Nem tudo é preto e branco, fácil de distinguir.

Na missão real há lágrimas, tristeza,
decepção e dúvida,
já que todas as certezas encontram-se na verdade relacional.

E a verdade?
A verdade é uma pessoa,
não uma ideia a ser defendida com unhas e dentes.
A verdade é testemunhada na missão,
não provada com argumentos e ódio.

É por isso que na missão real
Se tem consciência das limitações,
É um aprendizado e constante, diária correção.
Por isso não é mau mudar de ideia,
parar um pouco, confessar.
Faz bem, faz jus ao nome de cristão.

Mas o que se vê hoje em dia é o avesso da real missão:
máscaras por todo lado,
vida colocada numa balança para ver se é digna de viver
Missionários encaixotados, podados, chantageados
- caso não se encaixem, só tem a perder.

Angela Natel 

Olhe para mim

Olhe para mim
Me enxergue.
Será que, por não depilar minhas pernas
Sou feminista?
Transformista?
Lésbica?
Rebelde?
Desleixada?
Roqueira?
Ou apenas alguém que decidiu não se depilar, independentemente de suas razões?
Você realmente precisa me dar um rótulo?
Precisa tanto colocar legendas em minhas imagens?
Por que não apenas olhar e, de fato, enxergar?
Se mudei o cabelo ou
Se minha pele é tatuada,
Isso precisa significar algo para você?
Por que, em sua mente, não continuo sendo a mesma pessoa?
Não olhe, apenas, enxergue!

Angela Natel

P.S.: Fui indagada por algumas pessoas a respeito de meu corte e cor de cabelo e tatuagens: o porquê.

Interessante é que as pessoas que me questionam a esse respeito, mesmo ouvindo falar de mim há muito tempo nunca antes tiveram a oportunidade de me dirigir a palavra. Ou seja: Só por ouvir falar, supõe-se conhecer? Supõe-se entender as razões?

Então me pergunto: a cor de meu cabelo, seu comprimento, as tatuagens e brincos possuem um único significado possível? As caixinhas na mente das pessoas são tão sólidas que as tornam incapazes de olhar sem, antes, fazer suposições?

A imagem te incomoda?




Pois é exatamente isso que a Igreja espera de seus obreiros, e espera de seus missionários, senão eles até podem perder o sustento!
Dá para acreditar?

Se você faz um trabalho voluntário intercultural
e não divulga uma imagem em que você pareça a solução para aquele grupo, o "salvador estrangeiro", é como se não prestasse contas do dinheiro recebido para o trabalho.

Então, parece que o missionário/voluntário é constrangido a produzir esse tipo de imagem, esse tipo de agressão àqueles que são o alvo de seu serviço.

Trata-se de uma cultura criada sem se pensar nas implicações: quando se expõe o outro em benefício próprio, quando se fotografa sem pedir permissão, quando o missionário/voluntário se coloca numa posição de superioridade em relação ao outro, simplesmente com a justificativa de prestação de contas aos financiadores de um projeto, ou de arrecadação financeira para manutenção do mesmo - ou, pior, apenas para própria sobrevivência.

Sim, porque se o resultado não é visível, aquilo que mantenedores/financiadores esperam, de acordo com os moldes esperados, corre-se o risco de ser deixado de lado e até a perda da própria subsistência.
Já fiz muito disso em minha vida e trabalho. Hoje percebo com um pouco mais de clareza essas questões... me arrependo, reflito, tento corrigir.
Ainda há um longo caminho ao repensarmos nosso serviço ao próximo, tanto na maneira como nos vemos quanto na forma como decidimos servir.

Situação ainda incômoda?
Que tal refletirmos sobre isso em nossas comunidades, falarmos abertamente sobre isso, buscarmos juntos melhores maneiras de sermos como Jesus em nossa vida e serviço, sem exposição do outro, sem parecermos melhores que ninguém, sem condicionarmos nosso engajamento a uma maneira única e fechada de prestação de contas?

Vamos juntos nessa?

Angela Natel
Reflexão inspirada em comentário de Cleber Sá Dos Santos à imagem - obrigada!
10/01/2018

X-MEN: missionário/voluntário



Apesar de estar envolvida no trabalho missionário/voluntário há mais de 20 anos, ainda encontro-me aprendendo a respeito de nossos limites.
E se repito o discurso sobre meus limites, é porque ainda se faz necessária tal repetição.
Ainda se ignora a humanidade do missionário/voluntário.
Ainda ele é tido por super-herói, inumano, mutante, feito única e exclusivamente para oferecer-se a si mesmo e o que tem a outros, indiscriminadamente.
E eis que este ser se torna incômodo quando pede ajuda voluntária e financeira para seu sustento, quando faz campanhas, quando pede para si.
Porque pedir ajuda e mostrar limitações descaracteriza este ser mutante, feito para servir e se desgastar. Dizer ‘não’ é algo impensável em sua realidade, por isso assusta, e até escandaliza.
E é por isso que tenho encontrado, nesses anos todos de caminhada, vários missionários/voluntários que me impedem de publicar suas fotos em um momento de alegria, descanso ou diversão, com medo de perder seu sustento, seus apoiadores, qualquer ajuda financeira.
Não, porque ao missionário/voluntário não é permitido descansar, se divertir, muito menos às custas dos outros. Seria um abuso.
Talvez seja por isso essa constante incerteza e insegurança em que me encontro atualmente na vida. Durante 11 meses no ano realizo um trabalho missionário/voluntário, sem qualquer expectativa de retorno. Porém, quando tenho a oportunidade, não escondo um momento de descanso, diversão, renovo de forças. Assim, somente aqueles que de fato compreendem todas as implicações dessa vida de missionário/voluntário é que se engajam em apoiar-me e ajudar em meu sustento. E, por isso, posso dizer: são muito poucos os que compreendem.
Até mesmo este texto, que agora escrevo, implica em risco de perda de apoiadores, perda de sustento financeiro, perda de empatia para com meu trabalho e o que tenho a oferecer. Entretanto, se o escrevo, não é pensando em mim, mas nas próximas gerações de missionários/voluntários.
E, com tristeza, ainda afirmo: nem dentro das agências missionárias há essa compreensão. Temos nossas funções, um lugar para repousar a cabeça. Mas, caso digamos ‘não’ para alguém ou alguma atividade, somos tentados a nos sentirmos culpados e até indagados a dar explicações.
Não nos é permitido o descanso, seja no campo, seja na base - isso seria impensável. Alguns, com posição de maior responsabilidade, com cargos de maior reconhecimento, até podem se dar ao luxo de tirar um mês de férias. Mas sem esse reconhecimento, uma semana sem atender às demandas da missão seria abuso.
Não, o missionário/voluntário é tratado de acordo com sua produtividade, é um ser-máquina que, quando der problema, deverá ser trocado por outro que melhor atenda às necessidades de onde serve. Deve ceder sua casa, caso não seja sua, deve ceder seu posto a alguém que atenda à demanda.
Não, não pode se dar ao luxo de postar uma foto se divertindo, não pode recusar uma atividade que o desgaste, precisa seguir o fluxo do que é considerado normalidade, e precisa sempre enviar relatórios de sua produtividade e dar explicações de suas impossibilidades.
Não, o missionário/voluntário não é humano. Deve ser esperado dele sempre o maior rendimento, exigido dele até que se manifeste em seu limite.
E este ser é descaracterizado quando se torna parte de uma instituição missionária/voluntária. Perde sua identidade individual e a ele não é permitido manifestar-se sem que esteja dentro dos padrões da referida instituição.
Não, não é uma pessoa – é um missionário/voluntário.

Angela Natel

Coliseu



Tantos apertos de um lado e do outro
Gritos alvoroçados
Muitos se espremem para ver o espetáculo
Ansiosos e hipnotizados.

Suor que escorre pelos rostos
Todo desconforto vale a pena
Não importa a fome que massacra o corpo
Contanto que eletrizante seja a cena.

Então os tambores soam, impetuosos
Arrepio que corre a pele toda
Tremores chacoalham os corpos
Sob o escaldante sol a trompa soa.

Entram eles, espetáculo público,
Todos os que consideramos a escória da humanidade:
Os falhos, inferiores, os que nos decepcionam de súbito
Os subordinados, os vis, os que traem lealdade.

Sim, o massacre vai começar
E as feras são, devidamente, soltas,
Exposição pública, flagelo, palavras ao ar,
E muitas formas de violência para serem servidas estão prontas.

A laceração do outro excita
E traz satisfação
A posição de juiz é atraente e evita
Que sejamos o alvo da humilhação.

Assim esquecemos a fome
A injustiça e nossa própria responsabilidade.
Damos para cada demônio um nome
E tratamos tudo com leviandade.

Dessa forma, nos justificamos a nós mesmos
E endeusamos nosso comportamento
Jogamos todas as palavras torpes que temos
A fim de produzir um belo julgamento.

Ao ignorar que podemos estar errados
Celebramos um belo espetáculo
De carne, sangue, pele e vísceras no tablado
De nosso santo tabernáculo.

Angela Natel

Segundo Domingo de Advento


Hoje é o Segundo Domingo de Advento, um ótimo momento para refletirmos sobre onde temos depositado nossas expectativas.
No contexto onde estamos inseridos, é muito fácil sermos levados pela decepção, desânimo e vivermos sob o estigma da frustração.
Entretanto, é necessário que façamos um balanço do que tem nos movido. Nossas motivações revelam, por si só, os valores que regem a vida, e nossas decepções apontam para o alvo de nossa esperança maior.
Por isso, é preciso lembrar que todos somos falhos, não há um justo sequer, todos erramos. Colocar a esperança na segurança dos bens, do dinheiro, em quem admiramos, pessoas de destaque, 'salvadores da pátria',  autoproclamados profetas, pastores, políticos, familiares e amigos, por mais que tenham conquistado nosso apreço, só nos trará uma vida de constantes amarguras.
Que nesse segundo domingo de Advento, lembremos de colocar nossas expectativas na vida e palavras de Jesus, que não veio para condenar nem ser servido, mas para salvar e dar a vida por todas as pessoas, sem exceções.
Que sejamos ajustados em nossas expectativas, tranquilizados em nossas angústias, e que voltemos nossos olhos para o único que pode aliviar o pesado fardo de viver num mundo de tanto pesar.
Um abençoado domingo de Advento a todos!
Angela Natel


Palavras de Avivamento



Ore contra a corrupção
Pela intervenção divina,
Mas não seja corrupto
Nem injusto no seu dia a dia.

Lute contra a injustiça
Mas não pegue os nomes de pecados
Que pessoas cometem
E diga que são nomes de demônios,
A Bíblia não ensina isso.

Viva e ensine as pessoas
A se responsabilizarem por seus atos.
Lutar contra a corrupção
É ser honesto e denunciar o erro
Não esbofetear demônio.

Levante-se, defenda as causas
Que Jesus defenderia
Ele mesmo não precisa da sua defesa.
Olhe para as pessoas como Jesus olharia
Isso é, por demais, subversivo.

Jesus não forçou ninguém a seguir sua cartilha,
Nem institucionalizou o cristianismo.
Ele não obrigou que as escolas falassem dele
Ou somente o que lhe agradavam.

Ele defendeu os marginalizados
Deu acesso a quem os religiosos ignoravam.
Sim, na maioria das vezes,
Jesus fez o que não costumamos fazer,
Sua pauta era bem diferente da nossa.

Na vida, passo a passo,
Foi acessível, pessoal,
Revelando o Pai em sua vida
E estabelecendo Seu Reino.

Um Reino que não compactua com o Estado
Nem com os sistemas criados pelas pessoas
Muito menos com as instituições.
Um Reino que se manifesta sem precisar pagar aluguel
Que impede os justiceiros de apedrejarem pecadores
E que, através do sacrifício, serve e ama até o fim.

Angela Natel

Generalidades



Nem toda pessoa é igual
nem todo crente é cristão
nem todo desviado está fora da igreja
assim como nem todo o que está fora da igreja
é desviado.

Nem todo homossexual é promíscuo
nem toda palavra é literal
nem todo casamento é verdadeira união
nem todo sorriso é real.

Nem todo o que promete cumpre
assim como nem todo o que faz, fala.
Nem toda resposta é sincera
nem sempre é mau o que cala.

Nem todo o que se diz profeta fala a verdade
nem todo palavrão é pesado
assim como nem toda palavra doce abençoa
pois pode encobrir maior pecado.

Nem todo o que pede perdão se arrependeu de fato
nem todo o que se diz preocupado pensa no outro
assim como nem todo arrependido pede perdão
e nem todo o que pensa no outro se diz preocupado.

São generalidades as que nos confundem
estigmas e padrões de pensamento
nos afastam da realidade
prejudicam nossa análise da situação.

Por isso não suponha, pergunte.
Converse antes de tomar decisão.
Não fale de alguém, tente entender
não perca a paciência, nem a razão.

Cada pessoa é singular,
é complexa, tem história.
Como é possível avaliar
ignorando sua memória?

Por isso, não generalize.
Se te decepcionarem, não rotule
não tranque ninguém num conceito, num estigma.
Se aproxime.
Caminhe junto.
Aceita o desafio?

Angela Natel

Missionário não serve


Missionário não serve para fazer em seu lugar
tudo o que há na missão para fazer
muito menos
o que você não quer realizar.

Missionário não serve
para ser lembrado somente em eventos
relacionados à missão.
Missionário é gente
ainda que às vezes pareça que não.

Missionário não serve para tapar buraco
quando alguém não comparece.
Também não serve para dizer que na igreja
a missão acontece.

Missionário não serve de 'garoto propaganda'
de igreja, evento, instituição.
Missionário não serve de objeto
de decoração.

Missionário não serve de voz de Deus
em qualquer situação,
ele também erra, também precisa
de repreensão.

Missionário não serve prá ser ignorado
quando emite opinião
- ninguém, neste caso, serve,
é preciso respeito, consideração.

Missionário não serve
prá determinar a teologia
do outro, de quem quer que seja.
Missionário não serve prá ser guia.

Missionário não serve para ostentar título,
controlar vidas, nem usar o nome de Deus
a fim de influenciar outros a realizar sua vontade.
Missionário não serve para exigir
nem para ser exigido.

Missionário não serve para mendigar sustento
nem tentar convencer outros
a respeito da missão de Deus.
Missionário não serve de Espírito Santo
na vida de ninguém.

Missionário não serve para trabalhar
24h/dia, nem 7 dias/semana.
Missionário não serve sem descanso,
sem lazer, sem diversão.

Missionário não serve sozinho,
sem amigos, companheiros de trabalho,
sem família, sem irmãos.

Missionário não serve para ser esquecido
ou somente lembrado quando convém.
Missionário, porque está longe,
não serve para ser ignorado.

Missionário não serve sem saúde,
sem cuidados, alimentação.
Às vezes não serve sem um exercício,
nem sem medicação.

Missionário não serve para só receber sustento
se for constante e fiel num relatório,
se fizer-se lembrado.
Missionário não serve, afinal, para ser controlado.

Missionário não serve sem consciência própria,
sem relacionamento com Deus.
Missionário não serve sem disposição para o sofrimento,
sem abrir mão da companhia dos seus.

Missionário não serve se não puder ter opinião
se não puder ser fiel à sua consciência
diante de Deus e do que acredita.
Missionário não serve somente para prestigiar seus eventos
nem falar somente em ambientes relativos à missão.

Missionário não serve somente como lhe agrada
nem somente de forma a agradar outros.
Missionário, por vezes, não serve por conta
mesmo assim agrada a poucos.

Missionário, enfim, não serve pisando em ovos
preocupado com o que outros vão pensar, dizer.
Missionário não serve à ansiedade alheia
Vive pela fé, não pelo que vê.

Missionário não serve em missão própria,
pessoal, não serve em lugar do outro.
Missionário serve a Deus,
não a você.

Angela Natel