segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Violências em nome de Deus

 "Você não faz ideia do que me custou estar debaixo desse sistema e não enxergar as cordas que o poder da narrativa daqueles que detêm o poder me custaram.

Me custou tudo.

Me custou a vida, me custou a alma, me custou a independência financeira, me custou a sanidade, a perplexidade diante do belo, me custou a capacidade de perceber, de entender, de ler e de compreender o divergente, de simplesmente ouvir.

Me custou tudo o fato de por décadas simplesmente aceitar e me submeter a uma narrativa mitológica capaz de conduzir a minha vontade, o meu pensamento.

E aí me perguntam: “E Jesus?”

Como diz meu orientador: “Jesus, este ilustre desconhecido” dos crentes, que realmente os crentes não querem conhecer. Porque, se estudassem, se pesquisassem, se fossem atrás de quem o Jesus histórico foi, não iriam cair nessa falácia, nessa construção mitológica dos dogmas, das doutrinas, que apoia uma Igreja imperialista capitalista, uma Igreja construída sobre o poder: o poder da narrativa.

Não é uma questão de verdade, é uma questão de poder, porque se fosse de verdade a liberdade seria o crivo. Se fosse de verdade, não haveria medo do divergente, não haveria a raiva, o cancelamento, não haveria exclusão, não haveria julgamento. Mas é tudo isso e muito mais num sistema que faz as mentes e os corações das pessoas serem escravas de abusos e violências de todas as formas: físicas, psicológicas, financeiras.

Todo tipo de abuso a que fui submetida por décadas e que criou em mim um coração incapaz de viver, de ser humana, de perceber.

E hoje tudo o que deixei de viver, de construir, o tempo que se foi, a vida que se perdeu, coisas que simplesmente eu não tive acesso, eu não consegui conquistar. E hoje sou medida pela produtividade, por aquilo que os que estão no poder julgam capacidade. Sou questionada, julgada, demonizada, marginalizada, condenada.

E nas bocas de quem abusa e violenta em nome de Deus, meu nome ainda permanece sendo pronunciado como sendo uma herege, como uma pária da sociedade, alguém que não venceu na vida. E enquanto tiverem recursos e tiverem saúde vão continuar pisando, humilhando, menosprezando e usando esse nome pra dizer: “Olha como ela acabou! Olha onde ela está! Não construiu nada, não é nada, depende de outros, é doente.”

Os rótulos são instrumentos dos abusadores pra submeter e pra todos nessa escravidão."

Angela Natel


Reflexão poema publicada em formato de podcast e disponível em https://anchor.fm/angela-natel/episodes/Violncias-em-nome-de-Deus-e17g74j

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Violências em nome de Deus

 "Você não faz ideia do que me custou estar debaixo desse sistema e não enxergar as cordas que o poder da narrativa daqueles que detêm o poder me custaram.

Me custou tudo.

Me custou a vida, me custou a alma, me custou a independência financeira, me custou a sanidade, a perplexidade diante do belo, me custou a capacidade de perceber, de entender, de ler e de compreender o divergente, de simplesmente ouvir.

Me custou tudo o fato de por décadas simplesmente aceitar e me submeter a uma narrativa mitológica capaz de conduzir a minha vontade, o meu pensamento.

E aí me perguntam: “E Jesus?”

Como diz meu orientador: “Jesus, este ilustre desconhecido” dos crentes, que realmente os crentes não querem conhecer. Porque, se estudassem, se pesquisassem, se fossem atrás de quem o Jesus histórico foi, não iriam cair nessa falácia, nessa construção mitológica dos dogmas, das doutrinas, que apoia uma Igreja imperialista capitalista, uma Igreja construída sobre o poder: o poder da narrativa.

Não é uma questão de verdade, é uma questão de poder, porque se fosse de verdade a liberdade seria o crivo. Se fosse de verdade, não haveria medo do divergente, não haveria a raiva, o cancelamento, não haveria exclusão, não haveria julgamento. Mas é tudo isso e muito mais num sistema que faz as mentes e os corações das pessoas serem escravas de abusos e violências de todas as formas: físicas, psicológicas, financeiras.

Todo tipo de abuso a que fui submetida por décadas e que criou em mim um coração incapaz de viver, de ser humana, de perceber.

E hoje tudo o que deixei de viver, de construir, o tempo que se foi, a vida que se perdeu, coisas que simplesmente eu não tive acesso, eu não consegui conquistar. E hoje sou medida pela produtividade, por aquilo que os que estão no poder julgam capacidade. Sou questionada, julgada, demonizada, marginalizada, condenada.

E nas bocas de quem abusa e violenta em nome de Deus, meu nome ainda permanece sendo pronunciado como sendo uma herege, como uma pária da sociedade, alguém que não venceu na vida. E enquanto tiverem recursos e tiverem saúde vão continuar pisando, humilhando, menosprezando e usando esse nome pra dizer: “Olha como ela acabou! Olha onde ela está! Não construiu nada, não é nada, depende de outros, é doente.”

Os rótulos são instrumentos dos abusadores pra submeter e pra todos nessa escravidão."

Angela Natel


Reflexão poema publicada em formato de podcast e disponível em https://anchor.fm/angela-natel/episodes/Violncias-em-nome-de-Deus-e17g74j