"Você não faz ideia do que me custou estar debaixo desse sistema e não enxergar as cordas que o poder da narrativa daqueles que detêm o poder me custaram.
Me custou tudo.
Me custou a
vida, me custou a alma, me custou a independência financeira, me custou a
sanidade, a perplexidade diante do belo, me custou a capacidade de perceber, de
entender, de ler e de compreender o divergente, de simplesmente ouvir.
Me custou tudo
o fato de por décadas simplesmente aceitar e me submeter a uma narrativa
mitológica capaz de conduzir a minha vontade, o meu pensamento.
E aí me
perguntam: “E Jesus?”
Como diz meu
orientador: “Jesus, este ilustre desconhecido” dos crentes, que realmente os
crentes não querem conhecer. Porque, se estudassem, se pesquisassem, se fossem
atrás de quem o Jesus histórico foi, não iriam cair nessa falácia, nessa construção
mitológica dos dogmas, das doutrinas, que apoia uma Igreja imperialista
capitalista, uma Igreja construída sobre o poder: o poder da narrativa.
Não é uma
questão de verdade, é uma questão de poder, porque se fosse de verdade a
liberdade seria o crivo. Se fosse de verdade, não haveria medo do divergente,
não haveria a raiva, o cancelamento, não haveria exclusão, não haveria
julgamento. Mas é tudo isso e muito mais num sistema que faz as mentes e os
corações das pessoas serem escravas de abusos e violências de todas as formas:
físicas, psicológicas, financeiras.
Todo tipo de
abuso a que fui submetida por décadas e que criou em mim um coração incapaz de
viver, de ser humana, de perceber.
E hoje tudo o
que deixei de viver, de construir, o tempo que se foi, a vida que se perdeu, coisas
que simplesmente eu não tive acesso, eu não consegui conquistar. E hoje sou
medida pela produtividade, por aquilo que os que estão no poder julgam
capacidade. Sou questionada, julgada, demonizada, marginalizada, condenada.
E nas bocas de
quem abusa e violenta em nome de Deus, meu nome ainda permanece sendo pronunciado
como sendo uma herege, como uma pária da sociedade, alguém que não venceu na
vida. E enquanto tiverem recursos e tiverem saúde vão continuar pisando,
humilhando, menosprezando e usando esse nome pra dizer: “Olha como ela acabou! Olha
onde ela está! Não construiu nada, não é nada, depende de outros, é doente.”
Os rótulos são
instrumentos dos abusadores pra submeter e pra todos nessa escravidão."
Angela Natel
Reflexão poema publicada em formato de podcast e disponível em https://anchor.fm/angela-natel/episodes/Violncias-em-nome-de-Deus-e17g74j
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