Tenho
lido várias postagens a respeito do Halloween, com explicações bem superficiais
e um tanto quanto gerais, afirmando que Deus abomina essas coisas, etc.
Bom,
tendo por base o texto da Bíblia para afirmar o que Deus abomina, é possível
também afirmar que toda hipocrisia, falso testemunho, idolatria, egoísmo,
avareza, mentira e, principalmente, toda tentativa de se colocar como Deus, bem
como afirmar conseguir perscrutar os pensamentos de Deus não são atitudes lá
agradáveis a Ele, porque tomam o lugar que é só dEle.
Além
disso, falar e divulgar que Halloween é a mesma coisa que comunicar-se
diretamente com os mortos, como também já li em alguns textos, não passa de
falso testemunho. Muitas são as razões para que se pense duas vezes antes de
demonizar tal festa no Ocidente. Uma delas é o fato de que, na prática atual,
não tem passado de um divertido baile de máscaras moderno, regado a muitos
doces. Há, inclusive, para simplificar a explicação, a base histórica e
cultural europeia desta celebração que é o fundamento para o uso de máscaras e
fantasias, de utilizá-las exatamente por medo de serem reconhecidos como seres
humanos, e assim protegerem-se do ataque de seres não-humanos.
Nesse
sentido, a prática não é nada diferente dos usos e costumes que se acumulam em
toda a sociedade ocidental, inclusive no meio dito evangélico, no que diz
respeito a utilizar-se de ‘máscaras’, atitudes assumidamente falsas na
representação social a fim de que não se sofra nenhum tipo de retaliação, como
no caso de se assumir a verdade.
Dessa
forma, falar de Halloween não é mais demoníaco do que endeusar reformadores que
nunca tiveram a intenção de serem tidos como super-homens da história cristã,
nem mais demoníaco do que inverter valores, agir preconceituosamente, valorizar
a forma em detrimento da essência das coisas, defender hipocritamente festas
como Natal (de origem não menos pagã que o Halloween) e ainda usar de
argumentos com um sentido tal que faça com que pessoas menos informadas
acreditem que a voz que ouvem é a de Deus e não a de um ser humano tão falho
quanto elas, com suas limitações, preconceitos e também falta de informação.
Dessa
maneira, não tomo para mim como se falando ‘em nome de Deus’, mas levanto um
questionamento para que se olhe em direção a Jesus, no sentido de condenar mais
a hipocrisia do que fontes pagãs, chamando a atenção para a justiça, o amor e a
misericórdia mais do que um levante contra culturas humanas que nada mais são
do que um reflexo delas mesmas.
Me
alegro com a Reforma Protestante, sim, mas não me atrevo a encarar as pessoas
envolvidas neste processo (que, de modo algum foi mérito de um só homem) como
superiores a qualquer pequenino que volte seu coração para a verdade.
É
por isso que considero o Halloween uma ótima oportunidade de reflexão e decisão
para significativas mudanças em minha vida pessoal, principalmente no que diz
respeito a uma vida de integridade e transparência. Também não ignoro o Natal
mas, da mesma forma que no caso do Halloween, ressignifico o que me parece
conveniente, já que, como ser humano que sou, posso usar de minha criatividade
e trabalhar no desenvolvimento da cultura que me cerca, sem agir de forma
incoerente (demonizando uma festa pagã e celebrando outra, ou até mesmo agindo
sincreticamente na adaptação de outras festas do calendário denominado pagão às
celebrações na Igreja, como tenho observado em muitas falas e ações ditas
evangélicas).
Sou,
sim, passiva de erro, mas nem por isso deixo de me expor, uma vez que também
possuo o direito à liberdade de expressão. Penso ser de bom proveito dar a
oportunidade dos leitores de refletir e questionar antes de condenar quem quer
que seja. Não condeno quem pensa e age diferente de mim, da mesma forma que
espero não ser condenada por isso, uma vez que, creio eu, somente Deus pode, de
fato, determinar a condenação de alguém.
Sou
grata pela misericórdia de Deus que nos alcança e que torna possível nossa
transformação mesmo em meio às culturas imperfeitas que produzimos.
Nesse
sentido, com o Halloween, celebro a queda das máscaras de nossa hipocrisia, o
fim dessa atitude idólatra de nos colocarmos como deus de nossa sociedade (ao
determinarmos quem é salvo e quem deve ser condenado), dessa postura de quem
acha que consegue ler os pensamentos e as intenções das pessoas e até mesmo
determinar os pensamentos de Deus.
Celebro
o fim da fantasia megalomaníaca de quem assume o nome de Cristo sem tentar
seguir Seus passos nem se parecer com Ele em suas atitudes. Esta é a verdadeira
Reforma que necessitamos: um chamado à mudança de nossas estruturas, talvez
menos reforma e mais desconstrução de nós mesmos para que um novo ser humano
nasça com uma nova natureza - Cristo vivendo em nós e através de nós, sem
máscaras, sem condenações, sem hipocrisia, sem meias verdades e sem dois pesos
e duas medidas. Esse tipo de ‘reforma’ com certeza incomodaria por demais
muitos dos que defendem a comemoração da tão aclamada ‘Reforma Protestante’ e
demonizam o Halloween.
Assim,
prefiro apresentar Cristo às pessoas do que tentar convencê-las de seus pecados
(já que essa é uma tarefa do próprio Deus e eu não sou Ele). Prefiro apontar
para o exemplo de Jesus do que lutar contra culturas humanas que não são, na
realidade, ameaças à verdade. Acredito que a luz brilha na escuridão, e por
mais densa que esta seja, não impedirá a verdade de resplandecer.
É
isso que nossa sociedade precisa: largar as máscaras do medo de ser retalhado
por falar a verdade que é Cristo, cheio de graça e de misericórdia, numa
justiça que não ataca o outro como justiceiro mascarado, mas que ensina através
do sofrimento, da renúncia e do repartir de si mesmo com o outro,
independentemente de quem ele seja.
Quando
as pessoas perceberem que vivemos num constante Halloween, usando máscaras no
dia-a-dia para fugir do que tememos e não assumir nossas verdadeiras
responsabilidades, esta ‘festa pagã’ assumirá um novo significado para a nossa
cultura e nossa história. Quando as pessoas perceberem que não necessitamos
mais de uma reforma, mas sim de um novo nascimento, iremos experimentar mais do
que Jesus Cristo realmente viveu e ensinou.
E
boas festas a todos!
Angela
Natel – outubro de 2014.
lioness-tocadaleoa.blogspot.com
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