sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023

É possível deixar de ser hétero? Reflexões sobre desistência de gênero.

 


Já ouvi muitas mulheres heterossexuais "brincando" que gostariam de deixar de ser hetero.
Ao mesmo tempo, lamentam não ser algo de sua escolha, atribuindo a heterossexualidade a um fator de nascença.
Algumas explicam sua heterossexualidade por naturalmente "gostarem de pênis", isso se contradiz quando vemos que, na verdade, estão se referindo apenas ao pênis cisgênero.
O primeiro passo para deixar de ser hétero é parar de achar que heterossexualidade é simplesmente atração sexual, é um sistema político.
O segundo, é descentralizar o sexo das principais decisões da vida.
Por que você precisa conceber todos os seus projetos de vida, necessariamente e apenas com quem transa?
O que é solidão? Suas amigas, por exemplo, não contam como companhia? Como companheiras, como amores?
Questionar a hierarquia amor x amizade é fundamental para desconstruir o amor romântico.
O terceiro ponto é reavaliar o que conta como sexo e como sexualidade, alargando as possibilidades de prazer para além da genitalização muito da ideia de orientação sexual se enfraquece.
Só é possível deixar de ser hétero quando se desiste de ser "mulher de verdade", essa que é ensinada a agradar homem, a buscar um homem para dividir a vida, a casa, o cuidado das crianças.
Porém ser "homem de verdade" é justamente não fazer nada disso. Os homens que limpam a casa, cozinham e cuidam das crianças são tidos como menos homens justamente por isso.
Para além de ter fé em achar "homens bons" que te completem/complementem, a chave está em não ter mais o desejo de preencher esse lugar (nem com homem, nem com mulher).
Abandonar os sonhos do amor romântico e da monogamia, é abrir espaço para outros imaginários, outros vínculos nos quais o sexo pode ou não estar presente, mas nunca como origem e destino.
Não será apelando para a boa consciência dos homens cis que eles abandonarão seus privilégios.
A ideia de homem só existe em contraposição a de mulher, portanto quando rejeitamos coletiva e politicamente, o papel de mulher, desarticulamos também o de homem.
Em vez de tentar ressignificar o que é essencialmente violento, que apostemos nossas energias em sair dessas tramas.
Ex-mulher, com orgulho.

Referências:
- Heterossexualidade compulsória, Adrienne Rich.
- O parentesco é sempre Heterossexual? - Judith Butler.

Texto de Geni Nuñez - @genipapos no Instagram

Assista a live “Descatequizar para descolonizar”, com Geni Nuñez em meu canal no Youtube (Angela Natel) -

https://www.youtube.com/watch?v=mhtXVH-kO3I&t=2113s


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