quinta-feira, 28 de abril de 2016

Repúdio ao Projeto 'Escola sem partido'

Meu repúdio ao Projeto, à ideia da Escola sem partido, que alguns querem arrastar para todo o país. Assino embaixo do comentário de Leandro Karnal (abaixo da imagem).
Para quem não sabe do que se trata, por 18 votos a oito, os deputados estaduais de Alagoas decidiram, em votação no fim da tarde desta terça-feira (26), derrubar o veto do governador Renan Filho (PMDB) ao projeto Escola Livre. Agora, os professores são obrigados a manter "neutralidade" em sala de aula e estão impedidos de "doutrinar" e "induzir" alunos em assuntos políticos, religiosos e ideológicos, sob pena até de demissão.


Agradeço aos muitos envios do texto da lei aprovada em Alagoas. Li várias vezes. Ainda não superei o impacto. É um monstro jurídico que afronta a Constituição, restaura a mordaça ditatorial e demonstra uma sanha reacionária intensa. Pode dar margem a uma intensa onda conservadora e, como sempre, invocando altos princípios de neutralidade e cuidado com os alunos, cria a figura hedionda da censura a partir de um ponto de vista arcaico de sociedade. Em nome de um bem cínico (se estão preocupados com as crianças por que não fazem escola materialmente dignas?) atacam a essência do conhecimento. O texto é burro, a intenção é estapafúrdia, o resultado será um desastre. Ainda bem que Alagoas não tem nenhum problema grave a resolver no momento e pode se dedicar a isto. Imagine se o Estado tivesse violência ou desigualdade de renda ou microcefalia às dúzias e os deputados estivessem investindo pesado em calar críticos. Seria um horror, não é? Mas, vamos ao lado positivo. Haveria?

- os deputados federais brasileiros, após as declarações estapafúrdias de voto, tinham recebido a taça de ouro da infâmia e da limitação retórica. O Brasil inteiro sentiu vergonha daqueles seres. Em pouco tempo, as excelências de Brasília perderam o posto para os estaduais de Alagoas que estão com a taça platinum mega blaster. Provamos que Tiririca estava errado quando dizia: pior que tá não fica. Ficou. Tem um alçapão no fundo do poço da dignidade parlamentar e Alagoas descobriu antes de todos.

- as forças obscuras estão com medo dos professores. Talvez seja a melhor notícia. Temos um poder que não suspeitávamos. Eles sabem que somos inimigos do mundo reacionário deles, que garante boquinhas e prebendas. Acabamos de ser homenageados de forma indireta. Funciona como a exposição de arte "degenerada" que os nazistas fizeram: figurar nela era um ponto muito positivo. O sol há de voltar, mas ingressamos numa terrível noite escura. Tudo feito em nome de misericórdia e da justiça, aliás, este era o lema da Inquisição...

Leandro Karnal
fonte: https://www.facebook.com/prof.leandrokarnal/photos/a.1603727593202940.1073741829.1603132246595808/1710190025890029/?type=3&theater

terça-feira, 19 de abril de 2016

segunda-feira, 18 de abril de 2016

MPEACHMENT A teatralização da política

O poder político é sempre uma teatrocracia, isso é o que, em suma, nos ensina o francês Georges Balandier. A legitimição do poder pela força é coisa de um governo débil. Ele é sempre uma ação encenada. Se depender apenas da força, por mais forte que possa ser, um governo fica vulnerável. Nesse sentido, um poder vai ser efetivo quanto mais for capaz de representar aquilo que de fato não seja na essência.

A teatralização é o que torna o poder deglutível. A adesão a ele é emocional e é provocada na cerimonialização, dramatização, espetaculização e sacralização dos símbolos e na atuação dos agentes no caldeirão social.

Todo o cenário do impeachment é isso: uma grande encenação. Os gestos são largos, espalhafatosos, messiânicos, grandiloquentes. Você é convidado a dar um ar de gravidade à coisa. As paixões são provocadas ao máximo. Mas não deixa de ser um grande teatro. Nada é tão sério quanto parece ainda que a coisa seja mais séria do que possa parecer.

Na sociedade do espetáculo, os truques são feitos a um palmo de nosso nariz mas não percebemos. Nossa boa fé é boa demais para descrer que haja boa fé nos atores que encenam o poder. Se Giddens nos fala da fé tecnológica, qu nos faz embarcar em um avião sem medo, tem de haver também a fé política. O poder precisa ser percebido diferentemente do que é.

O voto mais honesto nesse teatro dos horrores de ontem foi o do ex-dirigente do Corinthians Andrés Sanchez. Foi o que demonstrou mais desprezo pela encenação toda. Uma postura niilista com relação às verdades representadas. Foi o gesto de quem queria nos dizer "vocês não sabem da missa um terço". Esse é o tipo de gesto que se entrega, portanto, não interessa ao palco onde as decisões são tomadas.

Nós também encenamos, do contrário, nos sentiríamos patéticos. Somos constantemente provocados a reaffurmarmos a fé nas bandeiras que ostentamos. O poder é difuso e se manifesta também na relação "eu comigo mesmo". Precisamos crer para acreditar. O poder tem que me ser legítimo também. Enganamo-nos para que não nos enganem. Recusamos ser nossos próprios tiranos. A isso chamamos vagamente de consciência, o espaço mental de nosso descarrego existencial.

Se você quiser fazer o teste do ridículo da sua assistência a tal teatralização, permita-se a tortura de rever o espetáculo. Agora, com o sangue frio, sem as fímbrias das emoções do calor das horas, sua leitura será outra. Aí, então, como Macbeth de Shakespeare, você vai perceber que "a vida é uma simples sombra que passa (...); é uma história contada por um idiota, cheia de ruído e de furor e que nada significa”.

Talvez seja maturidade, ou quem sabe loucura, tornar-se um Andrés Sanchez. Na medida em que a vida tenha se tornado também um grande teatro, um desfile de aparências en detrimento das essências, o representar tenha se tornado nosso último refúgio. E, então, como diria o grande dramaturgo e escritor irlandês Samuel Beckett, "não tenho nada para dizer, mas só eu sei dizer isso".

E toquemos a vida.

Dilson Cunha
18.04.16


fonte: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=899282470180582&set=a.419744141467753.1073741834.100002965120447&type=3&theater

sexta-feira, 15 de abril de 2016

A fenda brasileira

A violência simbólica deixa feridas muitas vezes imperceptíveis no futuro de um país


Muro colocado diante do Congresso, em Brasília, para separar os manifestantes contra e a favor do Governo.  REUTERS

Nos últimos anos, e com maior intensidade nos últimos meses, uma boa parte da sociedade brasileira tem se radicalizado na sua própria visão da situação política interna. Razões abundam para cada porção ideologizada da sociedade que faz interpretações. A radicalização tende a priorizar e reforçar o posicionamento próprio gerando um isolamento gradual daqueles que estão do outro lado. As fronteiras imaginárias são a vitória de um tipo de compreensão que acha melhor a exclusão de seus oponentes.
Talvez esta seja a questão mais perigosa que esteja atravessando o Brasil hoje: a fenda social, além da institucional. Uma fenda que os argentinos conhecemos e reproduzimos historicamente com uma habilidade artesanal inigualável. Nós somos especialistas em estabelecer formas de discurso que constituem binômios radicais que produzem a separação de todo aquele que pensa diferente: é o fim do pluralismo. É um círculo vicioso que reproduz modos discursivos e de ação que procuram fixar fronteiras e marginalizar todo aquele que pensa de outro jeito. Nesta dinâmica não tem direita ou esquerda: todos reagem do mesmo jeito. Na construção desta fenda, a mídia joga um rol central como geradora de visões muitas vezes distorcidas dos acontecimentos. A manipulação midiática também faz parte do problema.
Nas últimas semanas alguns dirigentes políticos tem incrementado este nível de rispidez social nos debates. A promoção sutil ou explicita da violência (verbal ou física) numa autoridade pública é inaceitável. Um grande poder implica em uma grande responsabilidade (isso cabe também para mídia). O que fica para os que seguem cegamente aquele que consideram seu líder? As mudanças devem começar pelo discurso dos representantes políticos, qualquer que sejam suas responsabilidades.
Ao mesmo tempo, a democracia não é só aquela que pende das instituições da República. Também existe uma democracia no modo pelo qual os cidadãos se comunicam, reagem e compartilham (ou não) o cotidiano. Podemos ser cidadãos antidemocráticos? Sim. Toda vez que anulamos a palavra diferente à nossa, que rotulamos com ironia aqueles que pensam de maneiras distintas de construir uma sociedade. Os modos que a linguagem assume não são insignificantes: nas ocasiões trata-se da precedência às ações.
É muito simples agredir nas redes e acabar bloqueando a aqueles (outrora amigos) que postam posições políticas com as quais não concordamos. É simples insultar alguém na rua (mas não acaba sendo muito democrático).
Esse tipo de violência simbólica deixa feridas muitas vezes imperceptíveis no futuro de um país. Esse modo de dialogar no cotidiano não é algo sem importância e produz cicatrizes. Na Argentina, por exemplo, desde a última década muitas famílias se separaram depois de anos de divisão política. Muitos amigos deixaram de se falar. O tecido social nem sempre é forte, pode se rasgar sim.
Talvez fosse bom que cada um de nós, não importa o ponto de vista que se tenha, seja ainda mais responsável pela própria animosidade. É preciso continuar atacando a corrupção sem justificar os crimes (que não pertencem a uma só parcela isolada).

A indignação frente aos males sociais é entendível. Porém não podemos deixar de ter o respeito que a democracia precisa. Caso contrário, a fenda se engrandece, nos divide e poderemos cair nela. Naquele caso ficará cada vez mais difícil entreolharmos pacificamente aos olhos do amanhã. Sim, o amanhã tem que nos que encontrar juntos... convivendo.

Nicolás José Isola, filósofo argentino, é pesquisador e doutor em Ciências Sociais. Twitter:@NicoJoseIsola

fonte: http://brasil.elpais.com/brasil/2016/04/14/opinion/1460654729_261346.html?id_externo_rsoc=FB_CM

Repúdio ao Projeto 'Escola sem partido'

Meu repúdio ao Projeto, à ideia da Escola sem partido, que alguns querem arrastar para todo o país. Assino embaixo do comentário de Leandro Karnal (abaixo da imagem).
Para quem não sabe do que se trata, por 18 votos a oito, os deputados estaduais de Alagoas decidiram, em votação no fim da tarde desta terça-feira (26), derrubar o veto do governador Renan Filho (PMDB) ao projeto Escola Livre. Agora, os professores são obrigados a manter "neutralidade" em sala de aula e estão impedidos de "doutrinar" e "induzir" alunos em assuntos políticos, religiosos e ideológicos, sob pena até de demissão.


Agradeço aos muitos envios do texto da lei aprovada em Alagoas. Li várias vezes. Ainda não superei o impacto. É um monstro jurídico que afronta a Constituição, restaura a mordaça ditatorial e demonstra uma sanha reacionária intensa. Pode dar margem a uma intensa onda conservadora e, como sempre, invocando altos princípios de neutralidade e cuidado com os alunos, cria a figura hedionda da censura a partir de um ponto de vista arcaico de sociedade. Em nome de um bem cínico (se estão preocupados com as crianças por que não fazem escola materialmente dignas?) atacam a essência do conhecimento. O texto é burro, a intenção é estapafúrdia, o resultado será um desastre. Ainda bem que Alagoas não tem nenhum problema grave a resolver no momento e pode se dedicar a isto. Imagine se o Estado tivesse violência ou desigualdade de renda ou microcefalia às dúzias e os deputados estivessem investindo pesado em calar críticos. Seria um horror, não é? Mas, vamos ao lado positivo. Haveria?

- os deputados federais brasileiros, após as declarações estapafúrdias de voto, tinham recebido a taça de ouro da infâmia e da limitação retórica. O Brasil inteiro sentiu vergonha daqueles seres. Em pouco tempo, as excelências de Brasília perderam o posto para os estaduais de Alagoas que estão com a taça platinum mega blaster. Provamos que Tiririca estava errado quando dizia: pior que tá não fica. Ficou. Tem um alçapão no fundo do poço da dignidade parlamentar e Alagoas descobriu antes de todos.

- as forças obscuras estão com medo dos professores. Talvez seja a melhor notícia. Temos um poder que não suspeitávamos. Eles sabem que somos inimigos do mundo reacionário deles, que garante boquinhas e prebendas. Acabamos de ser homenageados de forma indireta. Funciona como a exposição de arte "degenerada" que os nazistas fizeram: figurar nela era um ponto muito positivo. O sol há de voltar, mas ingressamos numa terrível noite escura. Tudo feito em nome de misericórdia e da justiça, aliás, este era o lema da Inquisição...

Leandro Karnal
fonte: https://www.facebook.com/prof.leandrokarnal/photos/a.1603727593202940.1073741829.1603132246595808/1710190025890029/?type=3&theater

Norma Braga: Perspectivas pós-deflagração de impeachment

Norma Braga: Perspectivas pós-deflagração de impeachment: Muita gente no Facebook está reclamando da qualidade dos deputados. Citaram até os cabelos malfeitos (também notei as cores heterodoxas e ...

MPEACHMENT A teatralização da política

O poder político é sempre uma teatrocracia, isso é o que, em suma, nos ensina o francês Georges Balandier. A legitimição do poder pela força é coisa de um governo débil. Ele é sempre uma ação encenada. Se depender apenas da força, por mais forte que possa ser, um governo fica vulnerável. Nesse sentido, um poder vai ser efetivo quanto mais for capaz de representar aquilo que de fato não seja na essência.

A teatralização é o que torna o poder deglutível. A adesão a ele é emocional e é provocada na cerimonialização, dramatização, espetaculização e sacralização dos símbolos e na atuação dos agentes no caldeirão social.

Todo o cenário do impeachment é isso: uma grande encenação. Os gestos são largos, espalhafatosos, messiânicos, grandiloquentes. Você é convidado a dar um ar de gravidade à coisa. As paixões são provocadas ao máximo. Mas não deixa de ser um grande teatro. Nada é tão sério quanto parece ainda que a coisa seja mais séria do que possa parecer.

Na sociedade do espetáculo, os truques são feitos a um palmo de nosso nariz mas não percebemos. Nossa boa fé é boa demais para descrer que haja boa fé nos atores que encenam o poder. Se Giddens nos fala da fé tecnológica, qu nos faz embarcar em um avião sem medo, tem de haver também a fé política. O poder precisa ser percebido diferentemente do que é.

O voto mais honesto nesse teatro dos horrores de ontem foi o do ex-dirigente do Corinthians Andrés Sanchez. Foi o que demonstrou mais desprezo pela encenação toda. Uma postura niilista com relação às verdades representadas. Foi o gesto de quem queria nos dizer "vocês não sabem da missa um terço". Esse é o tipo de gesto que se entrega, portanto, não interessa ao palco onde as decisões são tomadas.

Nós também encenamos, do contrário, nos sentiríamos patéticos. Somos constantemente provocados a reaffurmarmos a fé nas bandeiras que ostentamos. O poder é difuso e se manifesta também na relação "eu comigo mesmo". Precisamos crer para acreditar. O poder tem que me ser legítimo também. Enganamo-nos para que não nos enganem. Recusamos ser nossos próprios tiranos. A isso chamamos vagamente de consciência, o espaço mental de nosso descarrego existencial.

Se você quiser fazer o teste do ridículo da sua assistência a tal teatralização, permita-se a tortura de rever o espetáculo. Agora, com o sangue frio, sem as fímbrias das emoções do calor das horas, sua leitura será outra. Aí, então, como Macbeth de Shakespeare, você vai perceber que "a vida é uma simples sombra que passa (...); é uma história contada por um idiota, cheia de ruído e de furor e que nada significa”.

Talvez seja maturidade, ou quem sabe loucura, tornar-se um Andrés Sanchez. Na medida em que a vida tenha se tornado também um grande teatro, um desfile de aparências en detrimento das essências, o representar tenha se tornado nosso último refúgio. E, então, como diria o grande dramaturgo e escritor irlandês Samuel Beckett, "não tenho nada para dizer, mas só eu sei dizer isso".

E toquemos a vida.

Dilson Cunha
18.04.16


fonte: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=899282470180582&set=a.419744141467753.1073741834.100002965120447&type=3&theater

A fenda brasileira

A violência simbólica deixa feridas muitas vezes imperceptíveis no futuro de um país


Muro colocado diante do Congresso, em Brasília, para separar os manifestantes contra e a favor do Governo.  REUTERS

Nos últimos anos, e com maior intensidade nos últimos meses, uma boa parte da sociedade brasileira tem se radicalizado na sua própria visão da situação política interna. Razões abundam para cada porção ideologizada da sociedade que faz interpretações. A radicalização tende a priorizar e reforçar o posicionamento próprio gerando um isolamento gradual daqueles que estão do outro lado. As fronteiras imaginárias são a vitória de um tipo de compreensão que acha melhor a exclusão de seus oponentes.
Talvez esta seja a questão mais perigosa que esteja atravessando o Brasil hoje: a fenda social, além da institucional. Uma fenda que os argentinos conhecemos e reproduzimos historicamente com uma habilidade artesanal inigualável. Nós somos especialistas em estabelecer formas de discurso que constituem binômios radicais que produzem a separação de todo aquele que pensa diferente: é o fim do pluralismo. É um círculo vicioso que reproduz modos discursivos e de ação que procuram fixar fronteiras e marginalizar todo aquele que pensa de outro jeito. Nesta dinâmica não tem direita ou esquerda: todos reagem do mesmo jeito. Na construção desta fenda, a mídia joga um rol central como geradora de visões muitas vezes distorcidas dos acontecimentos. A manipulação midiática também faz parte do problema.
Nas últimas semanas alguns dirigentes políticos tem incrementado este nível de rispidez social nos debates. A promoção sutil ou explicita da violência (verbal ou física) numa autoridade pública é inaceitável. Um grande poder implica em uma grande responsabilidade (isso cabe também para mídia). O que fica para os que seguem cegamente aquele que consideram seu líder? As mudanças devem começar pelo discurso dos representantes políticos, qualquer que sejam suas responsabilidades.
Ao mesmo tempo, a democracia não é só aquela que pende das instituições da República. Também existe uma democracia no modo pelo qual os cidadãos se comunicam, reagem e compartilham (ou não) o cotidiano. Podemos ser cidadãos antidemocráticos? Sim. Toda vez que anulamos a palavra diferente à nossa, que rotulamos com ironia aqueles que pensam de maneiras distintas de construir uma sociedade. Os modos que a linguagem assume não são insignificantes: nas ocasiões trata-se da precedência às ações.
É muito simples agredir nas redes e acabar bloqueando a aqueles (outrora amigos) que postam posições políticas com as quais não concordamos. É simples insultar alguém na rua (mas não acaba sendo muito democrático).
Esse tipo de violência simbólica deixa feridas muitas vezes imperceptíveis no futuro de um país. Esse modo de dialogar no cotidiano não é algo sem importância e produz cicatrizes. Na Argentina, por exemplo, desde a última década muitas famílias se separaram depois de anos de divisão política. Muitos amigos deixaram de se falar. O tecido social nem sempre é forte, pode se rasgar sim.
Talvez fosse bom que cada um de nós, não importa o ponto de vista que se tenha, seja ainda mais responsável pela própria animosidade. É preciso continuar atacando a corrupção sem justificar os crimes (que não pertencem a uma só parcela isolada).

A indignação frente aos males sociais é entendível. Porém não podemos deixar de ter o respeito que a democracia precisa. Caso contrário, a fenda se engrandece, nos divide e poderemos cair nela. Naquele caso ficará cada vez mais difícil entreolharmos pacificamente aos olhos do amanhã. Sim, o amanhã tem que nos que encontrar juntos... convivendo.

Nicolás José Isola, filósofo argentino, é pesquisador e doutor em Ciências Sociais. Twitter:@NicoJoseIsola

fonte: http://brasil.elpais.com/brasil/2016/04/14/opinion/1460654729_261346.html?id_externo_rsoc=FB_CM